Da magia do sambódromo à complexidade da escola, o professor de história da arte Robson Salazar, 56 anos, transita entre mundos diferentes, mas que convergem nos projetos idealizados para as escolas onde lecionou e naquela onde hoje ocupa o cargo de diretor.
As referências da escola marcaram a infância do professor, e não apenas por conta da trajetória na educação básica. A família morava numa casa dentro do antigo Colégio Agrícola de Brasília, em Planaltina, onde hoje funciona um dos câmpus do Instituto Federal de Brasília (IFB). À época, o pai era servidor do Ministério da Educação.
Filho de um goiano e de uma mineira que, como tantos outros candangos, construíram a capital do país, nasceu no Hospital de Sobradinho — à época uma edificação de madeira, conforme contavam os pais. "Acreditaram na cidade sonhada e idealizada", resume Robson, caçula entre os homens de um total de oito filhos.
O pai, servidor do Ministério da Educação, era também artista e foi uma das inspirações para a escolha da carreira. "Principalmente para a área da arte. Meu pai tinha um grande talento com desenho e foi inspirador para mim nesse sentido", relembra.
Ainda menino, Robson se mudou com a família para Sobradinho, cidade em que mora até hoje e onde cursou toda a etapa básica da educação em escolas públicas.
"Minha infância foi como a maioria dos jovens da época: as brincadeiras de rua, os sonhos… E viver numa cidade que era muito tranquila. Sobradinho tem essa peculiaridade, de ser uma cidade serrana, mais calma", relata.
Encontro com Dulcina
A formação nas artes não poderia ter tido início mais brilhante. Robson foi aluno de ninguém menos que Dulcina de Moraes, na última turma em que ela lecionou antes de morrer. Era o curso de artes visuais, ofertado na faculdade que leva o nome da atriz, no Conic. "Era uma pessoa incrível, as aulas dela eram incríveis. Não eram aulas: eram conversas, trocas de experiências. Foi um privilégio", diz Robson, que recorda ainda da professora sentada na sala, tomando um chá e contando suas histórias.
Em 1997, Robson começou a carreira de professor de história da arte na rede pública de ensino do DF, e atuou principalmente com turmas de ensino médio. Ele considera a educação e a cultura seus pilares profissionais. "Sempre trabalhei na educação, e procurando fazer essa associação da valorização da cultura, estimulando a construção da identidade cultural e acompanhando e incentivando os movimentos culturais tanto na escola quanto na cidade", afirma Robson, que atuou também como gerente de Cultura na Administração de Sobradinho e se especializou em história da arte na Escola de Belas Artes.
Desafio duplo
A chegada à escola atual, o Centro de Ensino Fundamental 3 de Sobradinho, representou um duplo desafio. Primeiro, porque Robson nunca havia trabalhado com estudantes nessa faixa etária. E, logo depois, foi convidado a formar uma chapa para concorrer à direção da escola, no processo eleitoral da gestão democrática da rede pública.
"Quando eu assumi o desafio de entrar na direção de uma escola (em 2017) percebi que tinha de fazer algo diferente. Ao trabalharmos com projetos culturais o estudante fica mais motivado. Temos atuado nessa perspectiva, de fazer uma associação das atividades culturais com a educação, incentivando e valorizando novos talentos", destaca o professor.
O resultado pode ser visto em números. O Índice da Educação Básica (Ideb) — indicador que reúne resultados sobre fluxo escolar e as médias de desempenho nas avaliações — subiu de 4,7 para 5,6 e colocou o CEF 3 entre as três escolas de anos finais do ensino fundamental mais bem colocadas no DF e a de melhor desempenho em Sobradinho.
Para Robson, o sucesso se deve justamente à ação integrada. "A escola tem que contribuir na formação de público. Ela precisa fazer formação de plateia e dar acesso às áreas culturais e artísticas. Não pode ficar na perspectiva apenas de ensino didático e formal. Tem de oferecer a oportunidade de despertar nele talentos e vocações, principalmente na área artística. Fazer com que a escola tenha essa pegada contribui com a socialização dos alunos", reflete.
"Eu nunca vi coisa mais bela"
A expressão da face artística na vida de Robson fica ainda mais evidente nas avenidas percorridas por suas duas escolas de samba do coração. Em Brasília, é a Acadêmicos da Asa Norte, atual campeã do carnaval da capital, que faz bater mais forte dentro do peito. O professor é carnavalesco na agremiação.
Já no Rio de Janeiro, aflora a paixão pela Portela, escola em que integra a equipe de composição. No recesso escolar do início do ano, Robson vai à capital carioca ajudar a organizar o desfile. Quando chega o carnaval, ele volta e dá apoio ao departamento cultural d'A Majestade do Samba.
Grata surpresa
Antes de chegar à atual escola, Robson semeou a arte em projetos desenvolvidos ao lado de outros professores nas escolas por onde passou. Um dos que recorda com carinho, já que se tornou regular e há mais de uma década ocorre em edições anuais, é o Mandacaru, do Centro de Ensino Médio 4 de Sobradinho. A ação é voltada para um dos segmentos mais desafiadores da educação básica: a educação de jovens e adultos (EJA). "Virou uma grande referência de valorização da cultura popular e nordestina", celebra. "A escola chegou a ser premiada com esse projeto."
O objetivo dos estudantes envolvidos na iniciativa é organizar uma celebração à luz da cultura nordestina. São pensadas atrações e uma programação cultural e artística completa. O envolvimento de estudantes em geral desestimulados pelo cenário complexo que os envolve — defasagem idade-série, estudo à noite e muitas vezes aliado ao trabalho, entre outros — foi o que mais surpreendeu o docente que, depois de mais de 20 anos na profissão, percebe a força do trabalho que exerce.
"Quando se descobre o valor (da educação) e a possibilidade de contribuir com o processo de transformação dos estudantes, a gente percebe que a educação é o caminho", destaca o professor. "Convivemos com os estudantes e aprendemos muito mais com eles do que pensamos. O aprendizado se faz com essa relação que construímos. E esse processo é fascinante exatamente porque você vê a transformação, vê o ser humano evoluir", conclui.