empreendedorismo

Mulheres são maioria entre titulares de empresas no Brasil, aponta Sebrae

Especialista comenta qualidades que as diferenciam nos negócios e execultivas destacam desafios e motivações

Patrick Selvatti
postado em 15/12/2024 06:00 / atualizado em 15/12/2024 06:00
Dai Schimidit (centro) criou o Desfile de Beleza Negra, em protesto contra a ausência de negras e negros nas passarelas da moda da capital federal -  (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)
Dai Schimidit (centro) criou o Desfile de Beleza Negra, em protesto contra a ausência de negras e negros nas passarelas da moda da capital federal - (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)

Há alguns anos, Joyce Gonçalves foi convidada por uma empresa de tecnologia da informação para assumir a direção de suas operações em Brasília. O problema começou logo na negociação salarial, quando ela percebeu uma tentativa de desvalorizar a sua pretensão financeira, com insistência em oferecer um valor abaixo do que colocou como proposta. Algum tempo depois, descobriu que um dos profissionais sob a sua supervisão, com menos experiência e habilidades, recebia um salário superior ao dela, simplesmente por ser homem. Essa situação não apenas reforçou os desafios de atuar em um setor ainda marcado por desigualdades de gênero, mas também fortaleceu a determinação de Joyce em buscar reconhecimento justo e abrir caminhos para que outras mulheres enfrentassem menos barreiras no futuro.

A história de Joyce reflete o dilema de grande parte das profissionais do sexo feminino — uma realidade que não deve ser alterada tão cedo. Em um relatório sobre disparidade de gênero lançado em 2021, o Fórum Econômico Mundial (FEM) estimou que, ao longo do ano de 2021, a pandemia acrescentou 36 anos ao tempo necessário para reduzir a disparidade entre homens e mulheres no mundo inteiro. Enquanto o tempo previsto para reduzir as diferenças entre homens e mulheres é de 135,6 anos, a paridade econômica demoraria ainda mais tempo para acontecer. Ou seja, seriam necessários 267,6 anos para alcançar essa meta. 
Para fugir desse cenário, Joyce encontrou no empreendedorismo uma alternativa. Uma forte motivação para investir no negócio próprio é, segundo a administradora com pós em segurança da informação, a paixão por identificar oportunidades em meio aos desafios e encontrar soluções criativas para problemas. “A liberdade de criar algo do zero, acompanhar o crescimento dessa ideia e testemunhar seu impacto positivo na sociedade é, para mim, uma das maiores realizações. Empreender vai muito além de construir negócios; é sobre transformar vidas e contribuir para um mundo melhor”, afirma a hoje CEO do ComPre — Comercialização de Precatórios, uma startup made in Brasília, criada por ela e pelo sócio André Santos em 2023.
Encontrar soluções criativas é o que motiva Joyce Gonçalves, CEO da ComPrecatorios
Encontrar soluções criativas é o que motiva Joyce Gonçalves, CEO da ComPrecatorios (foto: Anderson Matta/Divulgação)
Joyce faz parte de uma tendência que tem predominado no Brasil: de acordo com dados do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), as mulheres são maioria entre os empreendedores no país, somando 32 milhões em um total de 52 milhões. Para a empresária Alexandra Casoni, autoridade em liderança educadora voltada para o segmento feminino, as mulheres são boas de negócio por, entre outros fatores, possuírem uma mentalidade criativa, empática e relacional superior. “As mulheres são mais propensas a liderar a partir de uma mentalidade criativa, concentrando-se no que mais importa para o futuro que estão criando e fazendo parcerias para avançar em direção a essa visão”, garante a especialista. 
De acordo com Joyce, sua empresa é um exemplo claro de como a criatividade pode ser um diferencial na liderança. “O ComPre nasceu de uma ideia inovadora e disruptiva, voltada para transformar o mercado de comercialização de precatórios, que ainda é bastante arcaico e burocrático. Essa mentalidade criativa nos permitiu enxergar oportunidades de mudança e implementar soluções que realmente fazem a diferença”, destaca. A empresária brasiliense concorda que, como líder, toma decisões mais empáticas. “As mulheres têm uma tendência a considerar os impactos das escolhas de maneira ampla, buscando equilibrar benefícios e minimizar prejuízos para todas as partes envolvidas. Acredito que fatores emocionais, quando bem gerenciados, são informações valiosas, pois ajudam a entender o que realmente importa e a prever os possíveis desdobramentos de uma decisão”, defende. 

