Verificação

Vídeo faz apologia ao crime ao incentivar os eleitores a escreverem o próprio voto no caderno de assinaturas da seção eleitoral

Um vídeo no TikTok traz conteúdo falso ao argumentar que as assinaturas dos eleitores, se acompanhadas do número do candidato escolhido, poderiam gerar uma auditoria da votação

Investigado por: UOL e Crusoé 

Falso: É falso o conteúdo de um vídeo segundo o qual o eleitor pode colocar o número do candidato em que votará ao lado de seu nome no caderno de assinaturas das seções eleitorais para poder auditar a votação. A prática em questão é crime eleitoral e o vídeo investigado, ao estimulá-la, está cometendo apologia a crime eleitoral. Segundo o Código Eleitoral, é proibido “omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais”. O caderno de assinaturas serve para conferir a identidade do eleitor, e não o voto dele, que, por Lei, é secreto. O ato incentivado também pode ser enquadrado como “boca de urna”, cuja pena chega a até um ano de detenção.

Conteúdo investigado: Publicação no TikTok em que uma mulher reage com aprovação a um vídeo no qual um homem simula um cenário em que os eleitores podem facilitar, sozinhos, um suposto processo de auditoria das urnas eletrônicas no dia da votação. O homem afirma que os eleitores podem escrever um indício do próprio voto no caderno de assinaturas da seção eleitoral, o qual todo votante precisa assinar logo antes de ir à cabine de votação. No caso, ele usa como exemplo o número de urna do presidente Jair Bolsonaro (PL), que concorre à reeleição.

Onde foi publicado: TikTok.

Conclusão do Comprova: Um vídeo no TikTok traz conteúdo falso ao argumentar que as assinaturas dos eleitores, se acompanhadas do número do candidato escolhido, poderiam gerar uma auditoria da votação. A prática descrita e simulada na publicação investigada é crime eleitoral.

Segundo o artigo 350 do Código Eleitoral vigente, a Lei 4737, de 1965, é proibido “omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais”. O caderno de assinaturas serve para conferir a identidade do eleitor, e não o voto dele, que, segundo o artigo 46 do mesmo Código, é secreto.

Segundo informou ao Comprova a assessoria de imprensa do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a prática estimulada pelo conteúdo verificado também pode ser configurada como “boca de urna”, propaganda eleitoral no dia da votação direcionada a eleitores prestes a votarem. Isso é um outro crime, previsto no inciso II do 5º parágrafo do artigo 39 da Lei nº 9.504, de 1997, conhecida como Lei das Eleições. A pena pode chegar a até um ano de detenção.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O vídeo no TikTok teve 764.200 visualizações, 37.900 curtidas e mais de 8.800 compartilhamentos até 2 de setembro.

O que diz o autor da publicação: O Comprova tentou entrar em contato com a autora da publicação pelo TikTok, mas não obteve resposta até a publicação desta verificação.

Como verificamos: Buscamos no Google pela expressão-chave “Assinatura permite auditoria de voto”, sem as aspas, para podermos obter, como resultado, páginas relacionadas mas sem, necessariamente, conter essa frase exata. A pesquisa no Google identificou uma reportagem publicada em 2022 pela agência de checagem Aos Fatos, que desmente o mesmo conteúdo verificado, e uma segunda matéria, no próprio site do TSE, de 2018, sobre outra postagem que continha a mesma alegação.

Além disso, encontramos nos arquivos do Comprova um artigo de 2018 desmentindo outro vídeo que, no contexto das eleições gerais daquele ano, fazia a mesma apologia ao crime. Também enviamos e-mail à assessoria de imprensa do TSE, principal autoridade eleitoral do Brasil, apresentando-lhe o caso. Por sua vez, a assessoria de imprensa do tribunal apenas nos recomendou a acessar o Código Eleitoral vigente e nos indicou que a prática estimulada pelo conteúdo verificado pode ser configurada como o crime de “boca de urna”.

Apologia ao crime

O ato de escrever qualquer indício do próprio voto no caderno de assinaturas da seção eleitoral, como estimulado pelo conteúdo verificado, é um crime, previsto no Código Eleitoral vigente, Lei 4737, de 1965. Segundo o artigo 350, que fica dentro da seção “DOS CRIMES ELEITORAIS”, é proibido “omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais”. O caderno de assinaturas serve para conferir a identidade do eleitor, e não o voto dele. O eleitor só está autorizado a assiná-lo, segundo o manual do mesário para as eleições deste ano. E, caso tenha biometria registrada em seu título de eleitor, o votante é dispensado do ato.

