Em um aceno à ala mais linha-dura do Partido Republicano, o presidente Donald Trump reduziu a cota de refugiados admitidos nos Estados Unidos ao limite de 15 mil pessoas em 2021, um mínimo histórico. A apenas 33 dias das eleições e em desvantagem nas pesquisas, o magnata republicano provocou indignação de organizações dos direitos humanos. O anúncio, feito pelo Departamento de Estado norte-americano, coincidiu com o avanço de uma caravana de 3 mil migrantes hondurenhos, que forçaram a entrada na Guatemala e tentarão chegar a pé aos Estados Unidos nas próximas semanas. Os hondurenhos, que fogem da miséria e da violência, desafiaram a pandemia da covid-19 e atravessaram a fronteira sem submeterem-se a testes para a detecção do coronavírus.
Enquanto limitava a concessão de refúgio, Trump se silenciava ante as acusações de se simpatizar com supremacistas brancos, sinalizava a não aceitação de mudanças nos próximos debates e era processado por advogados dos direitos humanos por uma ordem executiva que ameaçava “graves consequências” para qualquer um que apoiasse o trabalho do Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia.
Professora de direito da Faculdade de Direito Cleveland-Marshall e uma das demandantes da ação contra Trump, Milena Sterio disse ao Correio que a decisão de Trump em relação aos refugiados é “consistente” com a política migratória do governo republicano. “O presidente fez campanha, em 2016, com a promessa de construir um muro na fronteira com o México. Durante sua gestão, implementou uma política de separação de famílias na divisa com o México, como uma iniciativa para deter migrantes de virem para os EUA”, afirmou. “O governo Trump teve, portanto, uma atitude negativa no que diz respeito aos refugiados e migrantes; e tentou limitar os procedimentos legais para que esses estrangeiros viessem ao nosso país. Por exemplo, ao forçar aqueles que chegarem por meio do México a solicitarem asilo, antes de cruzarem a fronteira.”
Nos próximos 12 meses, um máximo de 15 mil refugiados poderá ser admitido no país, caso Trump vença as eleições de 3 de novembro, contra os 18 mil refugiados autorizados este ano, segundo a agência de notícias France-Presse (AFP). Durante o governo de Barack Obama, uma média de 100 mil refúgios era concedida por ano. Em comunicado, o Departamento de Estado americano informou que, “ao nos concentrarmos primeiro em acabar com os conflitos que envolvem os deslocamentos e fornecendo uma ajuda humanitária no exterior para proteger e ajudar as pessoas deslocadas, podemos prevenir os efeitos desestabilizadores desses deslocamentos nos países afetados e seus vizinhos”.
Presidente da Refugees International, Eric Schwartz disse à AFP que “a ação do presidente é decepcionante, mas não surpreende”. Por sua vez, Manar Waheed, da União Americana pelas Liberdades Civis (ACLU), afirmou que Trump tenta eliminar os sistemas de imigração “para detê-los e garantir que os imigrantes negros e pardos não tenham refúgio em nossa nação”.
Também uma das coordenadoras para Parcerias de Justiça Global do Grupo de Política e Direito Internacional Público, em Cleveland, Sterio contou que decidiu processar Trump por uma ordem executiva que sancionava funcionários do TPI, bem como aqueles que fornecem assistência material à Corte. “Isso causa arrepios em nossa liberdade de expressão protegida pela Constituição e em nossa capacidade de nos envolver em esforços acadêmicos, como escrever e publicar artigos e livros. A ordem executiva de Trump impõe uma restrição inconstitucional ao livre pensar”, acrescentou.
Racismo
A porta-voz da Casa Branca, Kaleygh McEnany, bateu boca com repórteres, em uma tumultuada coletiva de imprensa, ao rebater comentários de que Trump teria pedido ao grupo de supremacistas brancos “Proud Boys” para “recuar e aguardar”, durante o debate de terça-feira. McEnany assegurou que recuar era um sinônimo para “ficar quieto”. “Você pode denunciar agora a supremacia branca e os grupos que a defendem?”, perguntou John Roberts, correspondente da Fox News. “Acabei de fazer isso”, respondeu.
Para Milena Sterio, Trump alimenta a supremacia branca, ao se recusar a publicamente condená-la. “Assim, ele encoraja os grupos de supremacistas brancos a agirem. (…) O medo partilhado por muitos americanos é de que os supremacistas brancos tentarão intimidar os eleitores e impedir alguns de depositarem seus votos.”