No momento em que a Índia vê os casos da covid-19 se multiplicarem de forma descontrolada, a comunidade científica internacional acompanha apreensiva a “exportação” da variante do coronavírus surgida no país para outras partes do mundo. Chamada B.1.617, ela foi registrada, pela primeira vez, no oeste da Índia, em outubro do ano passado. Segundo especialistas, tem características perigosas, sobretudo por provocar rápida piora na situação de saúde dos infectados, apesar de não haver provas concretas de que seja mais contagiosa ou mais resistente às vacinas.
A variante indiana foi classificada como “duplo mutante”, porque contém duas modificações potencialmente preocupantes relacionadas à proteína spike, que permite que o Sars-CoV-2 penetre no corpo humano. A primeira, E484Q, lembra a das variantes sul-africana e brasileira (E484K), suspeitas de tornar a vacinação menos eficaz e aumentar o risco de reinfecção. A segunda, a L452R, também está presente em uma variante detectada na Califórnia e pode ser capaz de causar aumento na transmissão.
Foi a primeira vez que ambas as mutações foram detectadas em uma única variante com difusão significativa. O temor é, portanto, que essa variante seja mais resistente às vacinas destinadas a combater cepas anteriores da covid-19 e, ao mesmo tempo, seja mais contagiosa.
“A mutação 484 pode ser parcialmente responsável por uma falha imunológica, mas não é suficiente por si só. Ela deve, eventualmente, estar associada a outras mutações que não vemos na variante indiana”, explicou o virologista francês Bruno Lina.
Restrições
Nos últimos dias, Israel diagnosticou pelo menos oito pessoas com a variante indiana. Segundo uma fonte da área de saúde, a vacina Pfizer/BioNTech seria, pelo menos, parcialmente eficaz contra a nova cepa.
O Reino Unido restringiu aos seus residentes assentos em voos provenientes desse país, depois de confirmar 103 casos da variante indiana em seu território. Por sua vez, a França incluiu, ontem, a Índia na lista de países cujos viajantes devem passar por quarentena obrigatória.
“Em uma ou duas semanas, teremos uma estimativa mais quantitativa da reação da variante à vacina”, disse Rakesh Mishra, do Centro de Biologia Celular e Molecular da Índia, à agência de notícias France-Presse.
Embora a situação na Índia tenha se agravado enormemente nas últimas semanas, até agora nada prova que a variante seja a responsável pelo cenário alarmante, que levou o governo de Nova Délhi a confinar a população da capital.
“No momento, não foi estabelecida nenhuma ligação com a recente degradação da situação epidemiológica”, destacou a agência de saúde pública francesa em sua última análise sobre o assunto, datada de 8 de abril. A hipótese mais considerada é que seja mesmo reflexo de aglomerações e de medidas preventivas insuficientes.
Além disso, meses depois de ser detectada, essa variante ainda não é absoluta no país, ao contrário da cepa britânica, por exemplo. Mesmo no estado de Maharastra, onde surgiu, ela representou apenas entre 15 e 20% das amostras sequenciadas obtidas em março, segundo o Ministério da Saúde. E é ainda mais minoritária no resto da Índia.
“Em uma ou duas semanas, teremos uma estimativa
mais quantitativa da reação da variante à vacina”
Rakesh Mishra, especialista do Centro de Biologia Celular e Molecular da Índia