MEMÓRIA

Quem é a primeira criança nascida em Brasília?

O primeiro registro é de Eliana Alves Franco. No entanto, relatos orais apontam que outras crianças nasceram antes, mas só foram registradas depois pela falta de cartórios na época

Embora as cidades brasileiras estejam mais estruturadas do que há 63 anos, quando Brasília foi inaugurada, ainda existem locais em que as pessoas encontram barreiras para obter registro.

Segundo o Censo de 2022, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), existem 2,7 milhões de brasileiros sem certidão de nascimento no país, o que equivale a 2,59% da população. Se esse cenário ainda persiste como desafio atualmente, na década de 1960 a questão era um imperativo.

Arquivo pessoal - A família morava na 409 sul e Eliana Alves Franco foi registrada no Cartório de 1º Ofício de Registro Civil e Casamentos, assim que foi inaugurado, em 20 de junho de 1960

A falta de cartórios no início da capital do Brasil fez com que inúmeras pessoas fossem registradas anos depois do nascimento. Além disso, a documentação da época também não é tão abrangente — fato que contribui para que não haja consenso sobre quem foi a primeira criança nascida em Brasília.

Em abril de 1970, o nome de Eliana Alves Franco estampou uma matéria do Correio Braziliense com o título "A primeira criança registrada em Brasília". Nascida na madrugada de 3 de junho de 1960, na maternidade do Hospital Distrital (atual Hospital de Base), a hoje empresária conta que os pais tiveram que esperar pela abertura de um cartório na capital para fazer o registro do nascimento.

“Assim que abriu, meu pai foi lá”, afirma. Eliana é filha do casal Luiz Fernando de Andrade Franco, que era fiscal do Instituto Nacional do Seguro Nacional (INSS), e da dona de casa Olívia Alves Franco. A família morava na 409 sul e a criança foi registrada no Cartório de 1º Ofício de Registro Civil e Casamentos, assim que foi inaugurado, em 20 de junho de 1960.

Arquivo pessoal -

Logo quando Eliana nasceu, a família se mudou para a 305 sul — local onde a menina passou a infância. Segundo Luiz Fernando, o registro civil da filha despertou muita curiosidade. "O fato da minha filha Eliana ter sido a primeira criança a ser registrada na cidade, às vezes me coloca em situações interessantes. Por exemplo, quando fui buscar a certidão no cartório, o funcionário não demorou um minuto para encontrá-la, pois sendo a primeira encabeçava a abertura do livro de registro e de arquivo. Quando alguém fica sabendo do fato, logo surgem as perguntas de quando foi, em que hospital e em que condições estava a cidade", disse o pai de Eliana, ao Correio em 1970.

Atualmente, a empresária mora em Rio das Ostras, no Rio de Janeiro, mas guarda na memória o tempo de criança que viveu na capital. "A minha infância foi muito boa. Era o início de Brasília. Brincávamos na quadra, era tudo muito bonito na capital. Eu saí de lá com 11 anos, quando meu pai foi transferido para São Paulo, então guardo memórias boas, de brincadeiras", conta Eliana ao Correio.

Poucos meses depois de Eliana, Jussara Maria Oliveira Santos foi registrada. Ela é dona da primeira certidão emitida pelo 2º Ofício de Registro Civil e Casamentos, em 25 de novembro de 1960. O nome da menina foi escolhido por ser a junção de Juscelino e Sarah — presidente e primeira-dama do Brasil à época. Jussara nasceu em 26 de abril de 1960, no Hospital Juscelino Kubitschek de Oliveira — o primeiro da nova capital — que hoje dá lugar ao Museu Vivo da Memória Candanga, localizado no Núcleo Bandeirante.

Arquivo/CB/D.A Press -

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Relatos orais

Pelos relatos orais sobre a história de Brasília, no entanto, há pelo menos quatro pessoas que reivindicam o título de primeira criança nascida na capital. Entre elas está Brasília Maria Costa Góis, que nasceu às 6h15 de 21 de abril de 1960, no Hospital São Vicente de Paula, em Taguatinga. Gonçalo Carneiro Góis, pai de Brasília, morava em Goiás quando a capital começou a ser construída. A família chegou aqui com dois filhos pequenos, Ribamar e Fátima. Quando Brasília nasceu, os holofotes se voltaram para ela.

Ronaldo de Oliveira/CB/D.A Press -

O então presidente da República, Juscelino Kubitschek, se ofereceu para batizar a menina e quis que o nome dela fosse homônimo da cidade. O padre sugeriu que se acrescentasse um “Maria” à identidade para diferenciar o nome da capital e o da criança. A sugestão foi acatada pela família. Em entrevista ao Correio no ano de 1981, Brasília contou sobre a experiência de viver com o mesmo nome da capital do país.

"Quando eu era pequena sentia muita raiva e ficava inibida por causa desse nome. Não gostava que me chamassem de Brasília. Depois, cresci e me acostumei com ele. Hoje, até gosto. Acho Brasília o melhor lugar para se morar. É bonito, tranquilo, mas também tem muitos defeitos. Os maiores são as cidades-satélites. O governo só se preocupa com o Plano Piloto, onde vêm os turistas", relatou. Brasília morreu em 2016, aos 56 anos, por conta de uma parada cardíaca.

Entretanto, antes mesmo da inauguração de Brasília, no dia 15 de abril de 1960, nasceu Brasílio, filho de Walfredo Freitas e Juanita Correia Freitas. O parto do menino foi assistido pelo primeiro médico que chegou ao Planalto Central, Jairo Almeida, juntamente com diretores da Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap). A criança foi apadrinhada pelo então presidente Juscelino e a primeira-dama Sarah Kubitschek. Todos os anos de aniversário da capital do país, Brasília e Brasílio eram reunidos e apresentados como as primeiras crianças nascidas aqui.

Fora da região central, na antiga Cidade Livre, que atualmente corresponde ao Núcleo Bandeirante, nasceu José de Moura Filho, na madrugada de 12 de junho de 1957. Ele é filho dos goianos Malvina de Araújo Brito e José de Moura Brito. Em 2006, a mãe de José relatou ao Correio que o nascimento do filho foi anunciado para todos os moradores da região ouvirem. “O moço do carro de som passou anunciando: ‘primeiro bebê nascido na Cidade Livre’. Eu fiquei toda contente”, disse.

Gustavo Moreno/CB/D.A Press -

Outra mulher também figura na lista das primeiras brasilienses nascidas nos arredores da capital: Araguasselva Lira Fernandes Paniago. Ela nasceu nos primeiros minutos de 21 de abril de 1960, na Vila do IAPI, perto do Guará, mas só foi registrada quatro anos depois. Em 2019, Selva, como gosta de ser chamada, disse ao Correio que lembrava da mãe falar que ouvia os fogos de artifício da inauguração da cidade enquanto estava dando à luz. "Eu ficava entristecida porque eu poderia ter sido a primeira brasiliense, mostrada e chamada assim", declarou Araguasselva.

*Essa matéria foi construída com informações do Centro de Documentação do Correio Braziliense (Cedoc)

 

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