Enquanto aprovados no último concurso para professor de carreira na Secretaria de Educação do Distrito Federal (SEEDF) aguardam serem convocados para tomar posse, escolas de educação básica sofrem com a falta de professores.
Segundo estimativa da Comissão de Educação da Câmara Legislativa do DF (CESC/CLDF), há carência de mais de 15 mil professores para ocupação de vagas efetivas na rede. O número corresponde à quantidade de professores em regime de contratação temporária que, atualmente, estão em sala de aula ocupando vagas que deveriam ser destinadas a concursados.
O deputado distrital Gabriel Magno (PT), presidente da CESC, afirma que a rede vem sofrendo uma grande redução de professores causada pela não reposição dos quadros. "Nos últimos oito anos, a Secretaria de Educação não realizou concurso para professor efetivo e os servidores foram se aposentando. Fizemos um levantamento e, hoje, de 53% a 60% dos professores em regência são contratos temporários. Há escolas em que 100% dos professores estão sob esse regime", diz.
O Sindicato dos Professores (Sinpro-DF) calcula que mil docentes se aposentem por ano na rede. A SEEDF informou que vai contratar, em dezembro deste ano, 756 profissionais para magistério, 244 a menos que a vacância anual indicada pelo Sinpro. A rede pública de ensino no DF conta com cerca de 700 escolas — caso as convocações sigam a previsão do GDF, seria nomeado, em média, um professor para cada unidade de ensino.
"Isso não faz nem cócegas na necessidade do sistema. O governo não repõe as aposentadorias por concurso e quando o faz, é com vagas insuficientes", alega Cleber Soares, diretor do Sinpro.
Para a professora de artes aprovada no último concurso Gelli Oliveira, a convocação anunciada pelo Governo do Distrito Federal (GDF) descumpre um acordo de greve. "É muito grave essa notícia de que o governador vai nomear apenas as vagas imediatas, porque o compromisso era chamar também o cadastro reserva", afirma.
A lista de docentes aprovados no último concurso e que aguardam serem convocados é de 3.880 nomes, somando vagas imediatas e cadastro reserva.
A educadora já trabalha para a Secretaria de Educação em regime de contratação temporária, lotada no Centro de Ensino Médio Escola Industrial de Taguatinga (Cemeit), e foi eleita representante da categoria durante a paralisação realizada entre abril e maio deste ano.
"Quando os professores entraram em greve, Ibaneis dava entrevistas falando sobre o prejuízo que é ter professores fora de sala de aula, mas quando nós lutamos por nomeação, estamos lutando por professores dentro da sala de aula e, agora, ele vira as costas para nós", argumenta a professora.
Em nota ao Correio, o GDF disse que "A pasta reforça que está conduzindo todos os procedimentos administrativos necessários para a efetiva nomeação dos aprovados, de acordo com a disponibilidade orçamentária." O orçamento aprovado pelo governo para 2023 prevê a nomeação de 6.200 professores.
Temporários
O sindicalista Cleber Soares explica que os professores temporários deveriam ser convocados apenas em casos de substituição eventual de servidores que estejam afastados por licenças ou para ocupação de cargos como direção ou coordenação. "A rotatividade de professores temporários é sempre muito grande porque eles ganham por hora e não pelo piso. Boa parte desses profissionais não têm a expectativa de continuar no contrato", afirma.
O GDF alega que os professores temporários atuam somente para cobrir afastamentos legais dos professores efetivos, mas o distrital Gabriel Magno diz que a contratação de professores temporários virou a regra e não a exceção no DF, o que pode acarretar na suspensão das aulas.
"Se a lista do concurso de temporários está zerada, quem substitui o substituto? Esses professores estão em tempo integral em sala de aula e vai ter momentos que eles ficam doentes, aí o que acontece é que os alunos ficam sem aula", denuncia o deputado.
Esse foi o caso na família de Isabel Amélia Matias, mãe de Arthur, aluno do 9º ano do Centro de Ensino Fundamental 07 da Ceilândia Sul. Ela conta que desde o início de 2023, a turma do filho vinha sofrendo com os afastamentos da professora substituta de português, devido a atestados.
"Quando faltava uma semana para finalizar o terceiro bimestre, ela entregou um atestado de 60 dias. A coordenação fez uma reunião com os pais e nos disse que se a regional não enviasse outro substituto, todos alunos da série seriam reprovados por falta de nota", lembra.
No fim de outubro, a escola voltou a ofertar as aulas de português, mas Isabel diz que a falta de professores na rede pública de ensino do DF é um problema recorrente. "Isso afeta muito nossos filhos, que no futuro terão que competir por uma vaga nas universidades com alunos da rede privada", defende Isabel.
A professora Gelli argumenta que, além de atrapalhar a qualidade do ensino ofertada pelo educador, o regime de contratação temporária traz prejuízos para o desenvolvimento do trabalho pedagógico ao longo do ano letivo.
"Recebemos o piso, o que faz com que tenhamos um segundo ou até um terceiro emprego, quando não nos vemos obrigados a deixar a escola pública. Estou sobrecarregada e sei que isso atrapalha o projeto político pedagógico da escola e prejudica os alunos, que acabam tendo um vínculo menor comigo", desabafa.
Espera
Arthur Novaes Oliveira leciona há cinco anos em escolas particulares da cidade a disciplina de matemática, uma entre as que mais apresentam carência de professores na rede pública. Aprovado em 38º lugar no último concurso da SEEDF, espera sua nomeação.
"Eu sei que vai ser um desafio, porque o ensino de matemática tem uma defasagem enorme em escolas públicas, mas espero contribuir para diminuir isso", afirma Arthur. O educador completou todo o ensino básico na rede pública e sonha com a chance de voltar para as salas onde se formou: "Acredito que ali posso fazer mais diferença na vida dos meus alunos."
Na visão dele, as condições mínimas que deveria encontrar ao tomar posse seriam uma infraestrutura de qualidade nas escolas, uma equipe pedagógica completa, incluindo orientadores, e uma melhor remuneração.
"O salário de professor do DF já foi um dos mais altos do país, mas hoje está superdesatualizado. A valorização é o que vai manter o professor em sala de aula, e isso passa por ganhar bem", diz Arthur.
Prioridades
Segundo o presidente da CESC, Gabriel Magno, na Lei de Diretrizes Orçamentárias para o próximo ano, a proposta do GDF é fazer 630 nomeações de professores. "Apresentamos uma emenda que aumentava esse número para 6.500, mas ela foi vetada", pontua.
Para ele, o debate de fundo que envolve a questão dos professores no DF é o orçamento da educação. A proposta do governo para a Lei Orçamentária Anual, em deliberação no legislativo local, não cumpre o mínimo constitucional de 25% que deve ser destinado à educação. "Eles fizeram uma manobra fiscal e incluíram o orçamento destinado à universidade distrital nesse percentual, mas esse valor deveria estar fora dos 25%", afirma Magno.
Apesar de ter sofrido um decréscimo na arrecadação deste ano, o GDF se beneficiou de um aumento de 40% do repasse constitucional feito pela União para investimentos em saúde, educação e segurança no Distrito Federal. "Onde foram investidos esses 40% a mais? Não foi na educação", cobra o deputado.