Liberdade, alívio e uma certa estranheza. Essas sensações tomaram conta de muitos cidadãos de Israel em um domingo atípico, que destoou de tudo o que se viu no país ao longo do último ano. Nas ruas de Jerusalém e de outras cidades, jovens conversavam e se abraçavam; famílias passeavam pelas ruas ou aproveitavam o sol nos parques; as praias de Tel Aviv amanheceram lotadas. Praticamente todos estavam sem máscaras. Com 836.883 casos de infecção pela covid-19 — o equivalente a 9,6% da população — e 6.331 mortes, Israel tornou-se ontem a primeira nação do mundo a suspender o uso obrigatório da máscara a céu aberto. Uma das explicações está no fato de que 81% de todos os habitantes maiores de 16 anos receberam pelo menos um dose de vacinas contra o coronavírus; e quase 60% da população foi completamente imunizada.
“Nós lideramos o mundo, agora, no que diz respeito a emergir do coronavírus. A retomada total dos estudos, também no ensino médio, é um exemplo notável disso”, comemorou o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, ao visitar uma escola secundária em Har Homa, bairro de Jerusalém. “Há duas coisas que gostaria de enfatizar. Em primeiro lugar, ainda não nos livramos das máscaras. Elas devem ser usadas dentro de edifícios e das salas de aula; fora deles, você pode retirá-las.” O premiê advertiu que o coronavírus pode voltar. “O mais importante para evitar isso é trazer milhões de vacinas para cá. O imunizante atual expira entre seis meses e um ano. Precisaremos de mais vacinas, e estamos trabalhando nisso”, assegurou.
Efeito colateral
Por e-mail, Charles M. Rice, professor da Univesidade Rockefeller (em Nova York) e laureado com o Prêmio Nobel de Medicina em 2020, por ajudar a descobrir o vírus da hepatite C, admitiu ao Correio que, quando a maioria da população é imunizada, opções como a dispensa da máscara tornam-se razoáveis. “Vale notar que isso se aplica a reuniões em espaços abertos, o que dilui a capacidade de propagação do vírus. E vale ressaltar, também, que, sim, as vacinas funcionam para poliomielite, varíola, sarampo, caxumba e rubéola, assim como para a covid-19. Precisamos aumentar a disponibilidade e imunizar o maior número possível de pessoas.”
Para o israelense Ofir Winter, jornalista e especialista do Instituto Nacional de Estudos de Segurança da Universidade de Tel Aviv, Israel teve a sorte de ser uma das primeiras nações a serem vacinadas em larga escala. “O momento de suspender o uso das máscaras ao ar livre é perfeito, já que o quente verão bate em nossas portas. A previsão é de 35 graus Celsius nesta semana. Estou realmente ansioso para assistir a jogos de futebol e shows, dos quais sinto muitas saudades, como fazíamos antes da pandemia”, disse ao Correio. “O acessório e o distanciamento social também fizeram com que dificilmente contraíssemos gripe no último inverno. Mas, temos medo de novas variantes, que poderiam colocar em risco a imunização.”
Morador de Modin — a 30km de Jerusalém — desde 1996, o microempresário carioca Miguel Nicolaevsky, 52 anos, aguarda exames clínicos para determinar se a alergia é fator de risco para a vacinação. “Minha esposa e minha filha tomaram as duas doses”, contou ao Correio. “Não utilizar máscaras nas ruas, hoje (ontem), foi algo estranho. O povo anda meio preocupado, pois é a primeira vez que se retira a obrigatoriedade do acessório”, afirmou. “Por aqui, fala-se que, dentro de um mês, as máscaras serão totalmente abolidas, caso os índices de contaminação continuem em queda.”
Cyrille Cohen, imunologista da Universidade Bar Ilan (em Ramat Gan, a 10km de Tel Aviv), destacou à reportagem que a vacinação em massa, o esforço internacional para rastrear variantes, a higiene, o uso de máscara e o distanciamento social são importantes na contenção de pandemias. “Fico muito entristecido ao ver nações que minimizam a pandemia. Isso perpetua a infecção em todo o mundo e pode contribuir para o surgimento de novas cepas. Não vejo nenhuma outra estratégia que não seja a de valorização da vida.”