Diversidade na prática
De acordo com Simone Maia, diretora da regional Centro-Oeste da consultoria Lee Hecht Harrison (LHH), “todo mundo sabe que precisa abrir oportunidades para a melhoria da equidade de gênero dos diversos ambientes corporativos”.
Então, empresas e lideranças estão cientes. O desafio é descobrir como tornar o ambiente corporativo mais diverso na prática. Para ela, um dos primeiros passos é debater e trabalhar o tema nas esferas organizacionais para criar uma cultura corporativa bem formulada.
“Se você tem uma homogeneidade muito grande de pensamento, a chance de sair com uma solução efetiva para um problema é menor do que se você tiver muitas pessoas diferentes, com ideias diferentes, pensando juntas e tentando resolver esse problema”, pontua.
A diretora explica que não existe uma competição entre homens e mulheres, o que se busca é uma igualdade de oportunidades. Para tornar a teoria em prática, a consultoria lançou uma solução para alavancar o protagonismo feminino em cargos de gestão e liderança.
“A gente promove coaching e mentoria para mulheres líderes de alto potencial e alto desempenho para que nada freie essa mulher que tenha essa vontade de galgar posições de comando”, descreve.
Simone comenta que essas medidas buscam mudar um status quo. “Se não fizermos uma política que garanta que as oportunidades serão iguais em recrutamento, seleção, promoção e concessões de mérito salarial, vamos demorar muito para avançar”, comenta.
Para as que não conseguem avançar em busca de um cargo de liderança, Simone conta que não é por falta de desejo, mas por um histórico pré-existente de predominância masculina que dificulta o alcance de oportunidades iguais.
A pesquisa “Alavancando mulheres na liderança”, da consultoria LHH, traz informações desanimadoras. Correio Braziliense Foram ouvidos mais de 230 indivíduos, de representantes executivos a líderes seniores dos recursos humanos, nos Estados Unidos.
Os dados mostram que 25% dos cargos de liderança eram ocupados por mulheres no contexto norte-americano, que encontra similaridades em outros países, como o Brasil. Apesar da disparidade, 28% dos chefes estão satisfeitos com as já existentes iniciativas em diversidade.
Inclusão dá lucro
A Mais Diversidade, consultoria de diversidade e inclusão da América Latina, desenvolveu pesquisa com dados globais e revelou que a maioria das organizações (65%) não têm um programa de diversidade e inclusão estruturado com estratégias e planejamentos.
A pesquisa ouviu 293 empresas nacionais e multinacionais, com matrizes em 34 países. Das organizações brasileiras entrevistadas, apenas 28% contam com uma área focada na temática. Além de pouco democrática, a ausência de políticas com foco na diversidade não é inteligente do ponto de vista do negócio.
Empresas que apostam em diversidade, principalmente a de gênero, conseguem obter mais lucros. Estudo feito pela DDI, organização de análise e pesquisa, e pela consultoria Ernst & Young (EY), analisou 2,4 mil empresas de 54 países para produzir um panorama global com foco em diversidade, transformação digital, cultura e outros.
De acordo com a pesquisa, instituições que tiveram valor equivalente a 30% de diversidade no quadro de funcionários apresentaram melhores resultados financeiros. Quando a diversidade da equipe é ainda mais significativa, a possibilidade de lucro e crescimento sustentado é 1,4 vez maior.
Para Liliane Rocha, fundadora e CEO da Gestão Kairós, consultoria de soluções e serviços nas temáticas de sustentabilidade e inclusão para entidades, é necessário que as organizações entendam que, além de diversidade ser importante por justiça social, é também fundamental para a gestão do negócio. “Diversidade traz dinheiro”, defende.
“Como trabalhar em um mundo complexo e caótico com uma equipe igual? Não tem como dar certo em termos de produtividade, gestão de risco (gerenciamento e controle de potenciais ameaças em uma organização), visão, novos produtos e olhar estratégico”, explica. A especialista em gestão da sustentabilidade pela Fundação Getulio Vargas (FGV) cunhou o termo diversitywashing (lavagem da diversidade), que diz respeito ao excesso de posicionamento sem que a prática seja explorada na vida real.
Assim, para, de fato, dar resultado e lucro, a inclusão precisa ser real. “Não dá para se apropriar desses atributos de diversidade sem, realmente, ter diversidade da porta para dentro”, defende. Para que as mudanças aconteçam, elas precisam partir da sociedade como um todo. “O brasileiro, historicamente, não tem esse hábito de cidadania constante, então a gente cansa. Se não fizermos esse exercício de cidadania constantemente nos pequenos gestos, as coisas não vão mudar.”
