Numa onda de sanções aplicadas ontem contra integrantes do governo de Xi Jinping, por conta de violações aos direitos humanos da minoria muçulmana uigur, o Ocidente deixou Pequim enfurecido. O primeiro movimento partiu da União Europeia (UE). Em seguida, Estados Unidos, Reino Unido e Canadá também anunciaram medidas. A resposta não tardou, e a China investiu contra legisladores e acadêmicos europeus.
Logo cedo, o Diário Oficial da UE publicou os nomes de quatro autoridades da região autônoma de Xinjiang identificados como responsáveis pela repressão e maus-tratos a uigures — eles estão proibidos de viajar para os 27 países do bloco e tiveram bens na comunidade congelados. São as primeiras sanções adotadas por europeus contra autoridades chinesas desde a sangrenta repressão na Praça da Paz Celestial (Tiananmen), em 1989.
Imediatamente, o governo Xi publicou uma lista de 10 cidadãos europeus, que inclui parlamentares e quatro entidades sujeitas a sanções. Em um comunicado, a chancelaria chinesa observou que as medidas europeias constituíam uma “interferência grosseira” em seus assuntos internos.
Atrito
“Esse gesto, baseado em nada além de mentiras e desinformação, descarta e distorce os fatos”, declarou a chancelaria chinesa, assinalando que também afeta as relações entre Pequim e o bloco econômico. Os europeus e suas famílias serão proibidos de permanecer na China, Hong Kong e Macau. A medida diz respeito também ao Comitê Político e de Segurança, órgão que reúne os embaixadores dos Estados-membros em Bruxelas e que preparou as penalidades.
O chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, considerou as medidas de reciprocidade inaceitáveis e reiterou a determinação do bloco em relação à defesa dos direitos humanos. “Em vez de mudar suas políticas e atender às nossas preocupações legítimas, a China, mais uma vez, volta-se para o outro lado”, criticou Borrell.
A UE puniu o ex-secretário do Comitê de Assuntos Políticos e Jurídicos de Xinjiang, Zhu Hailun, bem como três outros funcionários da mesma região autônoma.
Em contrapartida, a lista dos punidos pela China inclui 10 eurodeputados — o francês Raphael Glucksmann, os alemães Reinhard Butikofer e Michael Gahler, o búlgaro Ilhan Kyuchyuk e a eslovaca Miriam Lexmann — além do acadêmico alemão Adrian Zenz, entre outros. “Não estou surpreso (...) dado o meu papel em revelar a extensão das violações dos direitos humanos em Xinjiang”, disse Zenz à agência de notícias France Presse.
Raphaël Glucksmann, que está empenhado na defesa dos uigures, disse estar lisonjeado com a decisão das autoridades chinesas. “Soube que sou alvo de sanções chinesas, banido do território chinês (assim como toda a minha família!) e proibido de qualquer contato com instituições oficiais e empresas chinesas em minha defesa do povo uigur: é minha legião de ‘honra’”, escreveu no Twitter.
“A resposta cada vez mais firme da China às sanções da UE é ridícula. A China está conseguindo virar os quatro principais grupos políticos no Parlamento Europeu contra ela de uma só vez”, comentou, por sua vez, o alemão Reinhard Butikofer.
O governo da Holanda convocou o embaixador chinês no país, após sanções contra o deputado Sjoerd Sjoerdsma. A França também criticou a ação de Pequim, bem como as declarações da embaixada chinesa sobre um pesquisador e parlamentares franceses. Paris anunciou que irá convocar o embaixador.
Recém-separado da UE, o Reino também adotou medidas a quatro altos funcionários chineses. O chanceler britânico, Dominic Raab, afirmou que a China é culpada pela esterilização forçada de mulheres uigures, vigilância generalizada da minoria muçulmana e “a maior prisão em massa de um grupo étnico ou religioso desde a Segunda Guerra Mundial”.
Em Washington, o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos anunciou penalidades contra dois altos funcionários do governo Xi. “As autoridades chinesas continuarão a enfrentar as consequências enquanto ocorrerem atrocidades em Xinjiang”, afirmou Andrea Gacki, responsável pelo programa de sanções do Departamento do Tesouro.
“Esse gesto, baseado em nada além de mentiras e desinformação, descarta e distorce os fatos”
ministério chinês das Relações Exteriores
“Em vez de mudar suas políticas e atender às nossas preocupações legítimas, a China, mais uma vez, volta-se para o outro lado”
Josep Borrell, chefe da diplomacia europeia