O coronavírus mudou a forma como viajamos e muitos países agora exigem prova de um teste de covid-19 negativo antes de deixarem o viajante entrar ou sair. A repórter da BBC Joice Etutu conversou com duas mulheres que admitiram usar e vender certificados falsos.
"Eu estava um pouco nervosa, porque não sabia o que esperar", conta Louise*, de 24 anos, que viajou para Gana em outubro usando um certificado falso de teste de covid-19. O documento é exigido por alguns países para provar que uma pessoa não tem o vírus e está apta a viajar.
"Quando cheguei ao balcão onde os passaportes são verificados antes de embarcar no avião, o funcionário pediu meu certificado. Ele literalmente passou os olhos por não mais do que 10 ou 20 segundos, e então sorriu, perguntou aonde eu estava indo e disse 'boa viagem'."
"Fiquei aliviada porque sabia que, passada essa etapa, eu estava livre."
Gana é um dos países que passaram a exigir certificados de testes negativos de covid-19. Louise conta que precisou viajar ao país por motivo de trabalho e não podia pagar pelo teste.
Eles podem custar entre 100 e 300 libras (entre R$ 744 e R$ 2,2 mil), então ela pesquisou como conseguir um certificado falso.
"Perguntei a conhecidos: 'Quem sabe usar photoshop?' Pedi a amigos para ver os testes de covid deles, só para ter uma ideia da aparência do certificado e então consegui alguém para fazer um para mim."
Comprar ou mesmo tentar comprar um certificado falsificado é crime no Reino Unido e usar um certificado falso para viajar é fraude por falsidade ideológica. Quem for pego vendendo certificados falsos pode ser condenado à prisão.
Atualmente, é responsabilidade das companhias aéreas checar se os passageiros têm teste negativo.
Jéssica* também tem 24 anos. Ele admite ter vendido certificados falsos para pessoas que queriam viajar ao exterior, tendo anunciado seus serviços em redes sociais.
Segundo ela, "era dinheiro fácil".
"Eles simplesmente não queriam pagar 150 libras (R$ 1,1 mil) por um teste em laboratório privado", afirma. "Nós cobrávamos 50 libras (R$ 370)."
"Porque era tão barato, as pessoas faziam muitas perguntas, tipo: 'Como funciona?, 'Quando eu chegar ao outro país o certificado será verificado novamente?', 'Como vocês fazem?', 'Eu posso entrar numa encrenca?'"
Jéssica justifica a atividade fraudulenta para si mesma argumentando que é mãe solo.
"Não tenho ajuda de ninguém, não recebo nenhum dinheiro. Se for preciso correr um pequeno risco para ganhar 300 libras (R$ 2,2 mil) para alimentar meu filho, pode estar certa que vou correr esse risco."
Ela percebeu que havia um mercado para certificados falsos após ela mesma precisar de um para viajar. Sem querer pagar o preço por um teste em laboratório privado, um amigo disse a ela que conhecia alguém que tinha um certificado falso. Então ela decidiu começar um negócio na mesma linha.
Jéssica admite ter vendido oito certificados falsos, mas ela decidiu parar ao se dar conta do impacto da covid-19 na vida das pessoas.
"Me sinto mal agora. Trabalho no setor de saúde, então obviamente não quero ter esse peso na consciência."
"Pessoas estão se contaminando com coronavírus por minha causa. Em outros países onde não há acesso ao sistema de saúde como temos aqui."
'Economizei centenas de libras usando um certificado falso'
"Para mim, foi mais uma questão financeira", diz Louise, sobre sua atividade fraudulenta. "Não era porque eu não queria fazer o teste."
"Simplesmente não era possível. Algumas pessoas podem pensar: 'Mas então por que você está viajando?' Eu economizei entre 200 e 250 libras (entre R$ 1,5 mil e R$ 1,9 mil) usando um certificado falso."
Como Jéssica, Louise sabia que estava cometendo fraude, mas ela diz que faria novamente.
"Enquanto não houver um sistema eletrônico que possa identificar em que clínica ou hospital alguém fez um teste, não vejo porque eu deveria me preocupar."
Atualmente, existem apenas exemplos anedóticos que demonstram a escala do problema.
A Europol, inteligência policial da União Europeia, alertou recentemente quanto ao uso de certificados de testagem falsos, apontando ação de grupos criminosos.
Um homem foi preso em janeiro no aeroporto de Luton, em Londres, sob suspeita de vender certificados falsos.
Em Paris, autoridades francesas prenderam recentemente sete pessoas no aeroporto Charles de Gaulle, alegando que eles portavam 200 testes falsos em dispositivos digitais.
O governo britânico admite como prova de testagem negativa documento impresso, e-mail ou mensagem de texto.
A prova deve incluir dados pessoas, a data de realização do teste e o nome e contato de quem realizou o teste.
A Iata (Associação Internacional de Transporte Aéreo), entidade internacional que representa as companhias aéreas, apresentou uma possível solução para que certificados falsos sejam identificados.
A entidade sugeriu a criação de um "aplicativo de viagem da Iata" , segundo Alan Murray Hayden, diretor da associação.
O passageiro criaria um perfil com base nas informações de seu passaporte. Ao receber o resultado de um teste, o laboratório poderia enviá-lo como uma "credencial verificável".
Com isso, o passageiro não poderia alterar ou modificar o resultado e ele seria atrelado à sua identidade.
Numa declaração, o Departamento de Transporte disse que a testagem pré-voo foi implementada para proteger a saúde da população britânica e que aqueles que tentam burlar o sistema são egoístas e arriscam suas vidas e as dos outros.
*Os nomes originais de Louise e Jéssica foram alterados.
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