RACISMO

As mídias sociais como aliadas no combate ao racismo

As políticas públicas de promoção da igualdade racial ainda são insuficientes e, na mesma ordem, indispensáveis diante das marcas deixadas pela escravidão, um trágico período da história brasileira

MIGUEL DOS ANJOS

Passados 135 anos da abolição da escravatura, o Brasil ainda padece dos efeitos do dia seguinte à Lei Áurea. A reparação histórica dos danos causados, por mais de 300 anos de cativeiro, aos herdeiros da diáspora atlântica é urgente. As políticas públicas de promoção da igualdade racial ainda são insuficientes e, na mesma ordem, indispensáveis diante das marcas deixadas por esse trágico período da história brasileira, visível na sociedade atual, pela permanência e reprodução da desigualdade social, econômica e racial.

Se de um lado, o novo governo se empenha em promover políticas públicas para reduzir desigualdades sociais e econômicas, do outro, e em grande proporção, o racismo estrutural e a intolerância religiosa contra quem vivencia sua fé nas religiões de matriz africana têm chamado a atenção pelas denúncias nas redes sociais. A propósito, essas plataformas, nos últimos anos, têm se tornado aliadas no combate a todas as formas de racismo e na promoção de ações antirracistas, assim como na difusão de discriminação e preconceito.

A questão racial não é novidade a ser enfrentada. O racismo está estampado nas manchetes dos jornais e no noticiário dos principais telejornais, reafirmando a existência de uma estrutura racial em que pessoas negras e pardas são vítimas de práticas discriminatórias institucionais, históricas e culturais para resguardar privilégios de pessoas em relação àquelas consideradas racialmente subalternas.

O racismo não deve estar na pauta somente das pessoas pretas e pardas. O antirracismo deve ser uma construção permanente e vigilante de toda a sociedade, inclusive com a participação de pessoas brancas; pois afinal, quem inventou o racismo? Nesse sentido, as mídias sociais têm colaborado ao enfrentar o racismo estrutural por meio dos influenciadores, criadores de conteúdo digital, que militam no ativismo antirracista nas plataformas, engajando milhares de usuários, que recebem, em seus feeds, as atualizações de conteúdos nas suas páginas do Facebook, Twitter ou Instagram.

Esses influenciadores se destacam na tarefa do letramento racial, apresentando temas e acontecimentos, esclarecendo assuntos de maneira didática, promovendo a autoestima dos seguidores, com análises da realidade dos fatos históricos e atuais. Também ajudam no entendimento das práticas e dos cultos das religiões de matriz africana, além de divulgar denúncias de crimes raciais como a intolerância religiosa, a injúria racial, que este ano foi equiparada ao racismo. Várias razões demonstram que as mídias sociais podem favorecer pessoas de diferentes origens e comunidades que compartilham experiências e expectativas a respeito do racismo, facilitando a ampliação das vozes na rede.

Assim, ficou evidente nos acontecimentos da morte do afro-americano George Floyd em 25 de maio de 2020. Não há como esquecer a frase suplicante de Floyd: “I can’t breathe” (Não posso respirar). Meses depois, aqui no Brasil, na véspera do Dia Nacional da Consciência Negra, João Alberto Freitas foi espancado e assassinado, por asfixia, por seguranças do Carrefour na Zona Norte de Porto Alegre. A informação, os dados e as histórias relacionadas aos fatos foram compartilhadas.

Outro aspecto a considerar é a probabilidade de mobilização e ativismo que as redes sociais estimulam. Seguidores podem promover encontros, manifestações, protestos e eventos antirracistas, além de facilitar a criação de comunidades online, onde pessoas de interesses afins podem se conectar e trocar ideias, se educar a respeito das questões raciais e dos seus desdobramentos e impactos. Cria-se uma consciência coletiva, que incentiva a reflexão e o diálogo. As comunidades on-line, também, podem se organizar como redes de apoio às vítimas do racismo. A hashtags é recurso a ser usado com temas associados ao racismo, que ajuda pessoas na troca de experiências e fornece a elas suporte emocional para lidar com o ato de violência.

As plataformas possibilitam, também, a documentação dos atos racistas captados em vídeos, o que facilita a responsabilização dos autores, quando identificados. Dessa forma, cria-se uma cultura que desestimula comportamentos discriminatórios e preconceituosos. Mas é fundamental observar que as mídias sociais mal utilizadas podem favorecer discursos de ódio e espalhar estereótipos racistas. Portanto, todo o cuidado é necessário para o uso responsável dessas plataformas. Devemos criar espaços de inclusão e aperfeiçoamento para combater desinformação e discurso de ódio.

MIGUEL DOS ANJOS, jornalista, pós-graduado em Gestão da Comunicação pelo UniCeub

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