Entrevistas de emprego mediadas pela tecnologia trazem vantagens para recrutadores e candidatos que vão além da biossegurança durante a pandemia. Os primeiros podem ampliar o rol de talentos a ser considerado para as vagas, pois as distâncias físicas caem por terra.
Então, é possível considerar concorrentes de outras unidades da Federação que trabalharão em home office ou se mudarão para a cidade da empresa apenas após a seleção. Para quem busca uma oportunidade, dá para participar de mais processos seletivos, justamente pelo fato de o leque geográfico ser ampliado.
Além disso, não se perde tanto tempo com deslocamento e é viável encaixar a conversa virtual na agenda. Com tantos benefícios, é de se esperar que etapas feitas a distância sejam integradas aos recrutamentos permanentemente, mesmo se a pandemia já estiver para trás.
A crise sanitária foi o pontapé para que mais empregadores testassem o recrutamento a distância. No entanto, antes do isolamento social, muitos já adotavam as entrevistas virtuais. Daqui para a frente, especialistas esperam que o formato se torne ainda mais popular.
Pontos positivos
“O esquema é bem confortável, gera uma enorme economia nos deslocamentos. Empresas e consultorias já utilizavam o ambiente virtual para entrevistas com candidatos que estavam fora daquela região ou mesmo do país”, afirma Jacqueline Resch, consultora e sócia-diretora da Resch RH, empresa de desenvolvimento humano e transformação organizacional.
“Creio que a prática vai permanecer, principalmente para as entrevistas iniciais de um processo seletivo, otimizando o tempo de todos”, aposta. Caroline Cabral, CEO da consultoria profissional RH Conecta +, concorda que a tendência veio para ficar.
Ela já fazia entrevistas virtuais, mas sentia resistência por parte dos candidatos. Ainda assim, acredita na permanência do formato, mas não de forma a substituir o encontro presencial completamente.
Caroline explica que muitas empresas aplicam testes presenciais, e a execução e a segurança da identidade de quem está respondendo são mais difíceis de verificar remotamente.
“Vai depender da cultura de cada empresa. Com certeza o recrutamento on-line ganhou muita força e vai permanecer por mais um tempo. Mas eu acredito que muitas empresas retomarão o recrutamento presencial quando a pandemia acabar”, prevê a executiva.
Exposição normalizada
Ronaldo Bahia, CEO e fundador da JobConvo, plataforma de recrutamento e admissão digital, afirma que a dinâmica de entrevista a distância pode ser um pouco menos tensa em função da interação com as redes sociais hoje em dia
“Imagino que, há cinco anos, um processo de entrevista on-line poderia causar mais apreensão nos candidatos. Hoje, com YouTube, TikTok, Instagram, em que todos gravam vídeos de forma natural, não é mais o caso”, observa. “Candidatos ficam mais confortáveis em poder participar de processos seletivos sem ter nenhum custo de deslocamento”, pontua.
Contratação garantida
Vitor Gabriel Rodrigues, 22 anos, perdeu as contas de quantos processos seletivos a distância participou. “Sempre tem vagas para desenvolvedor de sistemas”, diz. Apesar de ainda não ser graduado na área (ele é estudante do 6º semestre de análise e desenvolvimento de sistemas), Vitor já tem experiência no cargo.
O brasiliense começou a procurar emprego em janeiro quando ficou sem emprego e, desde então, fez uma entrevista por semana até conseguir o posto de trabalho atual, 1º de fevereiro, como desenvolvedor de sistemas remoto na Money Money Invest, startup de São Paulo.
“A empresa onde eu trabalhava sofreu um golpe financeiro de um dos sócios e não conseguiu mais nos manter. A partir da minha saída, usei o Linkedin para encontrar vagas, mesmo que não fossem em Brasília”, conta. Graças às seleções virtuais, Vitor se candidatou pela primeira vez a vagas fora do DF, o que aumentou a chance de conseguir um posto.
