A pandemia de coronavírus provocou a maior queda das economias da América Latina em 120 anos, segundo dados recentes da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (Cepal).
Em média, diz o organismo, a retração foi de 7,7% e a recuperação de cerca de 3,7%, prevista para este ano, não será suficiente para devolver os níveis econômicos pré-pandêmicos na região.
No primeiro ano da pandemia, 2020, a economia do Brasil sofreu contração de 4,1%, de acordo com levantamento do Fundo Monetário Internacional (FMI). Mas apesar de seu histórico vínculo com o mercado brasileiro, o Paraguai registrou retração muito menor, 0,6%, segundo dados oficiais.
Foi a economia que teve a menor queda entre os países latino-americanos, apontou a Cepal. Para comparação, a economia argentina encolheu 10,5%, a do Uruguai, 5,9% e a do Peru, mais de 11%.
Em outros tempos, dizem analistas paraguaios, o comportamento da economia brasileira - e também da Argentina - teria influenciado o desempenho do Paraguai.
Durante a pandemia, no entanto, o Paraguai "se descolou" da economia do Brasil e da região, diz o ministro paraguaio da Fazenda, Oscar Llamosas Díaz, em entrevista à BBC News Brasil.
"Se olharmos (inclusive) os dados anteriores à pandemia, podemos dizer que a economia paraguaia conseguiu, de certa forma, o 'descolamento' das economias dos nossos vizinhos. No caso do Brasil e da Argentina, nos últimos anos, os desempenhos econômicos foram negativos ou quase negativos e o Paraguai continuou tendo desempenho econômico positivo", disse o ministro.
A expectativa é que a economia paraguaia registre crescimento de 4% em 2021, afirmou. Ele ressalvou, porém, que existem setores do país que continuam dependendo dos vizinhos.
"São os casos dos comércios nas fronteiras com a Argentina, que estão fechadas (por determinação argentina), e com o Brasil que apesar da reabertura das fronteiras, registra queda no movimento", disse.
Em termos "macro", porém, o Paraguai "conseguiu, em grande medida, esse descolamento dos vizinhos". No ano passado, logo no início da pandemia, o Paraguai fechou a fronteira com o Brasil e com a Argentina. Mas a medida não deverá ser retomada, disse o ministro.
"Aprendemos muita coisa no último ano e uma delas é que hoje o vírus, cedo ou tarde, entra nos nossos países. O que queríamos, no ano passado, era ganhar tempo para fortalecer o sistema de saúde", disse o economista Llamosas Díaz.
De acordo com os organismos internacionais, como em outros países, as medidas de estímulo, incluindo planos sociais para os mais vulneráveis e fiscais no âmbito de serviços e empresarial, entre outros, contribuíram para amenizar o impacto negativo da pandemia.
"A situação teria sido outra sem o plano de emergência que implementamos", disse Llamosas Díaz.
Ele reconhece, porém, que o cenário é de "incertezas" e que os resultados de 2021 dependerão da pandemia, já que os hospitais públicos registram ocupação completa praticamente de leitos e as doses de vacinas chegam lentamente.
"O governo enviou ao Congresso uma lei de emergência para reforçar o sistema sanitário, um setor que foi abandonado durante anos, e triplicamos o total de leitos. Mas ainda assim hoje o sistema sanitário está trabalhando praticamente em seu nível máximo", disse.
Auxílio do Estado
Com quase 70% da sua população na economia informal, o governo optou, no primeiro momento da pandemia, por distribuir ajuda a todas as pessoas maiores de 18 anos que são trabalhadores informais ou idosos sem recursos.
Para evitar filas, contou o ministro, foi implementado o programa com nome em guarani Pytyvõ (ajuda/ajudar), que consiste na entrega de recursos através de celulares ou, no caso dos que não têm celular ou computador, usando a identidade para compras alimentos e de medicamentos, por exemplo.
"Num primeiro momento, chegamos a sete de cada dez trabalhadores. Hoje, esta ajuda está mais focalizada. Mas mantemos os apoios, por exemplo, aos comércios na fronteira, que sentem forte o impacto das restrições. Mas se a situação da pandemia piorar, teremos que voltar a ajudar os diferentes setores", disse.
Ele lembrou que o Paraguai tem uma Lei de Responsabilidade Fiscal que teve metas iniciais não cumpridas em 2020 e neste ano em função das necessidades de recursos na pandemia.
Em 2010, recordou, o Paraguai tinha cerca de 39% de pobres e, quase dez anos depois, em 2019, este índice foi de cerca de 23%.
"Com a pandemia, a pobreza subiu para 26%, mas, sem as ajudas provisórias ou permanentes que o governo distribui, ela teria sido em torno de 29%", afirmou.
O índice alto vinha em queda, acompanhando oito meses seguidos de expansão da economia, quando a pandemia surgiu.
País com cerca de 7,3 milhões de habitantes, que compartilha a hidrelétrica de Itaipu com o Brasil e a hidrelétrica de Yacyretá com a Argentina, o Paraguai tem três motores fundamentais para sua economia - a agropecuária, o agronegócio e as obras públicas. Setores que por suas dinâmicas internacionais (agronegócio) e internas (obras públicas) não dependem dos desempenhos das economias do Brasil ou das de outros vizinhos.
"Estes foram pilares fundamentais para nossa economia no ano passado, ano de pandemia", disse o ministro.
O Paraguai está entre os maiores produtores e exportadores de soja do mundo e entre seus clientes da carne que produz estão Chile, Taiwan e Israel, por exemplo. Foi no ciclo das commodities, entre cerca de 2000 e 2014, que o Paraguai fortaleceu sua "independência econômica", dizem analistas, do Brasil.
"Mesmo a partir de 2013, 2014, quando as economias da região começaram a desacelerar, o Paraguai manteve crescimento econômico, de entre 3% e 4%", disse o analista político e econômico Fernando Masi, do Centro de Análise e Difusão Econômica do Paraguai (Cadep).
Ele disse que, nos últimos anos, o Paraguai passou a adotar medidas que contribuíram para sua estabilidade e previsibilidade, como a reforma tributária. Quando foi realizada, em 2004, disse, o país tinha 100 mil contribuintes e hoje conta com um milhão e cem mil.
Mas, ele ressalva que, apesar da queda nos indicadores de pobreza e do longo período de crescimento sustentável, antes da pandemia, o Paraguai tem desafios como "diversificar sua matriz econômica" e saber se crescer 4% é "suficiente" para acabar com a pobreza.
"Temos que ver o modelo econômico de cada país. O crescimento de 4%, por exemplo, é suficiente para acabar com a pobreza e a vulnerabilidade do Paraguai? Suficiente para que existam mais oportunidades de emprego e para que o mercado interno cresça? Essa inclusão pode ocorrer dentro da própria agricultura. Hoje, as exportações estão concentradas na soja e na carne. Apesar de estarem surgindo diversificações nesse terreno, como é o caso, por exemplo, do arroz ou do têxtil, no campo industrial", disse Masi.
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