A Fundação Getúlio Vargas (FGV) foi denunciada no Ministério Público Federal pela alteração do local das provas do concurso do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), um dos mais concorridos do país. As provas seriam aplicadas apenas em Brasília, mas, para alguns candidatos, foram transferidas para municípios vivinhos. O exame ocorre em 29 de maio. A FGV contesta a denúncia e afirma que a alteração dos locais das provas estava prevista no edital do concurso.
A ação foi aberta, em sua maioria, por candidatos de outros estados. De acordo com os proponentes da denúncia, ao realocar os candidatos, a banca organizadora da FGV atentou contra o direito à isonomia, previsto na Constituição Federal. A FGV argumenta que essa nova organização ocorreu devido ao volume de candidatos inscritos. Alega ainda que Brasília não comportaria os 132.463 inscritos.
Porém, diversos inscritos argumentaram que a divisão, além de ter sido feita com um mês de antecedência, não obedeceu a critérios justos junto a candidatos de outros estados. Com a nova decisão, os residentes no DF farão as provas na capital do país; os de Goiás foram divididos entre DF, Valparaíso e Goiânia; os de Minas Gerais entre o DF e Goiânia; e os dos demais estados foram remanejados para Goiânia.
Na ação, os candidatos que se sentiram prejudicados alegam que a mudança beneficiou os moradores da capital federal e prejudicou os que planejaram viagem para Brasília com antecedência. Por meio de nota, a FGV afirma que a alteração dos locais das provas estava prevista no edital do concurso.
Desvio no trajeto
Uma das autoras da denúncia foi a advogada Ana Carolina Silva, 34 anos. Ela reside em Porto Alegre (RS), onde foi servidora pública do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, como oficial escrevente, e planejou a viagem para Brasília com três meses de antecedência.
Ana Carolina conta que se preparou para o concurso por dois anos. Ela afirma que tinha o hábito de verificar a publicação dos editais, mas só soube da mudança local de prova em 10 de maio, poucos dias antes do exame. Agora, ela precisa remarcar a viagem para Goiânia. A candidata conta que entrou em três grupos de redes sociais sobre o concurso para encontrar pessoas na mesma situação, arregimentando 45 para a engrossar a ação. "Muitos desistiram de fazer a prova. Alguns disseram que ficaram muito abalados", diz, lembrando que tentou ainda a possibilidade de alterar a passagem e a hospedagem, porém, os valores estavam bem mais elevados.
O MP está agregando todas as denúncias para facilitar a análise. “Isso é bom, porque o processo não foi arquivado. Mostra que eles estão investigando”, ressalta Ana Carolina, afirmando que pretende mover uma ação individual indenizatória.
“A falta da isonomia é um dos princípios pilares da Constituição. Os candidatos que não residem no Distrito Federal foram preteridos. Se houvesse critério isonômico, eles iriam fazer por ordem alfabética ou por inscrição”, reclama. “Estou pensando em desistir, porque é um desgaste absurdo. Tanto financeiro quanto emocional”, completa. Ela conta que foi aprovada em outros concursos, mas sonha em trabalhar em Brasília em função da qualidade de trabalho.
“Não foi por falta de experiência que eles criaram essa situação. Nesse caso, foi discrepante a distância entre Brasília e Goiânia. Os 208 quilômetros que separam as cidades não podem ser caracterizados como próximo", afirma.
Breno Ramalho, 21, foi mais um a protocolar ação individual no MP. Ele mora no Rio de Janeiro e pretende estudar direito na Universidade de Brasília (UnB). Ele lamenta que sua primeira experiência em concurso público não está sendo das melhores. "Passei dois anos numa rotina de estudos constante, mas, devido ao transtorno da mudança de local de prova, não consigo mais me concentrar como antes”, diz.
Na tentativa de realizar a prova em Brasília, o jovem, que tem dupla residência, no DF e no Rio de Janeiro, entrou com uma ação na tentativa de fazer a prova em Brasília, mas o processo foi arquivado, pois ele recorreu à Justiça Federal e não à Estadual, como deveria. "Mas não vou desistir. Vou tentar novamente", afirma. “Não conheço ninguém em Goiânia e os hotéis são muito caros. Não tenho onde ficar. Além disso, não encontrei quase nenhum ônibus de volta para Brasília. É muito ruim de horário”, conta.
Leia a nota da FGV na íntegra
"A FGV informa que as reclamações não têm razão de ser, pois o próprio edital que lançou o concurso e que trouxe as condições e informações do certame para todos os interessados esclareceu, previamente, no subitem 2.4, que 'Caso o número de candidatos inscritos exceda a oferta de lugares existentes na unidade federativa elencada no subitem 2.3, a FGV se reserva o direito de alocá-los em cidades próximas para aplicação das provas, não assumindo, entretanto, qualquer responsabilidade quanto ao deslocamento e à hospedagem desses candidatos”. O Concurso do TJDFT atingiu o elevado número de 132.463 candidatos, não havendo, em Brasília, salas suficientes para acomodação dos candidatos com a segurança necessária, o que levou a ser definido que moradores de Goiás farão as provas em Goiânia e Valparaíso, não havendo, portanto, alteração nos locais de prova e sim definição com base no edital. Além disso, as alegações de compra de passagens e gastos antecipados não podem ser atribuídos a organização do concurso, seja porque houve até maior facilitação para o candidato, seja porque havia previsão editalícia também no sentido de que 'É de inteira responsabilidade do candidato acompanhar a publicação de todos os atos, editais e comunicados oficiais referentes a este Concurso Público, divulgados integralmente no endereço eletrônico https://conhecimento.fgv.br/concursos/tjdft22'. Todas estas informações estão sendo apresentadas ao MPF, que não ajuizou ação e sim encaminhou ofício requerendo esclarecimentos.”