Investigado por: Estadão, O Popular e Grupo Sinos
Enganoso: É enganoso um vídeo postado no Instagram em que um homem reage à fala de uma mulher que diz que o marido falecido teria votado nas eleições presidenciais de 2022. No vídeo original, a mulher mostra pesquisa do site “Veja seu Voto”, com o CPF do marido, como prova de que teria havido fraude nas eleições. O site em questão não é oficial e não utiliza nenhum tipo de informação da Justiça Eleitoral. Além disso, não há qualquer possibilidade de consultar o voto dado por um eleitor, nem em sites oficiais.
Conteúdo investigado: Postagem no Instagram mostra um homem reagindo a um vídeo antigo em que uma mulher fala sobre o suposto voto de seu marido, falecido em 2010, na eleição presidencial de 2022.
Onde foi publicado: Instagram.
Conclusão do Comprova: É enganoso o post em que homem usa vídeo do ano passado de mulher dizendo que seu marido, falecido em 2010, teria tido voto registrado no então candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Na postagem que está viralizando agora, o autor escreve: “Pessoas falecidas levantam para votar no 13! Alguém poderia explicar como aconteceu este milagre?”.
O vídeo no Instagram retoma a gravação de uma mulher que se diz viúva de Carlos Roberto Collistock, falecido em 2010, e que, pelo site “Veja Seu Voto”, aparece como tendo votado, no segundo turno das eleições de 2022, no “13”, em alusão ao então candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
No final do ano passado, o vídeo viralizou e foi desmentido pelo Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) e por agências de checagem. O TRE-SP informou que o título de eleitor de Carlos Roberto Collistock está inativo e não é possível que qualquer pessoa tenha votado com seu documento de identificação, como o CPF. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) confirmou também que não é possível, em site algum, consultar o voto dos eleitores.
Além disso, houve avisos sobre a possibilidade de golpes com o uso dos sites que prometiam a consulta de voto, já que os eleitores disponibilizavam o número do CPF para os proprietários da página, possibilitando o uso indevido dos dados pessoais cedidos. Ao usar esse vídeo antigo, já desmentido, o criador do post que viraliza agora engana os internautas ao sugerir que o processo eleitoral de 2022 tenha sido fraudado.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. O vídeo, publicado no perfil @pr.josenilsonalmeida em 3 de abril, teve 670 mil visualizações até o dia 20 deste mês.
Como verificamos: Inicialmente, foi feito contato com o TSE na tentativa de esclarecer se Carlos Roberto Collistock está com o título de eleitor ativo e se é possível verificar o voto efetivado a partir dos dados do CPF do eleitor.
O Comprova então realizou busca no Google pelo termo “eleitor falecido tem voto computado”. Com isso, a reportagem identificou que o caso já havia sido esclarecido pelo TRE-SP, em dezembro do ano passado. Por meio de uma nota publicada em seu site, o Tribunal informou que é falsa a alegação de que um homem falecido em 2010 teve voto computado nas eleições de 2022. Além do esclarecimento publicado pelo TRE, encontramos checagens de outras agências como UOL Confere e Aos Fatos.
Sabendo que a alegação feita pela mulher que aparece no vídeo não era verdadeira e já havia sido desmentida pela Justiça Eleitoral, o Comprova entrou em contato com o dono do perfil que compartilhou o conteúdo falso para certificar se ele sabia que as alegações se tratam de desinformação.
Na tentativa de identificar a mulher que aparece no vídeo, foram utilizadas ferramentas de busca reversa, como o Google Lens e o TinEye. Ela se apresenta como esposa de Carlos Roberto Collistock, falecido em 2010, e foram feitas buscas no Google e nas redes sociais (Instagram, Facebook e Twitter) sobre a identidade da viúva e de outros parentes. A pesquisa não resultou em confirmação sobre a identidade da mulher que aparece no vídeo e nem de sua ligação com o falecido.
O Comprova também pesquisou sobre o site “Veja Seu Voto”, que foi bastante difundido após o segundo turno das eleições de 2022 e prometia a confirmação do voto no pleito a partir do CPF do cidadão. O site está fora do ar.
Título eleitoral de pessoas falecidas são cancelados
Em nota, o TRE-SP informou que o título de eleitor de Carlos Roberto Collistock foi cancelado pela Justiça Eleitoral no mesmo ano de seu óbito, em 2010. De acordo com o TRE-SP, mensalmente, os cartórios de registro civil informam aos cartórios eleitorais o número de óbitos ocorridos no mês anterior, possibilitando assim o cancelamento do título eleitoral de uma pessoa falecida.
O tribunal também reiterou que o voto digitado na urna eletrônica é sigiloso e inviolável conforme prevê a Constituição Federal. Além disso, o esclarecimento sobre o caso destaca que o site “Veja Seu Voto” não é oficial e não utiliza nenhum tipo de informação da Justiça Eleitoral. “Seu sistema de busca retorna informações com qualquer número que se insira, mesmo não sendo de CPF válido. Portanto, os supostos votos que o site divulga são falsos, inventados e inexistentes”, alertou o TRE-SP.
