VERIFICAÇÃO

Não é verdade que o governo federal tenha vendido a maior reserva de urânio do Brasil para a China

Os posts também sugerem que o governo chinês poderá passar a explorar urânio na região, mas a Constituição Federal garante que este papel cabe apenas à União

Publicações que afirmam que a China comprou a maior reserva de urânio do Brasil -  (crédito: Reprodução/Comprova)
Publicações que afirmam que a China comprou a maior reserva de urânio do Brasil - (crédito: Reprodução/Comprova)

Investigado por: Metrópoles e Estadão.

Falso: Publicações mentem ao afirmar que a China comprou a maior reserva de urânio do Brasil, localizada no Amazonas. Na verdade, a empresa China Nonferrous Trade (CNT), subsidiária de uma estatal chinesa, adquiriu a Mineração Taboca S.A., que produz estanho no interior do Amazonas. Os posts também sugerem que o governo chinês poderá passar a explorar urânio na região, mas a Constituição Federal garante que este papel cabe apenas à União.

Conteúdo investigadoPublicações que afirmam que a China comprou a maior reserva de urânio do Brasil. Os posts dizem que a mina é rica em minerais como estanho, nióbio, tântalo e elementos de terra raras, usados para construção de equipamentos eletrônicos, e que a negociação foi fechada por R$ 2 bilhões. Uma das peças afirma ainda que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) “está entregando todas as nossas biodiversidades, territórios, fauna, flora, minérios e a nossa soberania aos chineses”.

Onde foi publicado: X, Facebook e site.

Conclusão do Comprova: Não é verdade que a China tenha comprado a maior reserva de urânio do Brasil e nem que o governo chinês possa explorar o minério. A empresa China Nonferrous Trade (CNT), subsidiária de uma estatal chinesa, adquiriu por US$ 340 milhões (R$ 2 bilhões) uma mina na região da hidrelétrica de Balbina, em Presidente Figueiredo, a 107 quilômetros de Manaus (AM), que pertencia à mineradora Taboca.

A Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) esclareceu, por meio de nota, que a Mina de Pitinga, onde está localizada a mineradora Taboca, se dedica à extração de cassiterita, nióbio e tântalo, além de produzir estanho refinado. “Embora a área explorada contenha resíduos de urânio, esses resíduos são descartados e monitorados, de acordo com as Indústrias Nucleares do Brasil (INB)”, disse o órgão.

Por meio de nota enviada ao Estadão, membro do Comprova, a INB esclareceu que “não foi realizada nenhuma venda de mina de urânio na região de Pitinga, no Amazonas, conforme divulgado em alguns veículos de comunicação”.

O que aconteceu, na verdade, foi a venda de uma mina de estanho que existe no Amazonas, informou a estatal. Trata-se de uma das maiores minas do mundo e que tem como subproduto ferroligas de nióbio e tântalo. “Além disso, a operação gera um resíduo que contém urânio, que é monitorado pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN). Não há produção de urânio no local”, destacou o órgão.

A IBN ressalta ainda que a jazida não pode ser considerada “a maior reserva de urânio no Brasil”, como circula em portais de comunicação e nas redes sociais. No local, conforme a estatal, há somente uma estimativa de potencial de recursos ainda não comprovada.

E, mesmo que haja urânio na mina em questão, a empresa chinesa não pode manipular o minério. Isso porque, de acordo com a Lei nº 14.514, de 29 de dezembro de 2022, cabe à INB a pesquisa, a lavra e a comercialização de minérios nucleares, de seus concentrados e derivados, e de materiais nucleares, e sobre a atividade de mineração.

“Qualquer urânio que seja potencial subproduto no Brasil só pode ser produzido se for em parceria com a INB”, destacou o órgão.

A CNEN confirma que há resíduos de urânio no local, que são armazenados na própria instalação, em locais autorizados pela comissão.

“A eventual extração de urânio desses resíduos e rejeitos também está sob monopólio da União, exercido pela INB. Adicionalmente, o comércio de minérios e concentrados que possuem elementos nucleares associados ao produto principal dependem de anuência da CNEN, e as exportações só podem ser realizadas após pagamento, pelo exportador, do valor correspondente ao urânio e/ou tório contido no material exportado”, disse o comunicado à imprensa.

Procurado pelo Comprova, o MME, por meio da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do governo federal, também esclareceu que é falsa a informação de que o governo federal tenha vendido a operação da Mineração Taboca a uma empresa chinesa para exploração de urânio.

“A atividade mineral no Brasil é exercida pelo setor privado. A Minsur S.A., detentora de 100% das ações da Mineração Taboca S.A. e responsável pela notificação de venda, é uma empresa privada, de origem peruana, sem qualquer participação do governo brasileiro”, informou o ministério em nota.

Sobre a exploração de minérios, o MME esclarece que, na verdade, o que existe é uma concessão de lavra à Mineração Taboca S.A, que credencia a empresa a explorar estanho, nióbio e tântalo.

De acordo com a pasta, o subsolo é bem da União. Portanto, a empresa chinesa tem o direito de explorar apenas os recursos minerais citados no título mineral. Isto é, o documento outorgado pela Agência Nacional de Mineração (ANM) e pelo próprio MME que credenciam seu possuidor ao aproveitamento do recurso mineral.

“A exploração de qualquer outra substância não prevista no referido documento, entre elas o urânio, é expressamente proibida por lei, passível de sanções, como a caducidade do título ou até mesmo a desapropriação da mina”, destacou o ministério.

Conforme a Constituição Federal, é de competência exclusiva da União o monopólio sobre a pesquisa, lavra, enriquecimento, reprocessamento, industrialização e comércio de minérios nucleares. “Qualquer descoberta desses minerais deve ser comunicada ao MME e à Agência Nacional de Mineração (ANM)”, acrescentou o Ministério de Minas e Energia em nota enviada ao Comprova.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 3 de dezembro, todas as publicações no X investigadas aqui somavam mais de 766 mil visualizações. Uma publicação no Facebook alcançou 12 mil reações e 9,7 mil compartilhamentos até a mesma data. Não foi possível, no entanto, mensurar o alcance da publicação feita no site.

Fontes que consultamos: Indústrias Nucleares Brasileiras, Comissão Nacional de Energia Nuclear, Ministério de Minas e Energia e Constituição Federal.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Aos Fatos e o UOL Confere investigaram o mesmo assunto e também concluíram que o governo federal não vendeu a maior reserva de urânio do Brasil para a China. O país asiático e o governo brasileiro, aliás, são alvos frequentes de desinformação. O Comprova já mostrou, por exemplo, que Lula não disse querer implantar o comunismo chinês no Brasil.

postado em 04/12/2024 18:24
x