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Mercado democrático
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Para Liliane, dois fatores devem tornar a igualdade de gênero um assunto central no mundo corporativo: vantagem competitiva para as grandes empresas e justiça social. “As mulheres estão se formando, estão qualificadas, estão estudando, mas não estão ingressando em proporcionalidade na liderança das 500 maiores empresas brasileiras”, ressalta.
Para construir um Brasil mais próspero e desenvolvido, é fundamental entender esse cenário para implementar novas políticas. “Ter mulheres dentro das empresas faz com que exista equilíbrio de características masculinas e femininas, o que contribui para que a empresa tenha mais inovação, faça mais gestão de risco e avance”, explica.
Mas como fazer isso acontecer? De acordo com Liliane, as empresas precisam desenvolver agendas de atuação com foco na contratação de mulheres. Para reter profissionais do sexo feminino e promover a experiência e a ascensão profissional dessas colaboradoras, é preciso analisar políticas, processos seletivos e cultura organizacional.
Três perguntas para
Marcelo Rocha de Souza, CEO do Grupo Soulan e especialista em gestão empresarial
Como o viés de afinidade interfere na hora da contratação de mulheres?
É muito difícil gerenciar alguém que é diferente de você, então, normalmente, em um processo seletivo, as pessoas buscam pessoas parecidas com elas, é natural, é normal. Como o mercado, durante muitos anos, lá no passado, era basicamente masculino, isso se perpetuou. A prova de que a diversidade traz resultado positivo é algo teoricamente recente, então, agora, você vê uma luta para mudar esses estereótipos. O principal motivo é justamente por esse que a gente chama de viés de afinidade: de contratar alguém que é parecido com você, em vez de focar competências.
Como reduzir preconceito e machismo para ter processos seletivos mais igualitários?
Nós tomamos decisões, muitas vezes, baseados no nosso histórico, naquilo que a gente já viu e vivenciou. Então, deixamos nosso viés inconsciente tomar decisões por nós. Isso acontece com todo mundo. Se, em um processo seletivo, sabemos que, se tivermos que decidir de forma espontânea, o viés inconsciente vai falar mais alto, então, vamos criar métricas objetivas para a decisão e definir competências. Criamos métricas objetivas para não deixar que as percepções decidam, e, sim, os dados.
De que forma os homens podem ajudar a tornar ambientes corporativos mais igualitários?
Os homens não só podem, mas devem, sim, agir para promover a diversidade olhando a pessoa pelas competências que ela traz para a organização e não pelo gênero, pela roupa que veste ou pela forma como se comunica. Quando você avalia isso, vê que não existem diferenças significativas de gênero. Quando você traz uma visão objetiva, passa a apoiar cada vez mais a diversidade.
Uma campanha de igualdade
A IBM, empresa norte-americana da área de tecnologia e inovação, com sede brasileira em São Paulo e 350 mil colaboradores ao redor do mundo, lançou a campanha #BeIqual (seja igual) nas redes sociais para apoiar a diversidade e a inclusão no ambiente de trabalho. A iniciativa é um convite para envolver funcionários, clientes e sociedade. Em formato de vídeo, líderes da empresa contaram suas vivências com as políticas de inclusão e diversidade da companhia.
O objetivo é incentivar outras pessoas a compartilharem experiências pessoais com a pauta nas redes sociais usando a hashtag do movimento. Para conferir o vídeo e participar da ação, acesse: bit.ly/beequalibm. A IBM ficou em 4º lugar entre as melhores empresas para mulheres e em 1º lugar na área de tecnologia da informação (TI), em 2018, pela GPTW Mulher (Great Place to Work).
A ideia da empresa é a de que diversidade gera inovação. Na intenção de garantir a contratação e a ascensão de mulheres, a organização conta com uma área específica para desenvolver diversidade e inclusão. No Brasil, são seis grupos voltados para essa discussão. Entre eles, a BRG Mulheres, que reúne voluntárias para desenvolver projetos de empoderamento feminino e igualdade de gênero no mercado de trabalho.
O grupo foi responsável por iniciativas como a Mainframe Academy, que desenvolveu cursos sobre plataforma integrada de computadores para fomentar mulheres com interesse em migrar para carreira técnica; mentoria com jovens aprendizes e estagiárias, mulheres negras e profissionais da comunidade técnica da IBM Brasil; mesas redondas para mulheres técnicas e jovens em início de carreira e palestras com mulheres em cargos de liderança que são inspiração para outras mulheres.
*Estagiária sob a supervisão da subeditora Ana Paula Lisboa