De um lado, a senadora democrata Kamala Harris buscou desqualificar o governo do republicano Donald Trump na resposta à pandemia da covid-19, ao acusá-lo de politizar a crise sanitária. De outro, o vice-presidente dos EUA, Mike Pence, assegurou que o titular da Casa Branca priorizou a saúde pública. A pandemia da covid-19, que infectou 7,5 milhões de norte-americanos — incluindo Trump — e matou 211 mil, foi o tema que abriu o único debate entre os candidatos a vice.
Separados por uma barreira de acrílico, Kamala e Pence também debateram a economia, o trabalho do vice, as mudanças climáticas, a indicação da juíza Amy Coney Barrett para a Suprema Corte e a justiça racial. No entanto, a tônica do debate foi Trump. Enquanto Kamala buscou convencer o eleitorado sobre o fracasso do presidente, Pence o defendeu com unhas e dentes.
Não fossem três “detalhes”, o embate em Salt Lake City (Utah) talvez pouco chamasse a atenção dos norte-americanos e da comunidade internacional. A saúde de Trump e a idade de Joe Biden — além dos 77 anos, ele desperta rumores sobre sua condição física — lançaram holofotes sobre os candidatos, aptos a assumir o cargo de presidente, em caso de incapacidade do titular. Além disso, Kamala, 55, é a primeira mulher negra a concorrer ao posto de vice. “O povo americano tem testemunhado o que é o maior fracasso de um governo presidencial na história de nosso país”, afirmou Kamala.
De acordo com ela, em janeiro, Trump sabia o que ocorreria e escondeu a verdade da população. “Temos de salvar o nosso país, e Joe Biden é o melhor líder para isso.” Em uma das frases de Kamala mais citadas pela imprensa, ao fim do debate, abordou uma potencial vacina para a covid. “Se Donald Trump nos disser para tomá-la, eu não tomarei (a vacina)”, comentou. “Seu contínuo enfraquecimento da confiança em uma vacina é inaceitável”, rebateu Pence, que ficou com uma mosca sobre o cabelo durante, pelo menos, cinco minutos.
“Desde o primeiro dia, o presidente Donald Trump colocou a saúde do cidadão em primeiro lugar. Ele suspendeu todas as viagens para a China, a segunda maior economia do mundo. (…) A decisão de Trump nos deu tempo para a maior mobilização que fizemos desde a Segunda Guerra Mundial”, respondeu Pence. Kamala reforçou que a Casa Branca segurou os fatos. “O povo americano sacrificou-se muito por causa da incompetência desse governo”, sublinhou.
Ao citar a política externa, a senadora atacou Trump por tensionar as relações com nações aliadas, fracassar em enfrentar ditadores e reverter acordos internacionais negociados pelo ex-presidente Barack Obama. Pence pontuou a destruição do Estado Islâmico como o grande sucesso do governo.
A indicação de Coney Barrett para a Suprema Corte levou o tema do aborto para o debate. “Sempre lutarei pelo direito da mulher de tomar uma decisão sobre o próprio corpo. A decisão deve ser dela, e não de Trump e de Pence”, disse Kamala. “Eu sou pró-vida, não me desculpo por isso”, revidou Pence.
Em alusão a outro tema-chave para Trump, a imigração, Kamala frisou que o presidente “claramente chamou os mexicanos de estupradores”.
Economia e racismo
A democrata levantou a polêmica sobre os impostos de Trump. Ela lembrou que o republicano pagou US$ 750 em taxas e acumula dívidas de US$ 450 milhões. “Seria muito bom saber para quem o comandante-em-chefe os EUA está devendo. Joe mostra tudo, é honesto e correto”, afirmou Kamala. “Os relatórios não são exatos e nem precisos”, devolveu Pence. O atual vice acusou Biden de pretender eliminar todas as tarifas que Trump colocou em vigor e garantiu que 2021 “será o melhor ano da história do país”. Ao responder, Kamala foi interrompida. “Senhor vice-presidente, estou falando, por favor.”
