Verificação

Fim de patrocínio da Petrobras não tem relação com PT, diferentemente do que sugere vídeo

Vídeo que trata sobre o patrocínio da Petrobras a pilotos de F1 é enganoso

Investigado por: GZH, CNN Brasil e A Gazeta 

Enganoso: É enganoso o vídeo em que um apoiador do presidente Jair Bolsonaro (PL) relaciona o patrocínio da Petrobras a pilotos da Fórmula 1 (F1) à gestão do PT e ainda insinua que o aporte financeiro seria ato de corrupção do partido. O autor da postagem também menciona o gasto com a guarda de aviões da Fundação Nacional do Índio (Funai), mas o valor foi superdimensionado. Sobre o encontro da presidente do PT, Gleisi Hoffmann, com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin, houve uma solicitação do partido para conter a disseminação de conteúdo de desinformação, não para censurar as redes sociais, como dito no conteúdo verificado.

Conteúdo investigado: Vídeo em que autor começa fazendo conjecturas sobre corrupção da esquerda, alegando que a “petezada” segue praticando esses atos pelo país e que faz “gritedo” (gritaria) quando identificados os supostos malfeitos. Ele relata que Jair Bolsonaro (PL) teria descoberto que a Petrobras estava pagando R$ 750 milhões para patrocinar dois pilotos de F1 e também R$ 1 milhão, por mês, para guardar um avião da Funai. Diz ainda que a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, encontrou-se com o ministro do STF Edson Fachin para censurar as redes sociais.

Onde foi publicado: Kwai.

Conclusão do Comprova: Vídeo que trata sobre o patrocínio da Petrobras a pilotos de F1 é enganoso. Embora a petrolífera tenha patrocinado a equipe McLaren, o contrato suspenso pelo presidente Bolsonaro havia sido firmado durante o governo de Michel Temer (MDB), em 2018, e não na gestão do PT. Além disso, ao contrário do que insinua o autor da postagem, não há indícios de irregularidades na negociação, que tratava da exposição da marca da Petrobras e do desenvolvimento de tecnologia da empresa em parceria com a equipe de F1.

Apoiador de Bolsonaro, o autor do vídeo alega que o presidente descobriu o aporte financeiro da Petrobras e que a “petezada fez um gritedo”, isto é, os integrantes do PT teriam se indignado com a revelação da suposta corrupção. O valor do contrato não foi informado oficialmente, mas, na época do rompimento, veículos noticiaram que seria de cerca de R$ 870 milhões. Este valor corresponderia a um contrato de cinco anos, entre 2018 e 2022. A Petrobras não revela valores devido à cláusula de confidencialidade do contrato.

Os valores não eram apenas para “estampar bandeirinhas do Brasil” nos capacetes dos dois pilotos da McLaren, como cita o autor do vídeo aqui verificado. Além do destaque nos capacetes, macacões e nos carros da equipe, o valor envolvia desenvolvimento de tecnologias e pesquisas. A própria McLaren publicou um comunicado quando o contrato foi rompido dizendo que a parceria rendeu “avanços tecnológicos em combustíveis e lubrificantes e identificou oportunidades para futuras colaborações nas áreas comercial, tecnológica e de responsabilidade social entre as duas empresas”.

O PT é o partido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, também na disputa à presidência, e principal opositor de Bolsonaro, figurando, no momento, como líder nas pesquisas eleitorais.

Na mesma postagem, o autor menciona que Bolsonaro também descobriu gasto mensal de R$ 1 milhão para guardar um avião da Funai. No ano passado, o órgão fez leilão das seis aeronaves que ainda possuía, e com as quais tinha despesas para parqueamento, hangaragem [que inclui serviços como estacionamento, armazenamento, limpeza, abastecimento de energia da aeronave quando necessário, e orientação de pouso e decolagem] e tarifas dos locais em que estavam guardadas.

Em julho de 2019, quando identificada a condição dos aviões, o custo anual do aluguel era de R$ 700 mil por todas as aeronaves, não uma apenas. Em nota, a Funai informou que “as seis aeronaves foram arrematadas pelo total de R$629.500, valor que foi recolhido ao Tesouro Nacional”, mas não revelou os gastos para mantê-las no período em que estiveram paradas.

O vídeo ainda traz outra alegação: o autor afirma que a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, se reuniu com o ministro do STF Edson Fachin para censurar as redes sociais, uma alegação que carece de contexto. A equipe jurídica do partido teve encontro em maio deste ano com o magistrado, que à época ocupava a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), para discutir meios de barrar o avanço da desinformação e das chamadas fakes news, particularmente nas eleições. Então, a proposta seria impedir a circulação do que é enganoso e falso, não de todos os conteúdos da internet como é insinuado no conteúdo investigado.

