Os governantes de quase 20 países, o presidente do Conselho Europeu e o diretor da OMS apelaram à elaboração de um tratado sobre pandemias para melhor enfrentar crises futuras e evitar o 'cada um por si' duramente evidenciado pela covid-19.
"O mundo não pode se dar ao luxo de esperar até que a pandemia acabe para começar a se preparar para a próxima", disse o diretor-geral da Organização Mundial da Saúde, Tedros Adhanom Ghebreyesus, em entrevista coletiva nesta terça-feira (30/3).
Sem uma abordagem internacional e coordenada, "continuaremos vulneráveis", advertiu, acrescentando que espera que um projeto de resolução sobre este tratado seja apresentado em maio, na reunião anual dos 194 membros da OMS.
Este apelo surge no momento em que o mundo luta - mais de um ano após o aparecimento da covid-19 na China - para lidar com a pandemia, que matou quase 2,8 milhões de pessoas em todo o mundo.
Longe de desencadear um surto de solidariedade, a crise aumentou as tensões e a desigualdade das vacinas está se ampliando: 53% das 565 milhões de doses administradas em todo o mundo foram aplicadas em países de alta renda, como Estados Unidos e Israel, enquanto os mais pobres receberam apenas 0,1% das doses, segundo contagem estabelecida pela AFP.
A proposta de tratado foi apresentada em uma coluna assinada por líderes de países dos cinco continentes, incluindo o presidente francês Emmanuel Macron, a chanceler alemã Angela Merkel, o primeiro-ministro britânico Boris Johnson ou mesmo os presidentes sul-coreano Moon Jae-in, sul-africano Cyril Ramaphosa, indonésio Joko Widodo e o chileno Sebastián Pinera.
Os líderes de importantes integrantes do G20 (Estados Unidos, Rússia, China, Japão, Índia e Brasil) não estão entre os signatários, mas Tedros disse ter recebido sinais positivos de Pequim e Washington.
Enquanto a covid-19 "tira proveito de nossas fraquezas e divisões", "tal compromisso coletivo renovado seria um passo importante para consolidar a preparação para pandemias no mais alto nível político", de acordo com este artigo publicado na segunda-feira à noite no jornal francês Le Monde e em muitos jornais estrangeiros nesta terça.
"Acontecerão outras pandemias e outras emergências sanitárias em grande escala. Nenhum governo ou organização multilateral pode enfrentar essa ameaça sozinho", insiste o texto.
Iniciador do projeto, que apresentou no dia 3 de dezembro na tribuna das Nações Unidas, o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, o detalhou em coletiva de imprensa.
"A covid-19 expôs as fraquezas e divisões de nossas sociedades e agora é a hora de nos unirmos", ressaltou.
- Informação, agentes patógenos e vacinas -
O novo tratado poderia se basear no "Regulamento Sanitário Internacional", um instrumento legalmente vinculante adotado em 2005 pelos países-membros da OMS.
Este texto regulamenta a declaração de uma emergência sanitária de magnitude internacional, o mais alto nível de alerta atual.
Mas várias vozes se levantaram questionando sua eficácia, estimando que não foi capaz de prevenir ou conter a crise atual.
Tedros espera que o futuro tratado aborde pelo menos "três desafios" em relação ao compartilhamento de informações, patógenos e tecnologias e produtos, incluindo vacinas.
Na coluna, os 25 líderes signatários explicam que fortalecer a "resiliência" diante de pandemias significa "consolidar fortemente a cooperação internacional para melhorar, por exemplo, sistemas de alerta, compartilhamento de informações, pesquisa, bem como a produção e distribuição" de vacinas, medicamentos, produtos de diagnóstico e equipamentos de proteção.
A este respeito, "estamos empenhados em garantir o acesso universal e equitativo a vacinas, medicamentos e diagnósticos que sejam seguros, eficazes e acessíveis para esta pandemia e aquelas que virão. A vacinação é um bem público global", afirmam.
Um tratado "deve levar a uma maior responsabilização mútua" e "promover a transparência e a cooperação dentro do sistema internacional", acrescentam, apelando ao trabalho com a sociedade civil e o setor privado.
A aposta não escapou à Federação Internacional da Indústria Farmacêutica (IFPMA), que em nota destaca que "o setor biofarmacêutico e suas cadeias produtivas são parte da solução para futuras pandemias e, portanto, devem desempenhar um papel no desenvolvimento" do futuro tratado.