Suporte emocional 

Porém, apesar desse cenário de tendência positiva mundial, as mulheres ainda enfrentam desafios adicionais ao fundar e gerir seus negócios, como desigualdade de oportunidades, falta de acesso a investimentos e sobrecarga com atividades domésticas e de cuidados com os filhos. 
Alexandra Casoni, mentora: "Mulheres se destacam naturalmente nos negócios"
Alexandra Casoni, mentora: "Mulheres se destacam naturalmente nos negócios" (foto: Amanda alexandre/divulgação)
Para Alexandra, um dos principais obstáculos é o acesso ao financiamento, já que, muitas vezes, as mulheres enfrentam dificuldades em obter crédito ou investir devido a estereótipos de gênero e a uma rede de apoio limitada. “A falta de confiança também é um desafio comum, com muitas mulheres duvidando de suas capacidades devido a normas sociais ou à falta de representação feminina em áreas empreendedoras”, pontua ela, que, atualmente, tem como foco total de dedicação o Club A, um movimento revolucionário de educação empresarial, autoral e exclusivo para mulheres empreendedoras do Brasil e do mundo. 

“Um ambiente de apoio e troca de experiências é fundamental, pois muitas mulheres enfrentam o isolamento no ambiente de negócios. Outro aspecto importante é o fortalecimento da inteligência emocional, essencial para lidar com obstáculos, crises e frustrações”, argumenta Alexandra, que é sócia da Flormel, uma das maiores empresas do segmento saudável do Brasil, e possui uma trajetória que se estende por 20 anos, incluindo nove como CEO da empresa familiar, fundada em Franca, em São Paulo. 

À flor da pele 

 Atriz Daí Schmidt: criadora do projeto Desfile Beleza Negra
Atriz Daí Schmidt: criadora do projeto Desfile Beleza Negra (foto: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)

Os problemas do empreendedorismo feminino se amplificam quando é acrescentado ao perfil da mulher a raça negra. Produtora de moda e psicóloga, Dai Schimidit é o nome à frente da empresa que realiza o Desfile de Beleza Negra, um projeto que nasceu em 2012, em protesto contra a ausência de negras e negros nas passarelas da moda de Brasília. Nessa jornada, ela sente literalmente na pele os desafios de ser empreendedora negra. “Ser mulher e trabalhar para destacar e valorizar a beleza negra é um ato de resistência. Muitas vezes, lidamos com barreiras que vão além do financeiro; são estruturais e sociais. Precisamos educar, sensibilizar e lutar para que nosso trabalho seja visto e respeitado”, afirma a empreendedora social, que, por meio da batalha para inserir modelos negros e negras na indústria da moda, gera emprego e renda para dezenas de profissionais envolvidos no desfile. Só em 2024, o projeto teve quatro edições. 
A captação de recursos é outro grande desafio. Dai ressalta que conseguir patrocínios exige muita resiliência e criatividade. “É um trabalho constante de vender a ideia, mostrar os benefícios para os apoiadores e, ao mesmo tempo, manter o propósito e a essência do projeto. Mas é gratificante ver os frutos desse trabalho. Saber que, de alguma forma, estou contribuindo para abrir portas e criar oportunidades para outras pessoas, especialmente para quem vive em situações de vulnerabilidade, faz tudo valer a pena”, festeja a empresária. 

Sem limitação etária 

Iara Miranda orienta carreira de aposentados ativos
Iara Miranda orienta carreira de aposentados ativos (foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

Para se manter profissionalmente ativa e até mesmo empreender, não há limitação de idade. Com esse pensamento, a servidora pública aposentada Iara Miranda dá uma lição de vida. Após encerrar suas atividades no funcionalismo público, ela não somente decidiu que não pararia de trabalhar, como enxergou em sua própria realidade uma oportunidade de negócio. A empreendedora de 65 anos fundou a Perspectivas Soluções Intergeracionais, que oferece preparação para aposentadoria por meio de processos de coaching e orientação de carreira para quem não quer deixar de trabalhar. 
“Aposentar não significa parar com a atividade profissional. Eu sempre gostei muito de trabalhar e, quando chegou a época da minha aposentadoria, trabalhei oito anos a mais. Eu identifiquei o que eu gostaria de fazer, que era exatamente passar a minha experiência para os outros, que é possível a gente encontrar uma luz no fim do túnel e fazer coisas quando a gente está envelhecendo”, conclui Iara. Ela também oferece programas para melhorar o relacionamento intergeracional das pessoas que entram nos concursos, por exemplo, com as pessoas que estão na instituição e já estão para se aposentar; para pessoas que querem mudar de vida e de carreira, entre outros. E dá um ótimo exemplo ao ingressar em uma nova graduação por meio do Vestibular 60+ da Universidade de Brasília (UnB). 

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