Para o Comprova, enganoso é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: Até as 13h30 de 1º de setembro havia mais de 113 mil visualizações e de 11 mil curtidas. A postagem recebeu também 1.369 comentários e foi compartilhada 2.499 vezes.

O que diz a autora da publicação: O autor da publicação foi procurado pelo Kwai, mas não retornou até o fechamento da verificação.

Como verificamos: O primeiro passo foi pesquisar pelas palavras-chaves que constavam no vídeo investigado. No Google, a equipe procurou “Petrobras” + “Fórmula Um” e a consulta retornou reportagens sobre o assunto no Motorsport, Placar, Estadão, G1 e Uol, nas quais, entre outras informações, era citada a rescisão do contrato da petrolífera com a McLaren.

Com o nome da escuderia patrocinada, nova pesquisa foi feita e a equipe identificou que conteúdos de desinformação sobre esse contrato da Petrobras já haviam sido desmentidos anteriormente. Em 2019, a agência Lupa apontou que era falso que o contrato foi rompido com a McLaren para direcionar os recursos à educação. No mesmo ano, o Uol revelou que não era verdade o conteúdo de um tuíte de Bolsonaro, em que o presidente afirmava que o valor pago pela Petrobras era todo em publicidade com a escuderia. No final do ano passado, o Estadão Verifica tratou como boato a alegação feita dois anos antes sobre o destino da verba do patrocínio suspenso.

O Comprova também pesquisou no Google sobre os gastos com aeronaves da Fundação Nacional do Índio, usando os termos “Funai” + “aviões” + “abandono”. Matérias jornalísticas abordam o problema (Poder 360, Exame, Estadão, Agência Brasil), mas não há informações sobre gasto de R$ 1 milhão por mês para guardar apenas um avião, como alegado pelo autor do vídeo. Esse valor era a estimativa de faturamento com o leilão dos aviões.

Também em pesquisa a reportagem buscou conteúdos que relacionassem Gleisi Hoffmann, Edson Fachin e redes sociais. A consulta retornou matérias (CNN, Veja) sobre a iniciativa do PT em conter a circulação de desinformação.

A equipe ainda enviou e-mails à Petrobras e à Funai e encontrou, no site da McLaren, um comunicado da sobre o assunto. Também foi procurado o autor da postagem, que não respondeu até a publicação da verificação.

O contrato e a rescisão

Ao contrário do que foi insinuado no vídeo, o contrato firmado entre a Petrobras e equipes de F1, e depois rompido por Bolsonaro, não se deu na gestão do PT. Segundo a assessoria da petrolífera, a parceria com a McLaren começou em fevereiro de 2018. Naquele ano, Michel Temer (MDB) estava na presidência da República. Quando houve o rompimento, reportagens (Estadão, G1) que abordaram o assunto apontaram que o valor, contratado em libras esterlinas, chegava, à época, em R$ 872 milhões, conforme um documento que tratava sobre os primeiros nove meses da gestão de Bolsonaro.

O fim do contrato, ainda de acordo com a comunicação da empresa, ocorreu em novembro de 2019, mas a Petrobras não revela valores devido à cláusula de confidencialidade. Na época em que a parceria foi desfeita, a McLaren divulgou um comunicado informando sobre o término do contrato com a Petrobras. Também sem detalhar valores, no documento a equipe de automobilismo afirma que “a Petrobras e a McLaren Racing concluíram seu acordo técnico e de patrocínio por mútuo consentimento.”

Pelo comunicado, é possível observar que o valor, embora não tenha sido divulgado, não era somente destinado à publicidade da Petrobras. “A parceria produziu claros avanços tecnológicos em combustíveis e lubrificantes e identificou oportunidades para futuras colaborações nas áreas comercial, tecnológica e de responsabilidade social entre as duas empresas”.

O comunicado da McLaren cita ainda Roberto Castello Branco, então presidente da Petrobras: “O projeto permitiu à Petrobras desenvolver gasolina e lubrificantes de alta tecnologia por meio de pesquisas com novas matérias-primas e testes realizados em condições extremas. O desenvolvimento tecnológico será aplicado em produtos lubrificantes e combustíveis”.

