Diversidade, equidade e inclusão no mercado de trabalho são assuntos que ficaram por muito tempo restritos a 'bolhas', mas agora incendeiam os debates sobre a empregabilidade. E isso não é diferente no segmento de tecnologia e inovação, onde as ofertas de vagas em meios digitais estão mais pujantes do que em outras indústrias. É o que mostra o WebSummit Rio 2023, o maior evento mundial sobre inovação, internet e tecnologia, que ocorre esta semana no Rio de Janeiro, em sua 1ª edição fora da Europa.
Ayo Tometi, a cofundadora do Black Lives Matter (em português, Vidas Negras Importam), fez um alerta muito claro assim que pisou no palco principal do encontro na terça-feira (2/5): "Vivemos em uma sociedade racista e isso impacta a tecnologia. Quem codifica importa, e como codifica importa. Não existe tecnologia neutra. Nos processos de desenvolvimento tecnológico não pode haver neutralidade e é preciso ampliar a representatividade", ressaltou a ativista internacional diante de uma plateia com milhares de pessoas, de imensa maioria branca.
O movimento ativista Black Lives Matter explodiu há 3 anos com a morte de George Floyd, nos Estados Unidos, e se espalhou pelo mundo. "A tecnologia tem de ser criada com as pessoas negras em mente. Nós sabemos o que está acontecendo com a tecnologia por resultados, pois aqueles que estão por trás dela têm seu sistema de valores e o aplica ali", continuou ela. "Muitas vezes a tecnologia não conta com a rede de representatividade. Exemplifico falando da tecnologia no sistema de saúde, que muitas vezes não estabelece diferença alguma para pessoas não brancas", reforçou Ayo Tometi.
Pluralidade e suas múltiplas faces em debate
Raça, gênero, idade, escolaridade, orientação sexual estão entre as abordagens sobre diversidade na indústria tecnológica, ocupando espaço na arena Senac do WebSummit Rio. Ao longo das palestras e debates nesse palco, há sempre uma disputa acirrada por lugares na plateia, o que mostra a relevância que o assunto ganhou na sociedade.
É ali que a ativista brasileira Cris dos Prazeres, criadora do movimento 'Vai na Web', demonstrou como jovens de classes CDE do Morro dos Prazeres, Complexo do Alemão e Rocinha, no Rio, estão extrapolando as restrições educacionais para ganhar espaço na indústria da tecnologia. Hoje eles são 1,5 mil, todos inseridos em projetos reais.
A 'Vai na Web' atua como uma startup de educação continuada, com parceiros econômicos de peso como o BTG Pactual e o PagSeguro. "Saímos de camadas profundas para o lugar da reflexão e posso dizer a vocês quão talentoso é o jovem brasileiro que está em vulnerabilidade. O letramento digital, que é uma facilidade tremenda para ele, acaba sendo a porta de entrada para consolidar a oportunidade profissional", exaltou Cris. "E o próprio patrocinador se torna cliente e vem me dizer: eu quero esse menino, essa menina criando soluções na minha empresa"!
De aprendiz a mentor
Não raro, esse jovem letrado em tecnologia é convertido em mentor da população acima dos 50 anos. Seja em uma comunidade, seja em uma empresa. "As empresas que estão performando melhor no mercado fazem melhor a transição geracional", avaliou a head hunter internacional Mariana Reis, que compartilhou uma série de dicas para contratações consonantes com a diversidade (leia abaixo). "Hoje o que a gente fala é da mentoria reversa. E quando a gente pensaria em ter um mentor mais novo ensinando quem tem mais idade? Ora, para ser mentor, não interessa a sua idade, interessa é sua vivência", afirmou Mariana.
Ione Coco, presidente do MCIO Brasil, uma associação sem fins lucrativos que visa ampliar a representatividade feminina no mercado de tecnologia, lançou um olhar inverso a essa abordagem.
"E o que acontece quando mulheres que passam 20 anos em uma empresa e são demitidas? Elas perdem o 'sobrenome'. É esse o momento em que temos de trazer a mentoria para levantar a pessoa. É uma carreira de oportunidades, não desista!", provocou ela. "Só 20% da área de TI são mulheres e, destas, 30% chegam a uma posição gerencial. A gente quer equidade, então, se somos 52% da população brasileira, queremos 52% de mulheres em posição gerencial".
Dicas para contratações com diversidade
1) Você tem de se perguntar: quer de fato perfis inovadores em sua empresa? "Vamos parar com hipocrisia! A diversidade vai te trazer novas provocações e a provocação nem sempre nos dá conforto. A equidade de raça, gênero, idade, orientação sexual, enfim, traz sempre a provocação".
2) Se pergunte também: "Você está induzindo sua equipe a ser inovadora? Alguém de sua equipe está inovando"?
3) Faça a entrevista por competência, que é mais justa. O processo seletivo tem de ser focado 100% em competência. Ex: Receba currículo sem foto nem idade. Hoje o que precisa é ter: nome, cidade, estado, e-mail, telefone e Linkedin.
4) O processo de contratação tem de ser alinhado com a representatividade. "Não adianta querer várias e várias línguas, intercâmbio feito, se queremos contratar com representatividade".
5) Diversificar os canais de divulgação da vaga para fazer parcerias também.
6) O que não deveríamos perguntar a uma mulher: Tem filhos? É casada? Com quem vai ficar o filho? "Isso não é só bandeira da empresa, é bandeira para todo mundo".
7) Entenda: do dia para a noite, não se pode aprender uma habilidade comportamental. É muito mais fácil aprender habilidade técnica (como o inglês) do que a comportamental (a ter o jogo de cintura, por exemplo).
Você sabia? Diversidade também é lucro
Pesquisa da McKinsey na América Latina comparou dados de gênero e financeiros e detectou: companhias com pelo menos uma mulher em seu time de executivos são mais lucrativas - têm 50% + chance de aumentar a rentabilidade e 22% de crescer a média da margem de lucro (Ebtida). Fica mais uma Dica!