Um projeto inovador que traz acessibilidade para pessoas surdas foi desenvolvido por alunos para uma renomada competição internacional de robótica. Com a pulseira SurdoMusic, estudantes do Serviço Social da Indústria (Sesi) de Taguatinga foram premiados na categoria projeto de inovação do torneio Western Edge Open, que busca promover soluções criativas para problemas do dia a dia. A premiação ocorreu em Long Beach, Califórnia, nos Estados Unidos, entre 31 de maio e 2 de junho.
Ao ser conectado ao bluetooth do celular, o protótipo desenvolvido pela equipe Albatroid, com sete integrantes, converte ondas sonoras em vibrações para que deficientes auditivos possam viver uma experiência imersiva. Ana Clara Silva, 14 anos, explica que a ideia do SurdoMusic surgiu diante da percepção do grupo sobre a falta de acessibilidade para pessoas surdas, buscando uma solução inclusiva para elas.
"A gente começou a pesquisar sobre os problemas sociais e encontrou sobre a falta de acessibilidade no Brasil para as pessoas surdas. Vimos que existiam coletes e mochilas, só que eles não são para o cotidiano, não são acessíveis para essa comunidade. Então, a gente conversou com especialistas para avaliar qual seria a solução mais eficaz para que pudéssemos, realmente, trazer essa imersão da música para a comunidade surda", conta.
O torneio
O Western Edge Open faz parte da competição internacional de robótica First Lego League (FLL), que tem como intuito despertar o interesse de crianças e jovens nas áreas de ciências, tecnologia, engenharia e matemática. O torneio, voltado para a faixa etária de 9 a 15 anos, premia projetos em quatro categorias: desafio do robô, design do robô, projeto de inovação e core values (valores fundamentais). Nas duas primeiras, avalia-se a produção e o funcionamento de robôs feitos pelas equipes; na terceira, a criatividade e tecnologias utilizadas na criação de um projeto inovador; na última, os juízes observam as habilidades de trabalho em equipe durante a produção.
Neste ano, o Western Edge Open teve como tema o uso da tecnologia e das artes para oferecer acessibilidade aos hobbies, atividades que as pessoas gostam de fazer no tempo livre. A equipe Albatroid foi uma das quatro premiadas na categoria projeto de inovação, competindo com outras 84 equipes de 20 países.
Incentivo
Júlia Maria Miranda, 13 anos, diz que foi um desafio desvendar como converter o som em vibrações e destaca, principalmente, o apoio de especialistas e professores da Universidade de Brasília (UnB) na produção da pulseira SurdoMusic. "A gente teve diversas mudanças para chegar no produto final, e um dos principais desafios foi a questão de como a gente ia conseguir transformar a música em uma vibração. Tivemos apoio de especialistas e professores da UnB, além da nossa própria escola, para o SurdoMusic funcionar não só com uma música pré-definida, mas com qualquer uma", relata.
Para o professor de filosofia e técnico de robótica no Sesi Taguatinga, João Mateus Alves, o que mais chamou atenção no projeto da Albatroid foi a criatividade dos jovens e um olhar sensível sobre os problemas sociais. "O que mais me impressionou foi a capacidade desses jovens de 12 até 15 anos para desenvolver algo tão bonito e inclusivo, pensando sempre nas dificuldades que as pessoas com deficiência auditiva enfrentam no seu dia a dia. Para mim, isso foi muito emocionante e impactante. Podemos perceber como o torneio internacional e o projeto da robótica contribuem para a formação e educação dos alunos", afirma.
A gerente executiva de educação do Sesi-DF, Valéria Silva, defende o ensino da robótica como incentivo ao desenvolvimento de habilidades técnicas e socioemocionais para o mercado de trabalho, que exige competências integradas.
"Nossa proposta pedagógica busca incentivar os alunos a desenvolver projetos e pesquisas nas áreas de ciências, tecnologia, engenharia, artes e matemática. Isso vai ao encontro da robótica, que envolve toda uma questão de pensamento computacional e raciocínio lógico. Além das habilidades técnicas, trabalhamos no âmbito da educação, valorizando o trabalho em equipe, o respeito às diferenças, a autonomia, criticidade e protagonismo. Hoje, o mercado de trabalho procura um profissional cada vez mais qualificado, com habilidades técnicas e socioemocionais, então integramos essas competências com a robótica", expõe.
Feedbacks
Durante a produção do SurdoMusic, os alunos da Albatroid levaram o dispositivo até pessoas surdas, para testar o funcionamento da pulseira e fazer eventuais melhorias. A testagem do projeto se deu na Escola Bilíngue de Taguatinga, única do Centro-Oeste para pessoas com essa deficiência. Ana Luiza do Nascimento, 15 anos, explica que o SurdoMusic recebeu feedbacks muito positivos, que contribuíram para a versão final do produto.
"Antes mesmo da etapa nacional, nós já implementamos o primeiro protótipo da nossa solução na Escola Bilíngue e recebemos alguns feedbacks que a gente poderia melhorar. Falaram sobre o tamanho da pulseira, para ficar uma uma solução mais acessível, e também que a gente podia fazer uma base mais forte para que a vibração ficasse mais nítida. Tivemos feedbacks super positivos do diretor da Escola Bilíngue e da diretoria de educação inclusiva, que também são pessoas com deficiência auditiva. Então, a gente só teve algumas mudanças em relação à parte visual do nosso projeto, para ficar mais fácil para o dia a dia", descreve.
Ana Luiza completa dizendo que a implementação do SurdoMusic foi de "leve escala, porque, por enquanto, ele é um produto único". Ela acredita que, no futuro, pode ser possível expandir o protótipo para o público geral: "De repente, com mais feedbacks, possamos melhorar nossa solução e comercializá-la para mais pessoas."
Experiência
Os alunos da equipe vencedora compartilham que viveram uma experiência única, que vai desde o processo de produção do SurdoMusic até o momento da premiação nos Estados Unidos. Gustavo Rafah, 14 anos, conta sobre a empolgação dos estudantes fazendo uma viagem para fora do país: "Para alguns, foi a primeira viagem de avião, a primeira viagem para fora do país, e lá, a gente conheceu diversas culturas, vimos como as equipes estão ajudando os países delas ao criar inovações. Essas são memórias que vamos guardar para a vida toda."
Filipe William Nogueira, 14 anos, diz que, além de conhecer outras culturas, a viagem foi "incrível" pois os alunos puderam fazer novas amizades. Para ele, a sensação de trazer o prêmio para casa é de pura felicidade: "A sensação é de trabalho recompensado. É simplesmente incrível, porque caraca, o que você fez aqui dentro foi para fora do país, e você conseguiu mostrar o seu trabalho. Isso é uma sensação que não tem como descrever."
*Estagiários sob a supervisão de Ana Sá