POLÍTICA

Opositor russo Navalny, com duas condenações, pode ser enviado para campo de trabalho

Ele foi penalizado em um caso por "difamação" e, em outro, teve confirmada sua pena de prisão, que pode cumprir em um campo de trabalho

A justiça russa condenou por duas vezes neste sábado (20/2) o principal opositor do governo russo, Alexei Navalny. 

O ativista anticorrupção de 44 anos, conhecido por suas investigações sobre a fortuna das elites russas, foi condenado a sua primeira sentença de longo prazo em quase uma década de processos judiciais com as autoridades e pode ser transferido para um campo de trabalho forçado.

Navalny foi detido no mês passado, quando voltou à Rússia. Ele passou meses em tratamento na Alemanha, depois de sofrer um envenenamento que quase lhe custou a vida. O adversário do presidente Vladimir Putin acusa o Kremlin. Em 2 de fevereiro, foi condenado a dois anos e oito meses de prisão.

Mas, neste sábado, um juiz de Moscou reduziu esta pena em um mês e meio, levando em consideração o tempo que ele passou em prisão domiciliar.

Em outra audiência, Navalny foi condenado a pagar uma multa de 850 mil rublos (cerca de 11.500 dólares) por ter "difamado" um veterano da Segunda Guerra Mundial em um vídeo.

Assim, o opositor terá que cumprir pena de cerca de dois anos e meio de prisão. A justiça transformou uma sentença por fraude, que remonta a 2014 e que ele poderia cumprir em liberdade, em uma sentença com cumprimento de pena na prisão. Alega-se que o ativista violou o controle judicial durante seu período de recuperação na Alemanha.

Bíblia e Harry Potter 

Na primeira audiência do dia, Navalny rejeitou a condenação e assegurou que sua intenção, ao ir para a Alemanha, não era se livrar das autoridades russas, às quais, inclusive, advertiu sobre seu retorno ao país.

"Comprei uma passagem e disse a todo mundo que voltaria para casa. Isso é um absurdo", disse ele ao juiz.

O promotor respondeu que o réu infringiu a lei "abertamente" e que se comportava como se estivesse acima das normas.

"Nosso país se apoia na injustiça", declarou Navalny, após ouvir a sentença, antes de citar a Bíblia: "Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão satisfeitos".

Além disso, ele mencionou uma passagem de Harry Potter sobre a "importância" de não "se sentir sozinho", porque é isso que Voldemort, o inimigo do famoso bruxo, gostaria.

Durante sua segunda audiência, ele também foi provocador, brincando. "Por que estão tão tristes?", perguntou, dizendo que havia tentado fazer sorvete no centro de detenção e também que havia preparado picles.

Em audiências anteriores, Navalny denunciou que os tribunais estavam manipulando o veterano de 94 anos para reprimir um adversário.

Campo de detenção 

Uliana Solopova, porta-voz do tribunal de Moscou, disse à AFP na sexta-feira (19) que os serviços penitenciários poderão transferir Navalny para um dos vários campos de trabalho da Rússia, se sua condenação for confirmada.

Uma herança da extinta União Soviética, a maioria das sentenças de prisão da Rússia é cumprida em campos de trabalho prisionais, muitas vezes longe de tudo. O trabalho dos detentos, em geral em oficinas de costura, ou de fabricação de móveis, é obrigatório.

As condições de detenção costumam ser alvo de denúncias frequentes de defensores dos direitos humanos.

Um advogado do opositor indicou que recorrerá da decisão.

O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, disse que a sentença não mudará o cenário político "rico e plural" da Rússia diante das eleições legislativas de setembro.

As duas audiências aconteceram depois que a Corte Europeia de Direitos Humanos (CEDH) exigiu, esta semana, a libertação deste militante anticorrupção de 44 anos, alegando que há risco para sua vida.

Moscou rejeitou o pedido da CEDH, como já havia feito em relação aos da União Europeia, apesar da ameaça de novas sanções.

Navalny, cuja prisão em janeiro gerou três dias de protestos reprimidos pela polícia, denuncia que esses procedimentos judiciais são uma armação contra ele.

Segundo o ativista, o Kremlin quer colocá-lo na prisão para silenciá-lo, depois do fracasso na tentativa de assassiná-lo por envenenamento no verão passado. Moscou refuta essas acusações.

União Europeia e Estados Unidos multiplicaram os apelos por sua libertação, enquanto seus colaboradores insistiam em que o Ocidente deveria impor sanções às autoridades russas e às pessoas próximas a Putin.

Moscou vê isso como uma "interferência" em seus assuntos domésticos e ameaçou retaliar os europeus.