Há 30 anos, em 1º de janeiro de 1995, subia a rampa do Palácio do Planalto o então recém-eleito presidente Fernando Henrique Cardoso. No dia seguinte, o Correio Braziliense anunciava, na terceira página do jornal impresso: “Desde as 16h41 de ontem o Brasil tem novo presidente”.
Lembrado pela criação do Plano Real, por privatizações e outras políticas de estabilização da economia, o governo FHC foi o 34º do Brasil e o quarto após a redemocratização. No dia 2 de janeiro de 1995, o Correio, que cobriu as solenidades de posse no dia anterior, estampou, na capa, uma foto da transição pacífica entre Itamar Franco — que assumiu a presidência da República após o impeachment de Fernando Collor, em 1992 — e Fernando Henrique. Foi manchete a promessa de “mutirão para acabar com a fome e a miséria” no país.
Cristovam Buarque, que tinha acabado de assumir, também, o governo do Distrito Federal, aparece logo embaixo. Primeiro petista a “ocupar o Palácio do Buriti”, em Brasília, ele afirmou ao Correio que apoiaria o novo presidente e “prometeu uma administração em parceria com o povo”.
De acordo com a cobertura feita pelo jornal, a posse de FHC “foi marcada pelo forte compromisso de resgate da dívida social”. O novo presidente prometia “‘varrer do mapa do Brasil a fome e a miséria’ e fazer uma autêntica ‘revolução social’”.
“Sem arrogância, mas com absoluta convicção, eu digo: esse país vai dar certo”, havia dito Fernando Henrique Cardoso. No mesmo dia, o primeiro de 1995, ele iniciou reforma administrativa do governo e extinguiu os ministérios do Bem-Estar Social e da Integração Regional, bem como a Legião Brasileira de Assistência (LBA) e a Fundação Centro-Brasileira para a Infância e Adolescência.
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As páginas de Política espelhavam a capa e davam apenas matérias acerca do tema ou relacionadas ao novo presidente. A principal, “FHC convoca o povo para mudar o país”, abordava, em geral, o “discurso de 30 minutos” feito por FHC durante a cerimônia de posse, “interrompido três vezes por aplausos”, mas “considerado monótono por alguns”. Também fala sobre novos ministros, em especial Pelé, dos Esportes, o “mais assediado” entre eles; e o clima da cerimônia antes da chegada do novo presidente.
Nas matérias seguintes, entrevistas com o então ministro das Comunicações, Sérgio Motta, com deputados, prefeitos e senadores — inclusive o ex-presidente José Sarney — que estavam presentes no evento. De acordo com o Correio, “a posse de Fernando Henrique Cardoso, entre todos os eventos políticos importantes no Congresso desde o processo de redemocratização, foi o mais formal e com uma presença menor de pessoas”. Além disso, narrou-se que “o clima esvaziado e formal foi quebrado por um susto”: “Pouco antes da chegada de Fernando Henrique, um dos quatro vidros que formam a porta que dá acesso ao plenário da Câmara quebrou”.
Para fechar a primeira página de Política, o jornalista André Gustavo Stumpf opinou sobre a posse, em artigo. “A expectativa é a mãe da frustração”, escreveu. “O discurso de posse do presidente, acadêmico e professor Fernando Henrique Cardoso gerou expectativa. Não criou frustração, mas, certamente, esteve alguns tons abaixo do solfejo possível para um intelectual de seu porte (...). Talvez seja o estilo do novíssimo presidente, algo professoral, distante, politicamente correto, mas despido daquele emocionalismo que costuma caracterizar a fala dos políticos.”
A página seguinte é dedicada à transcrição dos principais trechos do discurso de posse e a algumas falas de repercussão de políticos e outras personalidades, como o presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
“Se for preciso acabar com privilégios de poucos para fazer justiça à imensa maioria dos brasileiros, que ninguém duvide: eu estarei do lado da maioria”, disse FHC. Ele também afirmou que seria preciso “mexer em muitos vespeiros para completar a faxina e fazer as reformas estruturais necessárias para dar eficiência ao serviço público”.
As demais páginas trazem curiosidades e outros personagens. “Coluna é ponto fraco do novo presidente”, diz o título de uma matéria. “Ontem (1º de janeiro de 1995), ela não resistiu às tensões da posse e doeu. Doeu tanto que nem as agulhas da acupunturista Edna Nischia resolveram o problema, provocado por uma antiga hérnia de disco que por oito vezes já levou o presidente à mesa de cirurgia.” De acordo com o que conta a matéria, Fernando Henrique “passou as duas horas e meia das solenidades de posse (...) andando com as costas tensionadas e com a coluna rígida” e “chegou até a mancar um pouco da perna direita”.
Outra nota afirma que Dona Ruth, esposa do presidente, quebrou protocolos ao trocar “formais apertos de mãos por beijos e abraços” durante as solenidades. Da sucursal, em São Paulo, a repórter Anaísa Silva noticiou que Lula, à época derrotado em primeiro turno por FHC, evitava dar entrevistas e fazer declarações porque era, após a eleição, “um cidadão comum”.
São, pois, cidadãos comuns os protagonistas da próxima matéria, que dá voz a um lavrador — que “procurava o presidente Fernando Henrique ‘de Souza’, em quem votou e a quem conhecia somente pela televisão preto-e-branco da casa dele em Tianguá, sertão do Ceará” — e a um funcionário público que acompanhava a posse por meio de um rádio enquanto esperava pela passagem de FHC, sobre o emblemático Rolls-Royce, em frente à Catedral Metropolitana de Brasília — “‘O presidente saiu do Palácio do Planalto e vem vindo para cá’, avisou à atenta plateia que ouvia sua minuciosa narração’”.
A última página revela detalhes de festas de réveillon e de posse; e traz carta aberta da Federação Interestadual dos Trabalhadores em Empresas de Telecomunicações (FITTel) e dos Sindicatos dos Trabalhadores em Empresas de Telecomunicações (SinTTels) ao presidente Fernando Henrique Cardoso.
Além das páginas do jornal, um suplemento especial “dedicado aos problemas nacionais que aguardam o presidente” foi publicado naquele dia 2.
Relembre a cobertura