A desigualdade de gênero permeia os cargos de chefia no serviço público federal. Embora as mulheres representem a maioria da sociedade — 51,5% da população brasileira se diz mulher, segundo o último Censo nacional —, apenas 42,4% dos servidores do Governo Federal são do gênero feminino e ocupam o cargo de chefia, mostram dados do Observatório de Pessoal do Governo Federal.
Com base nas informações, o Movimento Pessoas à Frente produziu um relatório que aprofunda as desigualdades de gênero nas esferas de poder do funcionalismo público da União. De acordo com o levantamento, a presença de mulheres encolhe nos cargos de chefia.
No serviço público federal, as posições de alta liderança são identificadas como as de Direção e Assessoramento Superior (DAS)-5, DAS-6 e as lideranças de Natureza Especial (NES). Conforme o relatório do grupo Pessoas à Frente, as funções NES são preenchidas por 73% de homens e 27% de servidoras.
Quanto às de assessoramento superior (DAS) 5 e 6, a representatividade feminina sobe, mas ainda é distante da quantidade de homens e mulheres na sociedade, sendo respectivamente 39,7% e 31,5% entre funcionários públicos federais.
Por que discutir a participação feminina?
Além de representar a maior parte da sociedade brasileira, torna-se necessário discutir a participação das mulheres no serviço público porque, na avaliação da diretora executiva do Pessoas à Frente, Jéssika Moreira, agregaria ao poder público “pontos de vista diversos e complementares em relação às necessidades da população”.
“Como responsáveis por funções que interferem diretamente na vida da população, é muito importante que os servidores e o conjunto da administração pública representem a diversidade do país”, complementou Jéssika.
Gargalos
Em entrevista ao Correio, Jéssika Moreira apontou as possíveis causas desta disparidade de gênero nos cargos de liderança no serviço público. Na visão dela, as desigualdades no comando de setores do serviço público “espelham” e “reproduzem” o funcionamento da sociedade como um todo e a situação de não “pertencimento da mulher a espaços de poder e de decisão”.
Como exemplos deste contexto, Jéssika discorreu sobre situações que as mulheres exercem mais de uma função. “Nesse cenário que já persiste há décadas, o que temos é que, por um lado, o trabalho doméstico com crianças, idosos e do cuidado doméstico não é distribuído entre todas as pessoas responsáveis e segue sendo desproporcionalmente realizado pelas mulheres”, afirmou.
Caminhos
Questionado sobre possíveis caminhos para fomentar o aumento de mulheres nos cargos de liderança do serviço público federal, o Movimento Pessoas à Frente posicionou-se favorável à adoção — pelo governos — de uma agenda de promoção da equidade de gênero em "todas as áreas".
"É fundamental persistir na construção de políticas públicas promotoras da equidade, apoiadas pela vontade política de lideranças que reconheçam e abordem a organização social do cuidado como um problema público prioritário. Pensar em ações relacionadas ao tripé: acesso, permanência e ascensão é fundamental", completou Jéssika.
Em defesa ao aumento da participação feminina em cargos de liderança no serviço público, a diretora do movimento citou experiências em países vizinhos como exemplo. "Em outros países, como no México, existem leis que garantem a ocupação de mulheres em posição de chefia nos três poderes, mas essa discussão ainda nos parece muito distante no nosso país", falou.
O que o governo faz
Embora, na avaliação do Movimento Pessoas à Frente, a participação feminina em cargos de chefia no poder federal esteja longe do ideal, a presença de mulheres em cargos de poder vem aumentando nos últimos três anos, conforme mostra o gráfico do Ministério de Gestão e Inovação no Serviço Público (MGI) produzido com dados gerados pelo Observatório de Pessoal, do Governo Federal.
A reportagem também apurou que o governo promove iniciativas de incentivo à presença feminina na chefia. Em março — mês em que comemora-se o Dia da Mulher —, a Escola Nacional de Administração Pública (Enap) anunciou cursos de qualificação e fomento à formação de mulheres líderes. O Correio entrou em contato com a assessoria do MGI para coletar mais informações sobre a participação feminina na gestão federal e aguarda respostas.