Os patrocínios de petrolíferas são bastante comuns na categoria. A Petronas, estatal petrolífera da Malásia, patrocina a escuderia Mercedes AMG há alguns anos, assim como a Shell, empresa de combustíveis britânica, patrocinadora da Ferrari. Além do mero patrocínio estampando as marcas nos carros, macacões e capacetes, os contratos costumam envolver pesquisas de desenvolvimento, que geram retorno para ambas as partes. A própria Petrobras tem hoje em suas bombas uma gasolina chamada de Petrobras Podium. O combustível foi desenvolvido durante uma passagem anterior da estatal brasileira pela categoria automobilística, em 2002, quando patrocinava outra equipe, a Williams.

Aeronaves da Funai foram a leilão

Em julho de 2019, conforme reportagem do Poder360, Bolsonaro publicou em sua conta no Instagram vídeo da ex-ministra Damares Alves em que mostrava a situação de abandono de um hangar no Aeroporto Internacional de Brasília. As aeronaves indicavam sinais de sucateamento.

Ainda segundo a reportagem, com informação atribuída à ex-ministra, o valor de aluguel pago para manter os aviões estacionados era de R$ 700 mil por ano. E com aluguéis atrasados, o custo chegava a R$ 3 milhões, apontou o Estadão na época. Pelas declarações de Damares, avalizadas por Bolsonaro, não havia um gasto mensal de R$ 1 milhão com apenas uma aeronave, como sugerido no vídeo aqui investigado.

O Comprova procurou a equipe de comunicação da Funai, que explicou que, em 2021, quase dois anos após o vídeo de Damares, a instituição ainda tinha seis das aeronaves em questão. Em “meados de 2021”, afirmou a Funai em nota, foi realizado o leilão das “seis aeronaves que faziam parte do patrimônio do órgão e estavam inoperantes há mais de uma década”. Segundo a fundação, eles foram fabricados entre 1971 e 1984 e eram considerados irrecuperáveis. O órgão não detalhou valores, se limitando a afirmar que “os aviões acarretavam despesas relativas à sua guarda e estadia”. A Funai acrescentou que os leilões ocorreram nos meses de maio e junho de 2021, nos estados do Rio de Janeiro, Goiás, Pará e no Distrito Federal.

Ainda de acordo com a nota, “a ação representou economia aos cofres públicos de gastos com serviços de parqueamento, hangaragem e tarifas de permanência nas localidades em que se encontravam. A realização dos leilões buscou acelerar a venda dos ativos, potencializando o proveito econômico decorrente deles e minimizando riscos de má conservação. As seis aeronaves foram arrematadas pelo total de R$ 629.500, valor que foi recolhido ao Tesouro Nacional”.

Reunião contra a desinformação

O autor do vídeo também faz referência a Gleisi Hoffmann, alegando que a presidente do PT teria se encontrado com o ministro Edson Fachin para censurar as redes sociais.

De fato, as redes sociais estiveram na pauta de uma reunião, em 20 de maio de 2022, do partido com o magistrado, quando ele ainda estava na presidência do TSE, mas o enfoque não era censura, cujo significado é “proibir a circulação pública de informação”, em uma definição mais resumida. A proposta do encontro era buscar meios de conter a disseminação de conteúdos falsos e enganosos, portanto, desinformação.

Em fevereiro, o TSE já havia formalizado parceria com oito plataformas – Facebook, Instagram, Twitter, TikTok, YouTube, Kwai, WhatsApp e Google – para combater a desinformação sobre o processo eleitoral deste ano. No mês seguinte, o Telegram também aderiu ao programa e formalizou a parceria em maio. Mesmo com o engajamento das plataformas, o TSE, por outro lado, criou um sistema de alerta para casos de desinformação relacionados às eleições.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizaram nas redes sociais sobre a pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. A postagem cita o PT, partido de um dos candidatos à presidência, atribuindo gastos financeiros que não foram assumidos na gestão do partido e insinuando que o patrocínio esportivo seria ato de corrupção. Conteúdos de desinformação como este afetam o processo democrático porque distorce a compreensão da realidade. A população tem direito de saber a verdade e basear suas escolhas em informações confiáveis.

Outras checagens sobre o tema: Faltando apenas 31 dias para o primeiro turno das eleições, em 2 de outubro, aumenta a incidência de desinformação sobre o assunto. O Comprova já demonstrou que são falsas postagens afirmando que empresa de pesquisa eleitoral funcione dentro do Instituto Lula, que Simone Tebet deixou médica ser humilhada na CPI da Covid e que apresentadores estrangeiros fizeram piada sobre Lula e eleitores baianos.

Recentemente, também classificou como enganosa postagem sugerindo apoio de João Amoêdo a Lula e falso vídeo em que Bolsonaro lidera pesquisa de intenção de voto. 

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