TRABALHE COM SATISFAÇÃO

Saiba como fazer carreira no Terceiro Setor

As organizações com um propósito estabelecido têm atraído profissionais talentosos em busca de um propósito para a vida

Talita de Souza*
postado em 16/05/2021 16:35 / atualizado em 16/05/2021 17:50
Trabalhar por uma causa social vem atraindo muitos profissionais competentes. Segundo pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), são 3 milhões de empregados em organizações não governamentais -  (crédito: Samuel Cintra/Divulgação)
Trabalhar por uma causa social vem atraindo muitos profissionais competentes. Segundo pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), são 3 milhões de empregados em organizações não governamentais - (crédito: Samuel Cintra/Divulgação)

Cerca de 74% dos profissionais entrevistados na pesquisa Propósito no trabalho, realizada em 2020, não aceitaram ou se desligaram de empresas por não sentirem satisfação no que faziam ou no trabalho que iriam exercer. A busca por oportunidades em locais que apresentam valores éticos e sociais deixou de ser algo secundário na vida dos brasileiros e passou a ser prioridade.

Além disso, a pesquisa organizada pela consultoria de recrutamento Talenses Group, constatou que 67% dos entrevistados consideram o propósito como um critério de atração mais relevante que a remuneração na hora de procurar um emprego. Apenas 53% disseram que encontram sentido no trabalho atual.

É neste cenário que o terceiro setor se destaca como uma opção para unir o trabalho com geração de renda e o sentimento de cumprir uma missão. Pequenas, médias ou de grande porte, organizações sem fins lucrativos atuam para atender a demandas sociais e ambientais. Marcos Fernandes, professor da Faculdade de Tecnologia e Inovação do Senac do Distrito Federal, conta que instituições sem fins lucrativos assumem muitas vezes a responsabilidades que o setor público deixa de ofertar à população.

Para Marcos Fernandes, o papel do terceiro setor é oferecer suporte direto a quem precisa
Para Marcos Fernandes, o papel do terceiro setor é oferecer suporte direto a quem precisa (foto: SENAC Brasília/Divulgação)

“O terceiro setor busca levar serviços e mantimentos para quem não é alcançado pelos setores público e particular, aqueles que vivem à margem por vários motivos, pessoas que, muitas vezes, não têm acesso nem ao básico que todos deveriam ter”, explica o professor do Senac-DF.

De acordo com o vice-presidente corporativo do Instituto Ayrton Senna, Ewerton Fulini, que migrou de uma empresa grande para a instituição, essa é a razão pela qual eles atuam.“Nossos problemas, como país, são grandes, complexos e de grande escala, por isso, precisamos da união dos três setores, público, particular e terceiro setor”.


“Há um número muito alto de locais ligados à saúde, à educação e a insumos básicos de sobrevivência. ONGs que oferecem cestas básicas, cortes de cabelo e até passagem de ônibus para famílias irem ao hospital”

Marcos Fernandes, professor da Faculdade de Tecnologia e Inovação do Senac do Distrito Federal

Como funcionam

É importante saber o que significa o terceiro setor. Adalbert Evers é um dos cientistas políticos que melhor fala do assunto, muito reconhecido na academia por estudar e ensinar sobre o tema. De acordo com ele, é um segmento entre o mercado, o Estado e a sociedade; é um espaço do setor público. Por isso, é de difícil compreensão e definição por ser, justamente, uma área de mediação.

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. (foto: Pacífico/CB/D.A Press)

O terceiro setor não apareceu agora no Brasil nem no mundo, mas tem se tornado cada vez mais representativo. No exterior, as instituições que atuam neste ramo são conhecidas como organizações não governamentais (ONGs), mas, no Brasil, também são nomeadas de organizações da sociedade civil (OSC) ou organizações da sociedade civil de interesse público (Oscip).

Segundo o Mapa das OSCs de 2020, promovido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), há 781,9 mil instituições do tipo em atividade no país.

“Há um número muito alto de locais ligados à saúde, à educação e a insumos básicos de sobrevivência. ONGs que oferecem cestas básicas, cortes de cabelo e até passagem de ônibus para famílias irem ao hospital”, explica Marcos.

