Capacitação

Formação técnica possibilita maior chance de emprego e carreira

Jovens que cursam o ensino técnico têm 81% mais chance de emprego, além de maior possibilidade de permanência e ascensão nas empresas

Arthur Vieira*
postado em 27/03/2022 06:00 / atualizado em 27/03/2022 06:00
Pedro Henrique, Thyene e Ellen conciliam o ensino médio com o técnico e afirmam que a segunda modalidade garante melhor preparo para o mercado e a vida -  (crédito: Carlos Vieira/CB/D.A.Press)
Pedro Henrique, Thyene e Ellen conciliam o ensino médio com o técnico e afirmam que a segunda modalidade garante melhor preparo para o mercado e a vida - (crédito: Carlos Vieira/CB/D.A.Press)

Jovens com ensino técnico têm mais chance de conquistar o primeiro emprego, além de maior possibilidade de ascensão profissional em relação aos que cursaram o segundo grau convencional, revela a pesquisa “Inclusão produtiva de jovens com ensino médio e técnico-profissional: experiência de quem contrata”. Além de mapear e entender a percepção das empresas quando o assunto é a inserção de jovens no mercado formal, o estudo mostra que a contratação de pessoas qualificadas na faixa etária de 18 a 27 anos está cada vez mais difícil.

A pesquisa indica que a taxa de empregabilidade de estudantes que cursaram o ensino técnico é 81,1%, maior em relação aos que possuem o ensino médio (76,8%). Retrata ainda que os cargos de nível médio são mais ocupados pelos que têm ensino técnico, com taxa de 24,8%, diferença considerável em relação aos estudantes que cursaram o convencional (10,2%).

Além disso, metade dos jovens com ensino médio completo trabalha no comércio ou em ocupações de menor valor agregado, ou seja, a formação técnica possibilita, consideravelmente, a inserção em serviços mais “sofisticados”, como na área de tecnologia. Nesse quesito, a chance de contratação para quem tem curso técnico é de 59% contra 51,4% para quem cursou o médio convencional.

Realizada pela Fundação Roberto Marinho, Itaú Educação e Trabalho e Arymax, a pesquisa constata que, no processo de contratação de grandes empresas, o diploma de curso técnico é o principal diferencial na avaliação do currículo para preenchimento de vagas. No entanto, levam-se em conta as habilidades comportamentais, mesmo que seja preciso melhorar o conhecimento específico para a função.

Desafio

A permanência e evolução de jovens nas empresas são também fatores relacionados diretamente à apresentação de diploma de curso técnico, afirmaram 42% das empresas, enquanto 61% delas disseram que detêm em seus quadros algum gestor com formação técnica em nível médio

Embora a perspectiva no mundo do trabalho para os jovens com ensino técnico seja positiva, a contratação deses profissionais constitui ainda um grande desafio para as empresas. O estudo revela que 71% das empresas afirmaram que usam o mesmo tipo de processo seletivo para diferentes níveis de profissionais.

A maioria das empresas (52%) também considera a experiência na função como fator preponderante na contratação. Seis em cada dez empresas afirmaram que o curso técnico completo é um grande diferencial para a contratação de jovens e que a falta de qualificação técnica e de experiência constitui um dos maiores obstáculos para a contratação, depois de fatores socioemocionais.

Ainda de acordo com o estudo, a falta de profissionais com nível técnico leva 53% do setor produtivo a oferecer formação prática, por meio de treinamento ou vagas de estágio. Já no momento da contratação, 45% delas afirmaram preferir “indicações” e 22% os “sites de vagas”, fatores que representam um grande obstáculo para inserção de jovens com maior vulnerabilidade social.

Além de gerar dados para formulação de políticas públicas, a pesquisa alerta para a necessidade de interação entre governos municipais, estaduais e empresas para que se esclareça as demandas reais, sobretudo no tocante à ampliação da oferta de cursos técnicos, observa a responsável pelo programa de parcerias estratégicas da Fundação Arymax, Natália Leme.

