A organização de defesa dos direitos humanos Human Rights Watch (HRW) classificou de "apartheid" a política de Israel para os palestinos que integram sua população e os que vivem nos territórios ocupados, uma acusação rejeitada pelas autoridades israelenses.
Algumas ONGs israelenses usam o termo "apartheid" para fazer referência às políticas de Israel a respeito dos palestinos que vivem em seu território, que descendem daqueles que permaneceram em suas casas em 1948, após a criação do Estado de Israel, e dos palestinos de Jerusalém Oriental, Cisjordânia e Faixa de Gaza.
Mas esta é a primeira vez que uma grande ONG internacional de defesa dos direitos humanos qualifica estas políticas de "apartheid".
"Com base em investigações, a Human Rights Watch conclui que o governo israelense mantém uma dominação deliberada da população judaica israelense sobre os palestinos em todo Israel e nos territórios ocupados", destaca o relatório publicado nesta terça-feira (27/4).
Quando esta "dominação deliberada" se soma a uma "opressão sistemática e a atos desumanos, trata-se de um crime de apartheid", conclui a HRW.
A organização destaca que baseia a conclusão na definição legal de apartheid e não em uma comparação com a política aplicada no século passado na África do Sul com critérios raciais.
Antes inclusive da publicação do relatório, o ministério israelense das Relações Exteriores afirmou à AFP que era um "panfleto de propaganda", sem nenhum vínculo com "os fatos ou a verdade" e redigido por uma organização movida "há muito tempo por uma agenda anti-israelense".
A Autoridade Palestina considerou o relatório um "testemunho forte e confiável do sofrimento dos palestinos".
"Há anos dizemos que estamos próximos do apartheid (em Israel/Palestina) e acredito que agora está claro que o limite foi ultrapassado", disse à AFP Omar Shakir, autor do relatório de mais de 200 páginas.
O "limite" foi ultrapassado, de acordo com Shakir, com o aumento das colônias israelenses em Jerusalém Oriental (a parte leste da Cidade Sagrada, ocupada em 1967 por Israel e anexada posteriormente) e na Cisjordânia, também ocupada.
O autor do relatório calcula que quase 700.000 colonos israelenses vivem nos assentamentos, que deveriam ser "temporários" e se tornaram construções "permanentes" por falta de acordo para o reconhecimento de um Estado palestino.
Em seu informe, a HRW também cita as restrições de deslocamento, os confiscos de terras, a transferência forçada da população, a negação dos direitos de residência e a suspensão dos direitos civis como exemplos dos abusos que Israel comete com os palestinos.
Justiça internacional
A decisão da HRW de utilizar um termo tão sensível como "apartheid" e de qualificar como "perseguição" as políticas israelenses a respeito de sua população árabe e dos palestinos foi anunciada poucas semanas depois do anúncio do Tribunal Penal Internacional (TPI) de abrir uma investigação sobre supostos crimes cometidos por Israel desde 2014 nos territórios ocupados.
O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, chamou a decisão do TPI de "antissemita".
O futuro da investigação (que inclui uma parte sobre a expansão das colônias) está nas mãos do futuro promotor Karim Khan, que sucederá Fatou Bensouda em junho.
Shakir pediu ao futuro promotor a "apegar-se aos fatos, a fazer uma investigação independente e levar à justiça os implicados em crimes graves, incluindo os de apartheid e perseguição".
O autor do relatório está na Jordânia desde que foi expulso por Israel em novembro de 2019 .
A HRW, que tem sede em Nova York, também faz um apelo para que a ONU crie uma "comissão internacional de investigação" sobre a situação em Israel e nos territórios palestinos, e aos países que "não sejam cúmplices" da política israelense para os palestinos. Mas não pede um boicote contra Israel.
A organização também pediu à Autoridade Palestina que "interrompa sua coordenação na área de segurança" com Israel para não ser "cúmplice" do "apartheid".
O presidente Mahmud Abbas suspendeu a cooperação com Israel durante vários meses em 2020, o que provocou a paralisação por parte do Estado hebreu das transferências dos impostos alfandegários que arrecada em nome da Autoridade Palestina, o que deixou o governo Abbas sem recursos para pagar os salários dos funcionários.
Nesta terça-feira (27/4), a Autoridade Palestina não comentou este ponto do relatório, mas pediu à comunidade internacional que "atue" para não ser "cúmplice" das políticas israelenses.