Violência

ONU e observadores denunciam banho de sangue em novo dia de repressão em Mianmar

A porta-voz do organismo da ONU, Ravina Shamdasani, disse que não foi possível corroborar as informações com fontes independentes

A ONU e observadores denunciaram dezenas de mortes neste sábado (27/3) na repressão militar em Mianmar, com cenas de violência "impactante", em um dia no qual a junta golpista organizou um desfile de soldados na capital.

"Ao menos 89 pessoas morreram até a noite", afirmou a Associação de Assistência aos Prisioneiros Políticos (AAPP), uma ONG que monitora o número de mortos desde o golpe de Estado de 1º de fevereiro.

"Estamos recebendo informações sobre dezenas de mortos, incluindo crianças, centenas de feridos em 40 localidades e detenções em massa", escreveu no Twitter o Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos, que alertou para uma "violência impactante".

A porta-voz do organismo da ONU, Ravina Shamdasani, disse que não foi possível corroborar as informações com fontes independentes, mas que o Alto Comissariado recebeu "múltiplos relatos confiáveis".

"Até o momento, os balanços de mortos oscilam entre 83 e 91, com centenas de feridos. Temos quatro relatos de crianças mortas, incluindo um bebê", afirmou.

O país asiático está em uma profunda crise desde que os militares derrubaram o governo civil de Aung San Suu Kyi, o que desencadeou uma grande revolta.

O Reino Unido advertiu que a jornada extremamente violenta, que pode ser a mais letal em dois meses, estabelece um "novo mínimo" para a junta.

Demonstração da força

O dia começou com uma demonntração de força da junta militar, por ocasião do Dia das Forças Armadas.

Milhares de soldados, tanques, mísseis e helicópteros passaram por uma grande avenida da capital, Naypiydaw, diante dos generais e seus escassos convidados, incluindo as delegações da Rússia e da China, países que não condenaram o golpe.

O líder da junta, o general Min Aung Hlaing, voltou a defender o golpe e citou uma suposta fraude nas eleições de novembro, vencidas pelo partido de Aung San Suu Kyi. Também prometeu ceder o poder após novas eleições.

"A democracia que desejamos seria uma democracia indisciplinada se a lei fosse violada e não fosse respeitada", disse.

Morte e caos

A violência explodiu em todo o país durante a tarde. Em Yangon, colunas de fumaça eram observadas na antiga capital do país, que se tornou o foco das manifestações nas últimas semanas.

A partir de depoimentos e declarações de membros dos serviços de emergência, a AFP conseguiu confirmar pelo menos 25 mortes.

A região central de Mandalay foi cenário de uma onda de caos e distúrbios. As forças de segurança abriram fogo de maneira indiscriminada e em cinco cidades morreram pelo menos 10 pessoas, incluindo uma adolescente de 14 anos em Meiktila.

"Trouxeram quatro homens mortos", afirmou um funcionário do serviço de emergência em Mandalay à AFP, enquanto tentava atender dezenas de feridos.

Um protesto diante da prisão de Insein também provocou cenas caóticas quando os soldados abriram fogo. Ao menos um manifestante morreu, um agente de polícia de 21 anos, Chit Lin Thu, que se uniu ao movimento contra o golpe.

"Estou muito triste, mas ao mesmo tempo estou orgulhoso do meu filho", declarou à AFP o pai do jovem, Joseph.

"Jornada de desonra"

A brutalidade da repressão provocou condenações internacionais e sanções contra militares, mas a pressão diplomática teve pouco efeito até o momento.

"Este 76º Dia das Forças Armadas será recordado como uma jornada de terror e desonra. As mortes de civis desarmados, incluindo crianças, são atos indefensáveis", afirmou a embaixada da União Europeia (UE) em Yangon.

"As forças de segurança estão matando civis desarmados, crianças, as pessoas que juraram proteger", lamenta um comunicado da embaixada dos Estados Unidos.

Uma mensagem oficial exibida pela televisão estatal na sexta-feira advertiu os jovens a não participar no que denominava de "movimento violento" contra o regime militar.

"Aprendam a lição dos que morreram (...) Não morram em vão", afirmava a mensagem.

De acordo com a AAPP, 320 pessoas morreram na repressão desde o golpe e mais de 3.000 foram detidas.