Em 11 meses, 257.115 equatorianos (1,5% da população) foram infectados pela covid-19. Desse total, 15.004 morreram. O medo da pandemia pode ser determinante para as eleições presidenciais e parlamentares deste domingo, com expectativa de alta taxa de abstenção. Apesar do número recorde de 16 candidatos à sucessão de Lenín Moreno, dois despontam como os favoritos à cadeira do Palácio de Carondelet: o economista Andrés Arauz, 36 anos completados ontem, afilhado político do ex-presidente socialista Rafael Correa, e o banqueiro Guillermo Lasso, 65. Sob forte polarização, 13.099.150 equatorianos escolherão, hoje, entre a manutenção do projeto da esquerda e uma guinada radical rumo à direita. Além do novo chefe de Estado e do vice, serão eleitos os 137 deputados da Assembleia Nacional e cinco representantes do Parlamento Andino.
A lei eleitoral equatoriana proíbe a divulgação de pesquisas às vésperas do pleito. As sondagens mais recentes, publicadas havia uma semana, colocavam Arauz — da aliança União pela Esperança (Unes) — com 32% dos votos, enquanto Lasso tinha 21%. Ninguém ousa fazer prognósticos ante o fator comparecimento às urnas, ainda que os números sugiram um provável segundo turno, em 11 de abril. Segundo o jornal El Comercio, para reduzir o risco de contágio pela covid-19, os 271.642 mesários tiveram acesso a testes de diagnóstico gratuitos, entre terça-feira e ontem. Eles usarão viseiras e máscaras e desinfetarão, com álcool, as cabines de votação a cada 20 eleitores.
Arauz, o principal candidato da esquerda, está impossibilitado de votar em Quito, pois tem registro no México, seu antigo domicílio. “Não pode, só poderia votar no México”, disse à agência France-Presse Enrique Pita, vice-presidente do Conselho Nacional do Equador (CNE). O voto é obrigatório para os equatorianos entre 18 e 65 anos que vivem em seu país, mas, opcional para os que residem no exterior, de acordo com a legislação.
Perseguição
Na sexta-feira, o ex-presidente Rafael Correa enviou mensagem em vídeo na qual disse não recordar de “tão brutal perseguição a um grupo político”. “Apesar de todas as tentativas, os corruptos não conseguiram impedir nossa participação (nas eleições), não puderam suspender as eleições, e sabem que estão perdidos. O fim do pior governo da história está muito próximo”, anunciou. “Eles estão desesperados, inventando os maiores disparates. (…) Nunca de esqueçam dos cúmplices de Moreno”, acrescentou, ao denunciar “a imprensa corrupta, os banqueiros e as câmaras empresariais”. Segundo ele, “o Equador merece um presidente que se pareça com seu povo, com a gente que sofre, com quem deseja trabalhar e não lhes deixam”.
Correa, que governou entre 2007 e 2017 e hoje mora na Bélgica, citou um trecho da canção Solo le pido a Dios, do argentino León Gieco, imortalizada na voz de Mercedes Sosa. “Eu só peço a Deus que o engano não me seja indiferente. Se um traidor pode mais que uns muitos, que estes muitos não o esqueçam facilmente.” Em 2019, ele foi inabilitado para cargos públicos, depois de ter sido condenado a oito anos de prisão por corrupção.
Uma vitória de Arauz acabaria com qualquer traço da direita na administração de Moreno, a quem o correísmo chama de “traidor”. “O modelo político e econômico do país não será exatamente do correísmo, mas sim, terão os traços fundamentais dos dez anos do ex-presidente Correa”, disse à agência France-Presse o cientista político Santiago Basabe, professor da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), em Quito. O também cientista político Paolo Moncagatta, da Universidade San Francisco de Quioto, acredita que um eventual segundo turno seria contaminado por uma “campanha suja e violenta”. A política equatoriana teve períodos de turbulência: entre 1996 e 2007, o país chegou a ter sete presidentes, três deles destituídos em revoltas sociais.