 

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. (foto: Reprodução)

“O problema é interligado. Essa conexão entre o setor produtivo e as escolas de ensino técnico é fundamental para a inclusão de jovens no mercado”, diz. “Não adianta olhar só para a educação sem ver o que o setor privado precisa fazer”, completa, lembrando que cada local tem a sua vocação econômica. “É imperativo que haja um plano articulado entre estados e prefeituras, não apenas com o governo federal”, diz Natália.

Ela observa ainda que o jovem que conclui o ensino médio e não acessa o superior enfrenta grandes desafios no mercado de trabalho. A pesquisa mostra que os que fazem apenas o ensino médio passam mais tempo desocupados, acessam menos vagas formais de emprego, têm ocupação baixa e menor remuneração. Revela também que tanto para a maioria dos jovens quanto as empresas, a falta de qualificação é uma grande barreira.

Comportamento

A defasagem de conhecimento e informação comportamental são também fatores preocupantes, segundo a especialista. De acordo com a pesquisa, enquanto a maioria das empresas garantem informações técnicas, apenas 3% se preocupam com questões comportamentais. O resultado é o percentual alarmante de demissões de jovens (77%) por motivos comportamentais. “A capacidade técnica deve vir junto com a comportamental para garantir maior produtividade”, avalia.

De acordo com a assessora de pesquisa e avaliação da Fundação Roberto Marinho, Rosalina Soares, o fato de a taxa de ocupação de jovens com ensino técnico completo ser maior em relação aos que possuem somente o ensino médio tem relação direta com outras habilidades que fogem aos conhecimentos específicos da profissão. “O pessoal com formação técnica adquire habilidades comportamentais exigidas no mercado de trabalho, faz com que eles sejam aceitos mais rapidamente”, explica.

Ela alerta ainda para o fato de Chance maior de que muitos jovens saem do ensino médio com conhecimentos inferiores aos que passam pelo técnico, e que isso reflete na taxa de empregabilidade. Segundo Rosalina, a implementação do novo ensino médio foi fator decisivo para a execução da pesquisa. “Entre as mudanças estabelecidas no novo modelo, destaca-se a criação dos itinerários formativos, que permitem ao estudante direcionar seus estudos a uma área do conhecimento específica ou à formação técnica. Tivemos a preocupação de qualificar o debate sobre oportunidades de inclusão dos jovens no mercado, assim como dar mais informações sobre o mesmo”. Outro fator apontado na pesquisa é a possibilidade de contribuição com a previdência social. Os que detêm ensino técnico apresentam 72,7% nesse quesito.

A gerente de gestão e conhecimento do Itaú Educação e Trabalho, Carla Chiamareli, observa que a pesquisa aponta caminhos para ampliação do ensino técnico no país, assim como para mostrar às empresas a importância dessa modalidade. “O modelo vigente de ensino médio não prepara o jovem de forma plena para o mercado, ao contrário do ensino técnico. O currículo é o diferencial. O técnico garante maior maturidade para o jovem, além de uma base mais sólida sobre o mercado de trabalho”, explica.

Segundo ela, por meio do ensino técnico o jovem encontra sua vocação, assim como a realização pessoal. Ela defende que a modalidade não precisa conduzir o jovem a uma renda imediata, mas para um preparo mais qualificado para o ensino superior, tanto intelectual quanto financeiro. “A gente não enxerga a formação técnica como fim em si mesma. Ela é uma etapa”.

Ponte para a realização de sonhos

As matrículas no Ensino Técnico podem ser motivadas por fatores como a busca por um emprego imediato, impulso para ingressar no ensino superior ou aprendizados importantes da vida em sociedade. Mas as oportunidades são inúmeras, e as visões de futuro de cada estudante únicas, como é o caso de Thiemy Lacerda, Ellen, e Pedro Henrique, estudantes do ensino médio no Serviço Social da Indústria (Sesi), no Gama. Eles complementam os estudos com o curso técnico de eletrotécnica no Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai).

