SAÚDE

Argentinos contam como se sentem com o início da vacinação no país

Mais de 166 mil enfermeiros, 7.749 estabelecimentos e 10 mil voluntários participam da maior campanha de vacinação da história do país. Os primeiros funcionários da saúde a receberem o imunizante russo Sputnik V relataram ao Correio sentimentos de alegria e de gratidão

Quando Fabiana Geliberti, 51 anos, recebeu a aplicação da vacina russa Sputnik V contra a covid-19, emocionou-se. “Eu pensei em todos os companheiros que ficaram doentes neste ano e em meus amigos que perderam os pais”, contou ao Correio, por telefone, a médica especialista em cuidados paliativos e geriatria do Hospital Geral Cosme Argerich, no bairro de La Boca, em Buenos Aires. “A vacina veio de muito longe e eu não tinha dúvida nenhuma em ser inoculada. É um alívio saber que estamos a um passo a mais do controle dessa doença. Também me sinto mais aliviada por minha família”, acrescentou.

A 1.586km ao sul, a geneticista Patricia Valeria Blanco, 47, ficou com a voz embargada ao falar à reportagem. “A vacinação é um evento de suma importância, pois passamos tempo demais em meio a essa pandemia. Eu agradeço profundamente ao meu governo por essa gestão e a Deus pela oportunidade de vacinar-me”, disse a funcionária do Hospital Zonal Ramón Carrillo, de San Carlos de Bariloche, na província de Rio Negro. A infectologista Carolina Subirá, 36, foi a segunda pessoa a receber a dose da vacina na província de Santa Fé. “Foi um grande luxo, uma grande alegria. Nós esperávamos por isso com muita ansiedade”, comentou a moradora de Rosário (Santa Fé), que trabalha no Sanatório Parque.

Com 1,5 milhão de casos de infecção pelo Sars-CoV-2 confirmados e 42.868 mortes, a Argentina começou, às 9h de ontem (hora de Brasília), uma grande campanha de vacinação, tornando-se o quarto país latino-americano a imunizar a população contra a covid-19, depois do México, da Costa Rica e do Chile. Também é a terceira nação do mundo a inocular os cidadãos com o imunizante produzido pelo laboratório russo Gamaleya, depois da própria Rússia e da Bielorrússia. Uma nova dose da vacina será aplicada em 21 dias.

O governo de Alberto Fernández mobilizou 166 mil enfermeiros em 7.749 estabelecimentos, além de 10 mil voluntários. Entre janeiro e fevereiro, mais 20 milhões de doses chegarão à Argentina. A Sputnik V é recebida com ceticismo. Segundo o jornal La Nación, um relatório da diretoria da Administração Nacional de Medicamentos, Alimentos e Tecnologia Médica (Anmat), na Argentina, afirma que três adultos com mais de 60 anos, voluntários na fase 3 dos testes clínicos, sofreram graves efeitos adversos. “Cólica renal, trombose venosa profunda e abscesso de membro causado por um corte de unha infeliz”, comentou Denis Logunov, vice-diretor do Gamaleya, ao justificar os danos colaterias.

“Hoje, começou, em todo o país, a campanha de vacinação contra a covid-19, a maior de nossa história. Depois de tanto esforço, demos o primeiro passo para deixar para trás a pandemia, mas ainda falta muito. Enquanto nos vacinamos, sigamos nos cuidando”, afirmou a Casa Rosada, sede da Presidência. “A ideia é começar a vacinação com os que estão mais expostos ao risco. É realmente épico fazer a maior campanha de vacinação da Argentina com igualdade de acesso”, declarou o ministro da Saúde, Ginés González García, a quem coube dar o “pontapé” no processo, no Hospital Posadas, em Buenos Aires.

“Meu compromisso é o de transmitir confiança em relação à campanha de vacinação. Não importa o imunizante usado, a covid-19 transcendeu todas as fronteiras. A vacina também deveria fazê-lo”, disse Carolina Subirá. Ela lembrou que a imunização não pertence a um país ou a outro. “É o esforço de milhares de cientistas. É a ciência colocada a serviço da humanide. Ser beneficiada pelas primeiras doses me dá grande felicidade. Eu a tomei de bom grado, com alegria”, acrescentou a infectologista, que relatou ter sentido apenas uma dor leve localizada e, depois de algumas horas, sensação febril e mialgias (dores musculares). Ela descarta temores sobre a Sputnik V e lembra que o imunizante foi submetido a testes clínicos exigentes.

Para Fabiana Geliberti, o que mais a comove durante a pandemia da covid-19 é a exigência de isolar-se os pacientes. “Emociona-me o fato de os pacientes morrerem sozinhos, distantes dos familiares. Tomara que essa etapa da pademia tenha passado”, desabafou. Por sua vez, Patricia Blanco, que trabalha diretamente com testes de diagnóstico PCR para covid-19, admitiu que confia mais na Sputnik V e na vacina da AstraZeneca por usarem a tecnologia de adenovírus modificado, em detrimento dos imunizantes da Pfizer/BioNTech e da Moderna, baseadas em RNA mensageiro.