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Nova lei garante direitos para mães e pais estudantes

Lei sancionada na última quarta-feira (17/7) amplia prazo para conclusão de alunos de graduação ou pós-graduação em razão do nascimento de filhos ou em casos de adoção legal

Estudantes que se tornam mães ou pais durante a formação acadêmica enfrentam barreiras na conciliação dos estudos e dos cuidados com os filhos. Entre as principais dificuldades, estão a busca por uma rede de apoio, para que eles possam se dedicar às atividades da faculdade, e o gerenciamento do tempo, que deve ser dividido entre as demandas acadêmicas e as necessidades das crianças.

Tendo isso em vista, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou o Projeto de Lei (PL) 1741/22, na última quarta-feira (17/7), que prevê ampliação de, no mínimo, 180 dias do prazo para conclusão de curso em razão do nascimento de filhos ou em casos de adoção, tanto na graduação quanto na pós-graduação. O projeto é de autoria da deputada federal Talíria Petrone (PSOL-RJ). 

Com a lei, estudantes que se tornam mães ou pais em meio à formação acadêmica passam a ter direito à prorrogação do prazo para conclusão de disciplinas, entrega de trabalhos finais, incluindo trabalhos de conclusão de curso (TCC), e realização de sessões de defesa de teses e de publicações exigidas. Em caso de gravidez de risco ou atuação em pesquisa que implique risco à gestante ou ao feto, o prazo mínimo de 180 dias também está valendo. Quando o filho nascido ou adotado for pessoa com deficiência (PcD), a ampliação do período para formação pode ser de, pelo menos, 360 dias.

Permanência e inclusão 

Fotos: Arquivo pessoal - A senadora Professora Dorinha Seabra diz que o PL estimula mães e pais estudantes a permanecerem na formação
 

Para a senadora Professora Dorinha Seabra (União-TO), que foi relatora da matéria na Comissão de Educação (CE) e na Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado, a medida não só facilita a conciliação da maternidade ou paternidade com os estudos, mas também estimula que mães e pais estudantes permaneçam na formação.

“Para além da gestação normal, pode haver intercorrências, tem o período de adaptação, tanto no pós-nascimento como na adoção, e nos programas de graduação e pós há prazos a serem cumpridos, que se chocam com os prazos naturais de um processo de nascimento ou adoção. Então, a lei é muito importante porque dá condições para o exercício da maternidade e da paternidade sem que os estudantes sejam prejudicados, além de estimular pesquisadores que estão envolvidos em grupos de pesquisa”, afirma.

Para Liliana Marquez, conselheira e presidente da Comissão de Direito das Famílias e Sucessões da Ordem dos Advogados do Brasil do DF (OAB/DF), a matéria também possibilita apoio psicológico e emocional aos beneficiados, além de promover a inclusão por meio do reconhecimento da diversidade de casos.

“A lei oferece um reconhecimento institucional das dificuldades enfrentadas por pais estudantes, o que pode melhorar seu bem-estar e engajamento acadêmico. Além disso, promove uma política mais inclusiva, reconhecendo a diversidade das situações dos estudantes e garantindo que todos tenham oportunidades iguais de concluir sua formação”, expõe.

Desigualdade de gênero 

Arquivo pessoal - A conselheira da OAB Liliana Marquez defende políticas voltadas para mães e pais estudantes, promovendo a inclusão

Apesar de beneficiar mães e pais estudantes, a nova legislação afeta, em maior peso, as mães. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as mulheres, que representam 51,5% da população brasileira, segundo o Censo 2022, somam 21,3% das pessoas com ensino superior completo, contra 16,8% dos homens. Apesar disso, no mesmo ano, 53,3% delas estavam inseridas no mercado de trabalho, em comparação com 73,2% deles.

