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superação

Estudante tetraplégica se forma em medicina na Unioeste

Primeira tetraplégica a se formar em medicina no país, Elaine dos Santos concluiu o curso se comunicando com os olhos

Esperança, resiliência e garra são algumas características presentes em todas as pessoas que conseguem realizar feitos grandiosos, seja nos estudos, seja na carreira. E a paranaense Elaine Luzia dos Santos não foge à regra. Aos 33 anos, ela provou ser capaz de vencer qualquer obstáculo e se notabilizou como a primeira tetraplégica a se formar em medicina no país, feito alcançado na Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste). A habilidade desenvolvida para receber o tão sonhado diploma consiste na técnica de comunicação com professores e colegas apenas mexendo os olhos.

Já formada em Farmácia na mesma instituição, a paranaense começou a cursar medicina em 2012. No entanto, após três anos, Elaine sofreu um acidente vascular encefálico gravíssimo, que a fez perder os movimentos de todos os membros e também a fala. A estudante passou a contar apenas com a visão, o que bastou-lhe para prosseguir firme nos estudos.

Dificuldades

Depois do derrame, Elaine mudouse de Diamante D’Oeste, sua cidade natal, para a vizinha Cascavel, no Paraná, para dar seguimento aos tratamentos, sempre decidida a prosseguir os estudos. “Não queria abrir mão do sonho de me tornar médica. Foi um sonho de criança que nutri até a vida adulta. Minha motivação para continuar foi o desejo de poder cuidar das pessoas. A motivação é algo intrínseco ao sonho. Simplesmente, o encanto que eu tenho pela ciência é que faz o esforço valer a pena”, afirma.

A recém-formada relata que não esperava ter tido sequelas tão graves, que afetassem toda a sua rotina, por toda a vida. Achou que iria, aos poucos, recuperar a fala e os movimentos. “Essa percepção de que as coisas tinham mudado para sempre foi internalizando aos poucos e, com certeza, tive momentos de hesitação, principalmente se conseguiria prosseguir os estudos. Eu sentia vontade de continuar, ao mesmo tempo em que percebia que os obstáculos seriam inúmeros. E nem tinha ideia de como iria superá-los.” Porém, graças à sua força de vontade e com o apoio da universidade, veio a alternativa viável.

Esperança

Arquivo Unioeste - Elaine com os pais, Josué e Dalva: "Apesar da vida ter momentos difíceis, não significa que nunca mais seremos felizes"

A universidade incluiu a aluna no Programa de Educação Especial (PEE) para que ela pudesse prosseguir nos estudos em meio às suas dificuldades motoras. Com a ajuda de uma pedagoga especializada, Elaine obteve suporte suficiente para atingir sua meta. “Foi uma longa relação com os profissionais do PEE. A rotina de estudos teria sido mais difícil sem eles”, afirma Elaine. Ivã José Pádua, coordenador do programa durante a permanência de Elaine no curso de medicina, conta que se sentiu valorizado pelo trabalho desenvolvido por sua equipe. “Elaine tem uma mente brilhante em um corpo paralisado. Foi um processo tranquilo”, afirma.

Ivã conta que Elaine não sentia dificuldade em compreender as matérias, assim como projetos realizados pela classe, o que motivava ainda mais a equipe a auxiliá-la no que fosse necessário para concluir os estudos. Para o ex-coordenador do programa, o trabalho realizado com a acadêmica é motivo de celebração e também de conscientização. “Com esse trabalho a gente mostra o valor das universidades públicas no processo de formação dos diversos tipos de alunos. É preciso mostrar que todas as instituições podem e devem oferecer suporte aos alunos com deficiência, para que eles tenham as mesmas condições em relação aos demais”, diz.

Para prosseguir nos estudos, estruturas do câmpus foram adaptadas e até uma sala especial foi montada. Além disso, os processos de avaliação foram remodelados, seguindo legislação própria para alunos em condições especiais. Aos poucos, Elaine foi sendo inserida em cada matéria e tirando de letra uma a uma.

Com a ajuda de uma espécie de tradutor, Eliane se comunica com um olhar, uma piscada, ou mesmo com um movimento sutil. Além dos professores e colegas de turma, pacientes, parentes e amigos aprenderam a traduzir o que significa cada gesto. Nos procedimentos com os pacientes demostrou total capacidade para descrevê-los e seu desempenho e avaliações foram bastante elogiados.

Sucesso

Agora formada, Elaine relembra todos os desafios enfrentados por conta de suas limitações, do transporte às sessões de fisioterapia e fonoaudiologia, a quantidade de cuidadores que necessitava, entre outras exigências. Porém, agora formada, ela percebeu que nada do esforço foi em vão, tanto por parte de sua família quanto dos profissionais envolvidos na realização dessa conquista. Ela também não deixa de lado o orgulho e a alegria que sente em ser uma inspiração para outras pessoas: “Penso que sou muito vitoriosa. Sinto que essa conquista pode incentivar outras pessoas a buscarem as suas realizações pessoais. Apesar da vida ter muitos momentos difíceis, isso não significa que nunca mais seremos felizes”, ensina.

Elaine tem consciência de que o futuro ainda é incerto, mas confessa que tem outra meta: se especializar em radiologia. No entanto, descarta outras possibilidades, como auditoria médica (utilizada para avaliar contas ou processos antes, durante e depois de sua fase de implementação, e ainda contribui para a saúde financeira do negócio) ou pesquisadora. Para Ivã Pádua, esses planos têm relação direta com o esforço e superação de Elaine, além de uma gama de auxiliares que agiram para que isso se tornasse possível. E a gratidão não tem como ser maior para ela: “Nesses anos tive a oportunidade de conhecer pessoas incríveis, que me auxiliaram imensamente, e agradeço diariamente por elas terem cruzado o meu caminho. Mesmo que pareça distante e inalcançável, surgem pessoas para te ajudar, de onde menos se pode esperar”, comemora.

 

*Estagiário sob a supervisão de Jáder Rezende