Segundo a resposta da assessoria de imprensa do TSE ao Comprova, assim como reportagem de 2018 do próprio tribunal, a prática pode constituir “boca de urna”, propaganda eleitoral no dia da votação direcionada a eleitores prestes a votar. Isso é um outro crime, previsto no inciso II do 5º parágrafo do artigo 39 da Lei nº 9.504, de 1997, conhecida como Lei das Eleições. A pena pode chegar a até um ano de detenção.

Voto secreto

O sigilo do voto é garantido e assegurado pela Constituição Federal, sendo cláusula pétrea, ou seja, não pode ser alterado nem por Emenda Constitucional. Diversos dispositivos da Justiça Eleitoral também foram elaborados para garantir a inviolabilidade e o sigilo do voto, como a resolução de 2022 que determina que o eleitor deve deixar o celular com o mesário durante a votação. A Lei das Eleições já proibia o porte de celulares, máquinas fotográficas e filmadoras dentro da cabine. No final deste agosto, o TSE determinou que até mesmo o porte de armas é proibido nas seções eleitorais. De acordo com o Código Eleitoral, violar ou tentar violar o sigilo do voto é crime, com pena prevista de detenção de até dois anos.

Métodos de auditoria

As autoridades eleitorais já contam com métodos oficiais e comprovadamente eficientes para auditar as urnas, incluindo etapas que ocorrem antes mesmo das eleições, como a abertura do código fonte das urnas e os testes públicos de segurança.

No dia da eleição, as urnas eletrônicas emitem a zerésima, um documento com o nome e partido de todos os candidatos que concorrem naquele estado e que atesta que não há nenhum voto contabilizado naquela urna. A zerésima é emitida pelos mesários em cada seção eleitoral antes do primeiro eleitor votar. O presidente da mesa, os mesários e os fiscais presentes devem assinar o documento.

Há também, no dia da votação, o teste de integridade, no qual urnas sorteadas são fiscalizadas nas sedes dos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs). Esse processo é realizado desde 2002, e nunca houve divergência entre os resultados da urna eletrônica e da contagem dos votos em papel.

Ao fim da votação, cada urna eletrônica emite também o boletim de urna, que mostra quantos votos cada candidato teve em cada seção eleitoral. Desde 2016, os boletins de urna são gerados com um QR Code, que permite que o eleitor confira os votos por meio do aplicativo da Justiça Eleitoral, “Boletim na mão”.

Os boletins impressos são emitidos em, pelo menos, cinco vias. Uma delas é afixada na porta de cada seção eleitoral e duas são levadas para o cartório eleitoral. O documento registra o total de votos por partido, total de votos por candidato, total de votos nulos e brancos, total de comparecimento em voto, identificação da seção e da zona eleitoral, hora do encerramento da eleição, código interno da urna eletrônica e uma sequência de caracteres para a validação do boletim.

Caderno de votação

O caderno de votação é uma das formas de conferir a identidade do eleitor, que deve assiná-lo antes de votar. Quem tem a biometria cadastrada não precisa registrar a assinatura no caderno de votação, exceto em caso de erro ou qualquer outra dificuldade no reconhecimento biométrico.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizaram nas redes sociais sobre a pandemia de covid-19, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. O conteúdo aqui verificado confunde as pessoas sobre as eleições presidenciais e o processo eleitoral, como um todo. Além disso, há o agravante do fato de estimular os eleitores a cometer um crime.

Outras checagens sobre o tema: A agência de checagem Aos Fatos também desmentiu o mesmo conteúdo. Em 2018, no contexto das eleições gerais daquele ano, checagens do Comprova e do TSE desmentiram uma outra postagem que promovia a mesma alegação daquela aqui verificada.

Recentemente, em relação à auditoria das eleições e às urnas eletrônicas, o Comprova também explicou como funciona a fiscalização do código-fonte das urnas eletrônicas, mostrou que não há dispositivo nas urnas eletrônicas capaz de alterar votação e desmentiu uma peça de desinformação segundo a qual 32 mil urnas teriam sido grampeadas com o objetivo de fraudar a eleição.

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