Ao debater justiça racial, Kamala defendeu mudanças na polícia e afirmou que Trump fracassou, ao não denunciar a supremacia branca. “Precisamos reformar a nossa polícia e proibir o estrangulamento de suspeitos”, disse. Quando citou o assassinato de George Floyd — asfixiado por um policial branco (leia abaixo) —, Pence foi enfático: “Não há desculpas, a justiça será feita”. “Mas, também, não há desculpas para saques e violência”.
Em entrevista ao Correio, o brasileiro Juscelino Colares, Ph.D. em ciência política da Case Western Reserve University (em Cleveland, Ohio), disse que Pence apresentou-se de forma calma e sólida nos argumentos, enquanto Kamala saiu-se bem no iníco do debate, quando a pandemia foi colocada em discussão. “Mas, ela tratou do assunto como se não existisse uma pandemia, e isso fosse um problema apenas dos EUA. Entendo que as respostas de Pence se apresentaram mais contundentes. Ele apresentou êxitos do governo Trump, de forma cuidadosa, e desviou o foco do que Kamala tentou apresentar como algo negativo”, avaliou. “Não sei se os indecisos foram convencidos. Em 15 de outubro, Trump e Biden travam o segundo debate, em Miami.
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"Foi uma bênção de Deus o que eu peguei"
Apenas seis dias depois de contrair a covid-19, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, retornou ao trabalho no Salão Oval da Casa Branca, ignorando os riscos de infectar funcionários e desprezando o perigo representado pela doença. Em vídeo de quase cinco minutos, no fim da tarde de ontem, ele causou surpresa com uma declaração em especial. “Quero que todas as pessoas recebam o mesmo tratamento que o seu presidente, pois eu me sinto ótimo, eu me sinto perfeito. Acho que foi uma bênção de Deus o que eu peguei. Foi uma bênção dos céus”, afirmou, em alusão ao fato de ter pego covid-19. Trump também avisou que “a China vai pagar um preço alto por ter feito isso aos Estados Unidos e ao mundo”. “Isso foi culpa da China, lembrem-se disso!”, acrescentou.
Questionado minutos depois sobre as declarações de Trump, o candidato democrata à Casa Branca, Joe Biden, mostrou-se indignado: “Acho que é uma tragédia que o presidente fale da covid-19 como se fosse algo despreocupante, quando mais de 210 mil americanos morreram” da doença.
O porta-voz de Trump, Brian Morgenstern, anunciou que o magnata republicano comandou uma reunião informativa sobre o avanço do furacão Delta, que se aproxima do Texas e de Louisiana. Por meio do Twitter, Trump relatou que conversou com o primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson. “Muito agradecido por sua amizade e apoio, enquanto eu me recuperava do ‘Vírus da China’. Estou ansioso por trabalhar com ele por muitos anos, um ótimo cara!”, escreveu.
Sem sintomas
Sean P. Conley, médico do presidente, anunciou que o presidente não apresentou sintomas ao longo das últimas 24 horas e que está sem febre há quatro dias. Conley também contou que exames de amostras coletadas na segunda-feira detectaram indícios de anticorpos da covid-19.“Nosso presidente tem catastroficamente fracassado em controlar o coronavírus, sem uma estratégia e ao minizar a ameaça, mesmo, incrivelmente, quando ele próprio se viu gravemente doente”, opinou ao Correio Marc Lipsitch, epidemiologista e diretor do Centro de Dinâmica de Doenças Transmissíveis da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de Harvard.
Eu acho...
“Trump tem dado o exemplo errado com suas ações, colocando muitas pessoas em perigo e encorajando outras a fazerem o mesmo. Além disso, ele sabota as tentativas de encontrar uma solução bipartidária para ajudar as pessoas a sobreviverem — algo inescrupuloso.” Marc Lipsitch, epidemiologista e diretor do Centro de Dinâmica de Doenças Transmissíveis da Universidade de Harvard.