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Ambiente corporativo

Geração Z é menos comprometida com trabalho?

Doutora em comportamento humano, Thaís Giuliani defende que cada geração enxerga o comprometimento profissional a seu modo. Geração Z é mais leal a seus valores do que à empresa

Uma das conclusões trazidas pela pesquisa BetterWork, elaborada pela consultoria Criteria para a empresa de benefícios Betterfly, é que novas gerações tendem a se engajar menos com as organizações que as contratam. "Pela primeira vez na história, quatro gerações convivem no mesmo local de trabalho simultaneamente. Nos chama a atenção a lacuna no comprometimento entre essas diferentes gerações", afirma João Kohn, diretor geral da Betterfly.

Segundo o estudo, colaboradores mais velhos valorizam mais o reconhecimento social, ou seja, fatores como prestígio, orgulho e recomendação. Por outro lado, para millennials — os nascidos entre 1981 e 1996 — e centennials — geração nascida de 1997 a 2010, essas dimensões importam pouco.

Arquivo pessoal - Thaís Giuliani, especialista em comportamento dos genZ

A pesquisa interpretou a baixa adesão a esses valores como um indicativo de menor dedicação, mas Thaís Giuliani, doutora em Tecnologia da Educação pela Universidade Fernando Pessoa, em Portugal, e especialista em comportamento humano, pondera que engajamento pode significar coisas diferentes para diferentes gerações. "Pessoas mais velhas tendem a achar que o jovem deveria abdicar da vida pela empresa, mas eles não veem da mesma forma. Comprometimento é um valor construído a partir do filtro do nosso tempo e do nosso contexto socioeconômico", afirma.

Thaís explica que os profissionais mais velhos que ainda estão no mercado de trabalho, os chamados baby boomers, iniciaram a vida profissional em um cenário de baixa proteção aos direitos trabalhistas, quando a lealdade ao empregador era uma das únicas garantias para a estabilidade financeira. A geração seguinte, que hoje tem aproximadamente 50 anos, viveu o apogeu do mercado workaholic, em que valores como status e sucesso profissional eram culturalmente celebrados.

Arquivo pessoal - Márcio Godinho, 67, ainda está no mercado de trabalho

"Os Ys chegam para mudar isso, porque nasceram em um período estável economicamente. O millennial quer ser feliz no trabalho, se realizar e ter qualidade de vida. Os Zs nasceram em outro mundo, novamente em instabilidade política e econômica, por isso são mais 'pé no chão', querem estabilidade. Mas, se tiverem que escolher, optam pela qualidade de vida, porque essa é uma herança que os millennials deixaram e uma tendência que não vai passar", diz a pesquisadora "É por isso que eles são mais conectados com o propósito do trabalho do que com a empresa. Sua lealdade é para consigo e seus valores."

Márcio Godinho tem 67 anos e ainda está na ativa. Hoje, gerencia sua própria empresa, que presta serviços para projetos de resíduos sólidos em diferentes municípios do país e conta com profissionais de várias idades. Para ele, possíveis conflitos geracionais não partem da falta de compromisso dos jovens com o serviço. "Acho que isso é algo individual, não de geração. Vejo jovens super dedicados, da mesma forma que vejo descompromisso de pessoas mais velhas", afirma.

Arquivo pessoal - Rafaelle Nakaiama, 19, começou seu primeiro emprego

Segundo o empresário, comprometimento "é não deixar a peteca cair, é ter responsabilidade com a parte do trabalho que me cabe, para não comprometer outros colegas e a empresa." Visão que não destoa tanto da de Rafaelle Nakaiama, 19 anos, jovem aprendiz na Confederação Nacional do Transporte (CNT): "Compromisso é saber que o trabalho deve ser sua prioridade naquele momento, durante seu horário. É fazer o que precisa ser feito."

A ênfase de Rafaelle no horário de trabalho, porém, reforça uma característica geracional: mais do que nunca, essa geração de jovens valoriza jornadas reduzidas e flexíveis. "Meu sonho é ter um trabalho que me pague bem e que seja home office", diz.