Diante de uma eleição cujo resultado ainda vai demorar e dependerá, ao que tudo indica, de sucessivas batalhas judiciais, os candidatos Donald Trump (Partido Republicano) e Joe Biden (Partido Democrata) lançaram fundos de arrecadação de doações e deram início a uma espécie de segunda campanha eleitoral. Desde ontem, os sites dos candidatos passaram a exibir vinhetas de doações com textos solicitando aos eleitores doações para que possam seguir com as batalhas judiciais.
A campanha de Donald Trump lançou o Fundo Oficial de Defesa das Eleições e um chamado no site da campanha promete um “match” de 1000% aos apoiadores. Em entrevista ao The New York Times, o porta-voz da campanha do republicano, Tim Murtaugh, explicou que a judicialização da eleição exigirá um gasto extra. “O processo da eleição neste ano está se dando em circunstâncias extraordinárias e também estamos antecipando que Silicon Valley tentará interferir nos nossos esforços de arrecadação pós-eleição”, disse o porta-voz.
A iniciativa gerou crítica entre os democratas, embora eles também estejam pedindo aos apoiadores que contribuam com doações para o Fundo de luta de Biden. No site da campanha do democrata, a vinheta sugere quantias entre US$ 15 (R$ 82,80) e US$ 2.800 (R$ 15.456) e diz: “Joe Biden será o próximo presidente dos Estados Unidos — mas o presidente ameaça ir aos tribunais para impedir a contagem dos votos. Nós estamos colocando de pé um esforço legal abrangente e nunca antes organizado. Esse trabalho pode se estender por semanas e o financiamento é mais importante do que nunca.”
Os fundos pós-eleições são mais um episódio em uma campanha com superlativos e ineditismo. Se a eleição de 2020 bateu recorde de eleitores, ela também ultrapassou as anteriores em valores gastos para a corrida à Presidência e às casas legislativas. Um total de US$ 14 bilhões (R$ 77,2 bilhões) foi gasto pelos candidatos nas eleições presidenciais e legislativas nos Estados Unidos. Recorde absoluto. Esse valor é quase o dobro do gasto há quatro anos e mais do que o triplo da despesa em 2000, de acordo com o Center for Responsive Politics (centro de estudos independente sobre gastos eleitorais).
Mas, o alto investimento não garante o sucesso de nenhum candidato. Buscando retomar o controle do Senado, os democratas gastaram bilhões para conquistar assentos de pesos pesados republicanos, como o do líder da Câmara Alta, Mitch McConnell (Kentucky), e dos senadores Lindsey Graham (Carolina do Sul) e Susan Collins (Maine). Não deu certo e eles acabaram reeleitos no pleito de terça-feira.
O democrata Jaime Harrison foi derrotado facilmente por Lindsey Graham depois de gastar um recorde de US$ 108 milhões, muito mais do que seu adversário, graças a doações de democratas de todo o país, de acordo com Karl Evers-Hillstrom, do Center for Responsive Politics. “Eu digo a todos os progressistas, na Califórnia e em Nova York: eles perderam muito dinheiro”, brincou Graham, após sua reeleição.
Outra derrota retumbante foi a de Amy McGrath, cuja missão era derrubar Mitch McConnell, no Senado há 45 anos, e um pesadelo dos democratas. Líder do partido republicano na casa, McConnell é o responsável por impedir que muitos dos projetos de Barack Obama avançassem. Isso dificultou o mandato do então presidente democrata. McGrath, ex-piloto de caça, gastou US$ 88 milhões (R$ 485,76 milhões) em vão na segunda batalha mais cara da história das eleições para o Senado.
Os republicanos perderam algumas apostas caras, mas menos espetaculares. Eles arrecadaram US$ 10 milhões (R$ 55,2 milhões) em todo o país para evitar a reeleição, em Nova York, da deputada Alexandria Ocasio-Cortez, estrela da ala mais à esquerda do Partido Democrata e encarnação da suposta ameaça “socialista”, denunciada pelos trumpistas.
Mas, a legisladora de 31 anos venceu o rival, o ex-policial e professor católico John Cummings, de 60 anos, por 38 pontos percentuais, depois de arrecadar US$ 17 milhões (R$ 93,84 milhões) para sua campanha em uma das batalhas eleitorais mais caras para a Câmara dos Representantes.
Insatisfação
Para Michael Malbin, professor de ciência política da State University of New York (SUNY) e especialista em finança eleitoral, os gastos milionários se devem à crescente polarização da era Trump e a motivação é um dos elementos essenciais para cada doador. Raiva e rejeição, seja do “trumpismo” ou de “esquerdistas”, por exemplo, seriam motivadores mais poderosos do que o apoio a uma causa específica. Por isso, não surpreende que as maiores somas são doadas para as campanhas de candidatos apaixonados, como Mitch McConnell, Lindsey Graham ou Ocasio-Cortez.
Enquanto milhares de doadores financiam as batalhas com ampla exposição na mídia, “90% das campanhas eleitorais do país são subfinanciadas”, enfatiza Malbin. Os valores maiores também são explicados pela simplificação na doação de dinheiro a um candidato graças à tecnologia digital, que teve os democratas como pioneiros na plataforma ActBlue, lançada em 2004. “Tornou-se incrivelmente simples. Basta clicar”, disse Malbin.
“Joe Biden será o próximo presidente dos Estados Unidos — mas o presidente ameaça ir aos tribunais para impedir a contagem dos votos. Nós estamos colocando de pé um esforço legal abrangente e nunca antes organizado. Esse trabalho pode se estender por semanas e o financiamento é mais importante do que nunca”
Vinheta no site da campanha do democrata Joe Biden