Outras organizações, de grande porte, atuam na instalação de políticas públicas e na sensibilização de temas importantes. Existem entidades também que articulam com outros setores e organizações internacionais para garantia de direitos ou conquistas de novos.

Ewerton, vice-presidente do Instituto Ayrton Senna, diz que o objetivo da instituição é mudar a realidade na área de Educação do país. “Atuamos na área de gestão educacional e um dos resultados da nossa articulação é a atualização da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), para trabalhar competências socioemocionais nas escolas”, afirma.

Dessa forma, professores e instituições de ensino devem trabalhar com alunos o entendimento e o manejo das emoções, a empatia, o autocontrole, as habilidades de relacionamento e a tomada de decisão responsável.

O Instituto Ayrton Senna é reconhecido como uma das 15 melhores organizações do terceiro setor para se trabalhar, segundo o ranking Terceiro Setor do Great Place to Work (GPTW) divulgado ano passado. Os salários da equipe, por exemplo. são equiparados aos do mercado, com políticas de benefícios (home office, pilates, yoga, ginástica laboral, summer e short Friday, licença-paternidade, entre outros), contratação pela CLT, programas estruturados de desenvolvimento de carreira, cursos.

Mais do que um salário

Ewerton Fulini deixou o antigo emprego para construir um legado no terceiro setor
Ewerton Fulini deixou o antigo emprego para construir um legado no terceiro setor (foto: Instituto Ayrton Senna/Divulgação)

A recompensa salarial é um atrativo, sem dúvidas. No entanto, o relato dos empregadores do setor e várias pesquisas provam que o trabalhador brasileiro pode até ser atraído por uma boa remuneração, mas um trabalho que o recompense emocionalmente é capaz de preenchê-lo de forma mais saudável que o dinheiro.

O valor do contracheque atrai, mas não é capaz de sustentar alguém em um trabalho com uma energia baixa, ou em um emprego sem propósitos maiores.

Para Marcos Fernandes, professor do Senac do Distrito Federal, trabalhar no terceiro setor é descobrir que o emprego pode trazer mais do que apenas uma recompensa salarial. “Propósito é saber quem é e descobrir o que gosta de fazer. Quando você está no terceiro setor, é inevitável, você se apaixona, e ajudar pessoas vira o seu alvo maior”, declara.

Marcos também atuou no setor antes de integrar o time de professores do Senac e afirma que a experiência o marcou como profissional e como pessoa. De acordo com ele, era oferecida uma formação a jovens do ensino médio de uma comunidade. Por semestre, 50 adolescentes adquiriam novas habilidades e se formavam.

“Quando eu ia na formatura, após a cerimônia, uma fila de mães me abraçavam e agradeciam por termos mudado a história dos filhos e da família delas. Isso não tem preço”, conta.

Ewerton fez o caminho inverso ao de Marcos. “Eu tinha uma carreira consolidada no setor privado e acabei migrando e crescendo nessa outra área”, diz. Fulini, do Instituto Ayrton Senna trabalhava em empresas particulares desde o primeiro emprego e, ao receber o convite para assumir a consultoria de RH da instituição,aventurou-se no novo setor. “Eu vi uma oportunidade de construir um legado. Eu costumo dizer que é o melhor emprego, no qual se faz o bem e ainda se ganha por isso”.

Os especialistas também afirmam que, além da realização pessoal, o trabalho no setor promove o desenvolvimento do país. Para Marcos, as ONGs geram renda por construir bens e serviços e capacitar pessoas. "Quando uma ONG ensina uma senhora de uma comunidade a fazer minipizza”, segundo o professor do Senac-DF, “está gerando uma microempresária do futuro e isso desenvolve o país".

“Sozinho, com meus interesses, eu conquisto avanços na carreira, mas não ajudo minha comunidade avançar. Este é um desenvolvimento ilusório. Se alguém fica para trás, não temos desenvolvimento”, declara Marcos. “Junto às ONGs, eu ajudo, trabalho, compartilho, e isso reflete no desenvolvimento do país”, complementa.

“Atuamos na área de gestão educacional, e um dos resultados da nossa articulação é a atualização da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), para trabalhar competências socioemocionais nas escolas”

Ewerton Fulini, vice-presidente do Instituto Ayrton Senna

 

*Estagiária sob supervisão da subeditora Ana Luisa Araújo

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