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. (foto: Carlos Vieira/CB/D.A.Press)

Thiemy

Para Thiemy Lacerda, 16 anos, de Valparaíso (GO), o interesse pelo curso técnico se deu pela vontade de obter aprendizado prático sobre eletrotécnica e também para garantir maior preparo para seguir no ensino superior. Embora o curso técnico esteja distante da carreira que pretende seguir, uma vez que deseja cursar direito e se tornar delegada federal, Thiemy espera que essa modalidade seja de grande valia em sua vida profissional, principalmente por conta da prática de convivência e trabalho em equipe. “Como a gente trabalha muito manualmente, costumamos estudar em grupo. Isso gera uma interação e vivência com outras pessoas”, diz.

Ela defende que o ensino técnico seja implementado em todas as escolas, fazendo com que os estudantes se preparem melhor para o mercado de trabalho, não só pelo aprendizado técnico profissionalizante, mas também pelo preparo psicológico que é oferecido, independentemente do curso escolhido. “Aqui, a gente se prepara muito para o futuro, de forma séria, com foco no trabalho. Existe uma diferença muito grande entre sair do Senai com um curso profissionalizante e concluir o ensino médio e ir direto para o mercado de trabalho”, conta.

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. (foto: Carlos Vieira/CB/D.A.Press)

Ellen

Ellen Paula, 16, escolheu entrar no ensino técnico por influência de familiares, principalmente de sua tia, que, como ela, também optou por cursar eletrotécnica. Na escolha do curso, pesou também a questão financeira, não só para conquistar a tão sonhada independência, mas também para garantir seus estudos no futuro. Ellen conta que já tem um grande plano pela frente para sua carreira: estudar cinema no exterior e se tornar uma diretora e roteirista. Além disso, ela revela que foi motivada pela irmã caçula, Eloísa, de 4 anos, com a qual é muito unida e preocupada. “Eu quero que minha irmã tenha maior tranquilidade e oportunidades. Mais do que eu estou lutando para alcançar”, declara.

Ellen reconhece que o ensino técnico representa uma grande possibilidade de futuro para quem não quer fazer faculdade ou deseja trabalhar antes de ingressar no ensino superior, como é o seu caso. Para ela, o ensino técnico está sendo um período de descobertas. “Desde o primeiro ano a gente aprende bastante coisa, seja sobre autoconhecimento ou administração, o que nos aguarda no mercado de trabalho”, relata, afirmando que a atração pelo ensino técnico reside na possibilidade de aplicar na prática o que se aprende em sala de aula. “A gente entende o que está fazendo e o que está sendo ensinado. O curso técnico nos ajuda muito, no lado pessoal, intelectual e social, pois a gente consegue conversar melhor com as pessoas. E conhecer pessoas é uma das coisas que mais dão oportunidades para crescermos na carreira”, diz.

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. (foto: Carlos Vieira/CB/D.A.Press)

Pedro Henrique

Pedro Henrique Alves, 16, de Santa Maria, também não vê na eletrotécnica seu principal objetivo. Contudo, ele afirma reconhecer a importância do ensino técnico não só para conquistar melhor qualificação profissional, como também para a vida cotidiana. Ele sonha em cursar odontologia, mas tem como segunda opção seguir a carreira de eletrotécnico. E confessa que a escolha pelo ensino técnico veio por influência de sua irmã, que seguiu no mesmo rumo, e pela visão de que esse modelo de ensino iria lhe ajudar no futuro de alguma forma.

Pedro diz que o ensino técnico ampliou seus horizontes, garantindo-lhe uma visão mais realista e amadurecimento para encarar o mercado de trabalho. “São grandes diferenciais, algo que não se aprende geralmente no ensino médio tradicional. Além disso, a gente aprende a viver em sociedade, a ter uma maneira de se comportar no mercado”, relata. Para ele, a interatividade e a ajuda mútua entre os colegas também são pontos a ser valorizado no ensino técnico. Ele defende que essa modalidade de ensino seja acessível a mais pessoas, principalmente alunos de escola pública. “Deveria ser um ensino mais democrático, mais igualitário.”

 

*Estagiário sob supervisão de Ana Sá

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