Por Ana Machado
Ana Machado é mestra em educação pela Universidade Stanford, especialista em psicossociologia da juventude e políticas públicas pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FEPSP) e bacharel em marketing pela Universidade de São Paulo (USP)
Escrever sobre um assunto tão amplo quanto carreira é sempre desafiador. Primeiro, porque o perfil de profissionais que se interessam pelo assunto é vasto e diversificado, em fases de vida distintas, com dilemas, interesses e oportunidades muito díspares. Sempre que escrevo, faço um recorte do público ao escolher o tema da coluna. Na maioria das vezes, acabo falando para uma minoria que possui condições de escolher os seus caminhos profissionais mais por suas afinidades do que por necessidade.
No entanto, não podemos fugir à realidade dos fatos do mercado profissional brasileiro para a maioria dos trabalhadores: informalidade, desemprego, baixa escolaridade, salários mínimos e poucas perspectivas de sair dessa situação. Nos últimos meses, o cenário de retração econômica agravado pela pandemia culminou em uma taxa de desemprego recorde de 14,7%, representando um total de 14.8 milhões de pessoas sem trabalho formal no último trimestre.
Esse é um contexto pouco favorável para os jovens que estão começando a sua vida profissional e que deveriam estar esperançosos e motivados com as oportunidades do futuro. Além das desigualdades sociais brasileiras que dividem os jovens em grupos que estão mais ou menos propensos a sonhar, por conta das discrepâncias de oportunidades e condições disponíveis, vivemos um momento ainda mais desafiador para quem está entrando no mercado de trabalho ou tem poucos anos de experiência profissional. Como ilustrativo dessa situação, uma pesquisa recente realizada pela FGV Social apontou que cerca de 47% dos jovens entre 15 e 29 anos gostariam de deixar o Brasil para ter acesso a trabalho e melhores condições de vida.
O perfil dos jovens que gostariam de sair do Brasil, revelado pelo estudo, não se limita a uma parcela de privilegiados que teve acesso a intercâmbios, estudo no exterior e experiências internacionais. Parte considerável dos jovens que gostariam de sair do país é representada por pessoas que estão a mais de um ano procurando uma colocação no mercado de trabalho e que almejam uma remuneração que possibilite a realização de sonhos como poupar para uma casa própria, carro e viagens.
Se praticamente metade de nossa juventude não enxerga possibilidades de realização profissional e pessoal no Brasil, esse é um problema que não se limita apenas a quem o vivencia na pele. Não é responsabilidade somente dos jovens buscar soluções para seus desafios e o fato de desejarem mudar de país para tentar a vida deixa evidente que o esforço individual parece surtir pouco efeito quando o contexto macro é desfavorável.
Sendo assim, é de responsabilidade das políticas públicas, das empresas, das instituições de ensino e das entidades de apoio à juventude uma ação de forças integradas para alavancar oportunidades para os jovens no início de carreira. Todos perdemos quando a potencialidade e o talento de milhões de jovens brasileiros não são usados a serviço de seu país. Estamos desperdiçando inteligência, energia e diminuindo as possibilidades de contribuição de toda uma geração que se encontra desiludida e sem perspectivas de curto e médio prazo.
As respostas para problemas complexos não são simples. Um bom primeiro passo é escutar os jovens, aprofundar em seus desafios e coletar as suas ideias para superá-los. No entanto, para resgatarmos a esperança da juventude com o nosso país, é necessário apresentar um horizonte diferente, que não depende apenas da ação individual, mas, principalmente, da articulação de diferentes setores com um objetivo coletivo comum: oferecer oportunidades e possibilidades concretas para que cada jovem brasileiro possa explorar o seu potencial independentemente de sua origem social.
"Todos perdemos quando a potencialidade e o talento de milhões de jovens brasileiros não são usados a serviço de seu país"
"Para resgatarmos a esperança da juventude com o nosso país, é necessário apresentar um horizonte diferente"
Saiba mais: E-mail: anamach@stanford.edu / Instagram: @abouteducation