Ainda, a maior parte dos alunos de pós-graduação (54,54%) é formada por mulheres, de acordo com a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) do MEC. No entanto, cerca de 30% delas abandonam os estudos de pós devido aos desafios de conciliar a vida acadêmica e a maternidade, afirma a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

As desigualdades entre os gêneros podem ser explicadas pela divisão no trabalho de cuidado, desempenhado majoritariamente por mulheres. De acordo com o IBGE, em 2022, elas dedicaram 9,6 horas semanais a mais do que homens aos afazeres domésticos e cuidados de pessoas — 21,3 horas contra 11,7 horas. Para Liliana Marquez, o desequilíbrio no trabalho de cuidado prejudica o crescimento profissional das mulheres e é um empecilho para a igualdade salarial.

“As mulheres frequentemente assumem uma parte maior das responsabilidades de cuidado, o que pode limitar seu tempo e sua energia para o desenvolvimento profissional. Essa desigualdade resulta em maiores taxas de abandono ou interrupção de carreira entre elas, prejudicando suas oportunidades de crescimento e promoção. Além disso, a dedicação maior ao trabalho de cuidado contribui para a manutenção da diferença salarial entre os gêneros. Aquelas que tentam conciliar carreira e maternidade, muitas vezes, enfrentam estigma e discriminação, o que pode dificultar ainda mais sua progressão profissional”, explica Liliana.

Conciliação de rotinas 

Yasmin Lacerda, de 23 anos, é estudante de medicina do 11° período na Faculdade de Ciências Médicas da Paraíba e tem um filho de um ano. Ela conta que a maior dificuldade que enfrenta para conciliar os estudos com a maternidade é o gerenciamento do tempo, principalmente, no período de internato, no final do curso. Porém, ela conta com o apoio do esposo e dos pais, o que considera essencial para a continuidade de sua formação.

“Um bebê demanda muito cuidado, atenção e zelo, então, para você conciliar com uma faculdade de medicina, ainda mais no internato, isso demanda que você tenha uma rede de apoio para ter tempo de realizar os estágios e as demandas da faculdade. Você precisa se virar nos 30 para, no tempo livre, conseguir encaixar as tarefas. Meu filho ocupa 90% do meu tempo, então, nos 10% livres, eu tenho que me dedicar ao máximo para fazer com que meus estudos sejam produtivos. Graças a Deus, tenho uma rede de apoio muito boa, meu esposo é um pai muito presente, e isso ajuda muito a dar continuidade aos estudos”, compartilha.

Yasmin desenvolveu o TCC quando estava grávida e relata que a rotina de produção do trabalho com a gravidez foi puxada, mas optou por não tirar licença-maternidade pelo atraso que teria na formação: “Se tirasse a licença, só iria me formar depois, e a faculdade puxa muito essa correria de ter que fazer as coisas logo, na intenção de não perder o curso”. Por sorte, seu filho, Enzo, nasceu quando ela estava de férias do curso, facilitando a adaptação à nova rotina. Para ela, a lei que amplia o prazo para a formação de mães e pais teria lhe ajudado muito na época, caso estivesse em vigor.

Hoje, com o filho de um ano, Yasmin considera que a rotina está mais leve, mesmo com as demandas da faculdade, “até porque me adaptei à maternidade”. Ela pretende se formar e fazer residência, modalidade de ensino de pós-graduação destinada a médicos, buscando se especializar em neurologia.

Igualdade 

Políticas públicas voltadas para mães e pais estudantes são importantes não só para a permanência na universidade, mas para promover um ambiente acadêmico e profissional mais igualitário para esses grupos, em especial, para as mulheres, que desempenham a maior parte do trabalho de cuidado, como defende a conselheira da OAB Liliana Marquez: “Essas medidas são essenciais para criar um ambiente em que mães e pais possam equilibrar suas responsabilidades familiares com seus objetivos acadêmicos e profissionais, promovendo uma sociedade mais justa e igualitária.” 

*Estagiária sob a supervisão de Ana Sá