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Concursos: especialistas apontam alto índice de reprovação na fase subjetiva

Maioria dos candidatos aprovados na primeira etapa do certame da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) foi eliminada na prova discursiva. Especialistas comentam resultado

Lara Costa*
postado em 26/05/2024 06:00 / atualizado em 27/05/2024 14:43
Concurso da ANTT teve mais de 75% de reprovados na segunda etapa, de acordo com Samuel Quintiliano -  (crédito: Maurenilson Freire)
Concurso da ANTT teve mais de 75% de reprovados na segunda etapa, de acordo com Samuel Quintiliano - (crédito: Maurenilson Freire)

Concurseiros do Distrito Federal relatam dificuldade na segunda etapa (prova discursiva) da seleção para a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), aplicada no dia 14 de abril. A banca realizadora é o Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de Eventos (Cebraspe), que liberou os resultados provisórios na última semana.

A constatação do número elevado de eliminados foi feita por Samuel Quintiliano, auditor fiscal e professor de cursinho preparatório para concurso público. Desde 2021 ,ele organiza uma planilha com dados sobre as provas e os rendimentos dos candidatos, divulgando essas análises pelo Instagram.

Com o levantamento, o professor calculou que o índice de eliminação de candidatos após as questões discursivas para a ANTT chegou a impactar 75,61% das pessoas já aprovadas na primeira fase do concurso — dos 164 que passaram para a segunda etapa, 118 não alcançaram a nota mínima — , levando à não continuidade do processo seletivo e ao não preenchimento das vagas abertas. A alta taxa também foi observada em outros certames, como o da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), com cerca de 77% de reprovados.

O professor Samuel Quintiliano analisa provas de concursos públicos.
Samuel Quintiliano analisa provas de concursos e o resultado dos participantes (foto: Arquivo Pessoal)

Frustração

Uma candidata que não quis se identificar foi uma das que passou na primeira fase e notou, junto a outros colegas que prestaram os concursos da banca, que havia baixo rendimento dos participantes nas questões discursivas. Ela observou contradições no comando da avaliação e entrou com recurso para reaver a nota obtida.“Com esses quantitativos, nem a previsão das vagas foi preenchida, porque não houve profissionais suficientes para preencher as vagas de imediato e o cadastro reserva.”

O professor acredita que, além do alto nível exigido pela banca, existem alguns fatores que influenciam o resultado negativo, como a falta de preparação adequada dos candidatos. “Não se pode culpar a banca 100% nem pedir para ‘passar a mão na cabeça’ dos candidatos, porque estamos falando de cargo público. Agora, se o foco é melhorar o ensino, esses números revelam que existe algo errado com quem estuda muito e não passa na segunda fase”.

Nesse contexto, Samuel aponta para a forma como os cursos preparatórios ensinam, nos quais as orientações sobre as questões discursivas não são priorizadas.“Esses processos seletivos são diferentes do vestibular e do Enem, por exemplo,porque os candidatos focam mais na preparação para as questões objetivas, e os cursinhos não corrigem os textos, então é uma situação sistêmica”, explica.

Subjetividade

A advogada e professora Roberta Batista de Queiroz, coordenadora do GranCursos On-line e secretária geral da OAB/DF, confirma o alto índice de reprovação nessa fase dos concursos públicos e atribui isso à subjetividade nas etapas discursivas. “É comum ter duas fases para avaliar os candidatos. O que eu venho observando ao longo dos anos é que existe, sim, um alto índice de reprovação em fases subjetivas. E isso acontece, muitas vezes, por uma baixa dedicação à disciplina de português, por parte do concurseiro, mas, também, pela inobservância do examinador em relação ao conteúdo trabalhado pelo candidato”.

Quando a deficiência é do participante, leitura e prática são a solução. “Não se pode ter uma preparação apenas objetiva, é preciso um estudo holístico, generalizado, que parte muito da leitura de jornais, textos acadêmicos e literatura”,orienta a educadora. Já no segundo caso,ela recomenda a abertura de recurso administrativo. “Sendo o erro da banca, não tem como escapar, é necessário recorrer.Se a pessoa já está reprovada, não tem nada a perder”, defende.

O que diz o Cebraspe

Procurado, o Cebraspe indica que será possível avaliar a realidade dos candidatos de forma mais assertiva após a fase de recursos. “O evento citado não teve seus resultados finais divulgados. Qualquer análise sobre índices de reprovação somente poderá ser feita quando os resultados definitivos forem publicados, em razão das fases recursais e outras etapas de seleção classificatórias e/ou eliminatórias previstas nos cronogramas dos certames”, disse a instituição, em nota. Os resultados definitivos dessa fase da ANTT, bem como as convocações para as próximas etapas da seleção, devem ser disponibilizados em 3 de junho.

*Estagiária sob a supervisão de Marina Rodrigues

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