A ONU alertou nesta sexta-feira para possíveis crimes devido aos muitos civis que morreram na região de Tigré, na Etiópia, onde o governo federal lançou uma operação militar há dez dias.
O primeiro-ministro Abiy Ahmed, ganhador do prêmio Nobel da Paz no ano passado, ordenou esta operação na região dissidente, causando choque na comunidade internacional, que teme o início de uma longa e sangrenta guerra civil.
Centenas de pessoas foram mortas e milhares fugiram dos combates e ataques aéreos em Tigré, cujos líderes Abiy acusa de tentar desestabilizar o país.
A Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, pediu uma investigação abrangente sobre os relatos de um massacre na cidade de Mai-Kadra, relatados pela Anistia Internacional.
"Se for confirmado que eles foram cometidos deliberadamente por uma das partes no conflito, essas mortes de civis certamente equivaleriam a crimes de guerra", disse Bachelet em um comunicado.
Segundo testemunhas, o massacre foi perpetrado pela guerrilha da região dissidente de Tigré, a Frente de Libertação do Povo Tigré (TPLF, por sua sigla em inglês).
Também destacaram que algumas vítimas eram da região de Amhara, uma área com um longo histórico de tensões com o Tigré.
Milhares de milicianos de Amhara foram posicionados na fronteira com o Tigré para lutar ao lado das forças federais.
O líder da TPLF, Debretsion Gebremichael, disse à AFP nesta sexta-feira que essas acusações eram "infundadas".
Abiy Ahmed afirma que sua operação militar é uma resposta aos ataques a dois campos militares federais pela TPLF, que no passado dominou a política etíope e que afirma ter sido marginalizada e atacada pelo primeiro-ministro. O partido nega ter realizado esses ataques.
Estados Unidos pediu que "medidas imediatas sejam tomadas para reduzir a escalada" e expressou sua preocupação pelo "massacre de civis".
'Cercada por todos os lados'
As tensões entre Abiy e a TPLF aumentaram em setembro, quando, depois que as eleições nacionais foram suspensas devido ao coronavírus, a região deu início às suas próprias eleições, insistindo que Abiy era um líder ilegítimo.
Nesta sexta-feira, Abiy Ahmed enviou uma mensagem à região, especialmente aos seus soldados, instando-os a "se levantar" e ficar ao lado do exército nacional.
"Essa força do mal está cercada por todos os lados. É uma força em seu último suspiro. Seus filhos estão sofrendo mortes e ferimentos na frente", declarou em discurso transmitido no Facebook no idioma da região.
Um apagão de comunicações no Tigré tornou difícil verificar as reivindicações de cada lado no terreno, mas Abiy Ahmed prometeu uma vitória decisiva "em um período de tempo relativamente curto".
"Isso é um sonho. Somos pessoas orgulhosas que podem se defender. Este é um cemitério de invasores", respondeu Debretsion.
Michelle Bachelet advertiu que se o conflito continuar "há o risco de que a situação saia do controle, causando muitas vítimas e destruição, assim como deslocamentos em larga escala dentro da própria Etiópia e através das fronteiras".
É crescente a preocupação com a situação da população de Tigré, após a intensificação dos combates e vários ataques aéreos.
Milhares de pessoas já cruzaram a fronteira com o vizinho Sudão.
O líder do Tigré, Debretsion Gebremicha, indicou por sua vez que centenas de milhares foram deslocados dentro da própria região.
Ele também afirmou que civis foram mortos em ataques aéreos do governo na capital regional Mekele, bem como na cidade de Adigrat, perto da fronteira com a Eritreia.
"As pessoas estão fugindo em cada esquina. A maior consequência do conflito atual é o deslocamento. Claro, há vítimas, mas não temos os números. Isso é muito grande para lidar", disse ele.
De acordo com a mídia etíope, um mandado de prisão foi emitido para Debretsion e outros líderes da TPLF.
O Sudão anunciou quinta-feira que acolherá milhares de etíopes que cruzam a fronteira a pé, de bicicleta ou a bordo de barcos, no campo que na década de 1980 acolhia as vítimas da fome.
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