Eu, Estudante

Pretos no topo

'A preta do morro se formou'

Filha de faxineira, Bruna Barbosa supera preconceitos e se gradua em enfermagem em uma faculdade predominantemente branca

Filha de mãe solteira faxineira, negra e criada na periferia, a estudante carioca Bruna Barbosa, 24 anos, graduou-se recentemente em enfermagem na Faculdade de Ciências Médicas da Saúde, em Juiz de Fora (MG), pelo Fundo de Financiamento Estudantil (Fies). Segundo ela, durante todo o período em que esteve na instituição havia “poucos pretos, e quase todos na equipe de limpeza”. 


Bruna, que sempre estudou em escola pública, conta que sua trajetória durante a vida escolar, em Três Rios (RJ), foi marcada por uma série de obstáculos, a começar pelas dificuldades financeiras, além de depressão e um ano inteiro sem aulas, no fim do ensino médio, em 2016, devido a uma greve na rede estadual de ensino. “Foi superdifícil, onde moro é quase uma favela, com muitas pessoas carentes, tráfico de drogas e falta de saneamento básico.”


Decidida a realizar seu sonho, ela contornou a greve se matriculando em um cursinho social de pré-vestibular. “Estava muito desiludida, mas não pretendia abrir mão da minha meta de ingressar na área de saúde”, diz Bruna, que chegou a ser aprovada, também em enfermagem, na Universidade Federal Fluminense em Rio das Ostras (RJ), onde chegou a estudar três meses, mas a distância a impediu de prosseguir os estudos. “Era muito doloroso ficar longe de casa e, acima de tudo, muito caro”.


A formação em Minas Gerais também não foi fácil: depois de um dia inteiro trabalhando como secretária em uma clínica de fisioterapia, era preciso ir para a faculdade. A pandemia e as aulas remotas intensificaram as dificuldades. "Era uma verdadeira maratona”, relata.


Os sacrifícios, no entanto, foram compensados. Hoje, Bruna se sente uma vencedora. "E muito feliz. Por mais que a conta tenha sido alta, valeu a pena conquistar o diploma, coisa que a maioria das pessoas negras não consegue. Venci os preconceitos. A preta do morro se formou", comemora. A maior conta, revela, foi a dívida contraída no Fies, de R$ 80 mil, que deverá ser quitada em 2025. A jovem sonha fazer especialização no Canadá. Antes, pretende fazer residência em Juiz de Fora, Belo Horizonte ou no Rio de Janeiro.


Inspiração

Chamou a atenção da estudante, durante a sua graduação, o fato de as turmas serem compostas, em sua maioria, por pessoas brancas. "Observei que os cursos da área da saúde são muito embranquecidos, e isso me doía", diz. Um dia na faculdade, ela foi abordada por uma faxineira negra que disse que a observava havia algum tempo. "Ela me parou na escada e externou seu orgulho de me ver estudando ali. Isso me tocou e me encorajou a me destacar nos estudos, seguir até o fim", conta.
A mãe de Bruna, Lucinete, 50, que sobrevive com um salário mínimo mensal trabalhando em uma escola e em casas de família, complementando a renda vendendo calcinhas produzidas nas horas vagas, não esconde o orgulho e a felicidade da filha. "Quantas vezes ouvimos, ao ir pra casa, que ela era uma preta do morro, filha de mãe solteira, que não daria em nada na vida, mas ela provou que é uma grande vencedora e merece tudo de bom que a vida possa oferecer."


ELEIÇÕES 2022
Torcida pela diversidade

Flora Egécia/Divulgação - .

Em se tratando de raça e gênero, o perfil dos candidatos do Distrito Federal nas eleições deste ano é bem parecido com o do cenário nacional. Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), considerando as candidaturas aptas em todo o país, 34% são de mulheres, 35% de pardos e 14% de pretos. Os números da capital federal são 35%, 38% e 14%, respectivamente. Um recorte mais detalhado dos dados do DF mostra uma taxa expressiva para os cargos de deputado distrital (64% se declaram pretos) e de deputado federal (28% fizeram o mesmo). Analistas têm destacado que esses perfis de candidatura bateram recorde neste ano. A torcida é para que os resultados do pleito representem, de fato, a diversidade brasileira.

Reconhecimento

Marri Nogueira/Agência Senado - .

Dione Moura, uma referência

Dione Oliveira Moura, diretora da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (UnB), é a vencedora da categoria pesquisadora sênior do Prêmio Adelmo Genro Filho 2022. Criada em 2004 pela Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo, a premiação visa reconhecer a qualidade dos trabalhos acadêmicos pelo país, valorizando a atuação individual dos pesquisadores. Dione foi escolhida, por unanimidade, pela trajetória acadêmica de excelência e pelas contribuições para consolidar o jornalismo como área científica. E a professora merece mais aplausos: o trabalho incansável em defesa das cotas e a assistência a alunos com problemas de saúde mental também são fontes de inspiração.