Sites de consulta
Após as eleições presidenciais de 2022 e o acirramento da disputa entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), foram difundidos sites que prometiam realizar a consulta ao voto de cada eleitor por meio do CPF. A ideia, em um contexto no qual as urnas eletrônicas eram contestadas, era que o eleitor pudesse tirar a prova de que o voto dado era idêntico ao que foi contabilizado pela Justiça Eleitoral.
O site mais conhecido foi o “Veja Seu Voto” e o resultado da pesquisa foi utilizado como suposta prova de fraude nas eleições de 2022. Ou seja, se um eleitor bolsonarista, grupo que mais contesta a segurança das urnas eletrônicas, fizesse a pesquisa e saísse como voto o número 13, essa seria uma suposta garantia de que a eleição foi fraudada.
O endereço do site está fora do ar desde meados de dezembro. Ele não apresentava registro de segurança e nem mesmo aparecia em pesquisas em sites de busca. O registro pode ser verificado pelo endereço da página, em que se inicia com “http://”, enquanto os sites com essa funcionalidade apresentam o “https://”. Também não havia informações sobre os criadores da página.
Ao Fato ou Fake, do G1, o professor de Engenharia de Computação da Universidade de São Paulo (USP) Marcos Simplício, em dezembro passado, afirmou que “a única coisa verdadeira no site é que ele está ajudando a vazar dados pessoais de brasileiros, permitindo que qualquer pessoa consulte um CPF arbitrário e descubra o nome da pessoa, por exemplo”. Ele confirma ainda que a parte do voto era inventada, além de relatar ser impossível vincular o voto ao eleitor, já que a urna eletrônica não faz esse vínculo, apenas soma os votos proferidos para cada candidato.
Há, no momento, um site de mesmo nome, mas que é de cunho humorístico e informa que o resultado é aleatório, permitindo testar até obter o resultado desejado. O site possui o registro de segurança, mas não há informação sobre os responsáveis pela plataforma.
Por que não é possível saber em quem uma pessoa votou?
Em entrevista ao Comprova, Simplício explicou que a informação sobre o candidato em quem um eleitor específico votou não existe dentro dos dados gerados pelas urnas. “A urna em si sabe quem é que está votando e o voto que foi lançado, quando o eleitor digita o número do candidato, ela grava, mas não armazena essas informações juntas”.
De acordo com Simplício, que também é vice-coordenador do convênio entre a USP e o TSE para análise da segurança das urnas eletrônicas, nenhum dos três documentos gerados pela urna: os Boletins de Urna, o Registro Digital do Voto (RDV) e o Log, contém informações que permitiriam revelar o voto individual dos eleitores.
“O Boletim de Urna mostra a apuração de votos totais de cada urna, não existem informações sobre em quem determinado eleitor votou. O RDV armazena cada um dos votos individuais, mas ele não está associado ao eleitor, nem sequer a ordem que os votos foram lançados, pois eles são gravados de maneira aleatória. Já o log não tem o nome das pessoas que votaram, só o instante em que começou o voto. Ele compreende o momento de início e término do voto, mas não informa em quem o eleitor votou, dá para saber o instante de tempo que foi confirmado para governador e presidente, por exemplo, mas não é possível saber qual foi o candidato escolhido”, explicou Simplício.
O professor lembra que, em alguns casos de erros, as urnas identificaram o usuário que estava se autenticando, no entanto, essa informação não indica em qual candidato o eleitor votou. Situações semelhantes a esses erros foram mencionadas em uma checagem realizada pelo Comprova em novembro de 2022. Na ocasião, a reportagem desmentiu que votos de eleitores foram relevados a partir da decodificação do sistema das urnas.
O que diz o responsável pela publicação: O Comprova contatou o perfil @pr.josenilsonalmeida por mensagem no Instagram, mas não obteve retorno até a publicação desta verificação.
O que podemos aprender com esta verificação: O conteúdo aqui verificado apresenta uma denúncia séria que, se fosse verdadeira, teria sido noticiada por veículos de imprensa de todo o país. Ao se deparar com alegações do tipo, o primeiro passo deve ser buscar por reportagens em sites de veículos profissionais sobre o assunto. Em uma busca rápida utilizando palavras que resumem o suposto fato, como fez a reportagem, seria possível identificar que o vídeo em questão se trata de desinformação.
É comum que desinformadores retomem vídeos ou informações difundidas anteriormente como verdadeiras, especialmente as que foram mais espetaculosas ou polêmicas, de modo a confundir os receptores da mensagem. Contra isso, é possível fazer pesquisas sobre a própria publicação, pois ela pode já ter sido desmentida por veículos profissionais e até mesmo órgãos oficiais.
Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Outras checagens sobre o tema: O vídeo original postado pela suposta viúva de Carlos Roberto Collistock, assim como os sites de consulta de voto, já havia sido checado pelo Fato ou Fake, Estadão Verifica, Aos Fatos e UOL Confere, além de posicionamentos oficiais do TSE, TRE-SP e TRE-PR.
Verificado por: UOL, Plural Curitiba, Folha de S. Paulo, NSC Comunicação, SBT e SBT News