Para ele, as entrevistas a distância são bem diferentes das presenciais. “Na seleção on-line, a impressão é de que as pessoas querem descobrir a sua capacidade técnica. Em todas as entrevistas, eu compartilhei a minha tela e mostrei meu portfólio; em algumas, fiz testes”, diz. “Nas presenciais, vejo que sempre querem saber das capacidades socioemocionais do candidato. Nunca fiz um teste técnico nestes casos”, afirma.
“O processo seletivo da empresa onde atuo hoje foi muito bom. Primeiro fui entrevistado pelo RH, que me apresentou à empresa. Depois, conheci a equipe e me fizeram perguntas técnicas”, lembra. “Agora que estou dentro, há uma preocupação com a minha adaptação e o modelo de reuniões remoto é fluído e funciona bastante”, relata.
Preparação é a chave
Mesmo que a crise sanitária já tenha começado há um ano e seja mais comum encarar seleções virtuais hoje em dia, muita gente ainda sente desconforto com o formato. Independentemente do modelo, uma entrevista de emprego é, de certa forma, amedrontadora.
É preciso ter um preparo e um cuidado antecipados para participar do processo e sair com a certeza de que a vaga na empresa foi garantida. Essa preparação deve ser interna e externamente e vai desde planejar cautelosamente o que deve ser dito, até escolher a melhor roupa do armário para uma boa apresentação visual.
Caroline Cabral, CEO da RH Conecta +, observa que o crucial para se destacar em uma entrevista de emprego, seja virtual, seja presencial, certamente é controlar o grande vilão desse tipo de conversa: o nervosismo.
Saiba Mais
De acordo com ela, às vezes, um candidato preparado, com as competências necessárias para a vaga, perde a oportunidade por causa disso. “Ele trava e não consegue transmitir para o recrutador todo o potencial dele”, explica.
Formada em serviço social, Caroline acrescenta que o cenário de conversar com recrutadores com a mediação de uma tela pode assustar e intimidar ainda mais os candidatos inseguros.
Para minimizar a questão, Caroline aconselha treinar bastante para o grande dia. Além disso, é possível buscar ajuda em fontes confiáveis na internet ou em consultorias especializadas em processos seletivos.
“Treinar o que vai dizer com um amigo ou com um parente também é uma ótima solução para preparar o candidato, pois evita que ele trave e permite que ele se sinta mais seguro e confiante para falar das competências dele”, sugere.
Problemas do universo virtual
Mesmo com o emocional preparado e com as falas na ponta da língua, imprevistos que só o ambiente remoto proporciona podem ocorrer, falhas técnicas, barulhos externos, como entre outros. Sendo assim, há uma preocupação a mais nas questões de funcionamento da internet, do computador e do fone de ouvido. É preciso verificar se o ambiente está bem iluminado e livre de barulhos incômodos.
Para tanto, Caroline Cabral aconselha que sejam feitos testes prévios das plataformas de reunião on-line. “Simule com um amigo ou familiar. Desse modo, o candidato pode testar a conexão de internet, a luminosidade, o áudio e o vídeo.” A psicóloga faz um alerta quanto à organização e à limpeza do local onde a entrevista vai ser feita: garanta que tudo esteja organizado e apresentável.
Além disso, a pós-graduada em gestão de pessoas com ênfase em liderança recomenda que todas as redes sociais, aplicativos ou sites sejam encerrados, a fim de evitar barulho e distrações. Silenciar as notificações do celular é um cuidado que também deve ser tomado.
“Cuidado com o delay, que é o desencontro de áudio durante uma transmissão on-line. Deve-se falar pausadamente e dar tempo ao recrutador para perguntar e dialogar com tranquilidade. Saber ouvir e falar com tranquilidade é fundamental, além de manter a calma e a naturalidade”, completa.
Contratações continuam
Se, por um lado, muitas empresas fecharam ou precisaram reduzir a equipe, por outro, há firmas que continuam contratando, seja para ampliar, formar uma nova equipe ou simplesmente repor postos que ficaram vagos.
Segundo levantamento do Banco Nacional de Empregos (BNE) e da plataforma de admissão digital Lugarh, a oferta de vagas cresceu mais de 28% em janeiro e foi superior à quantidade de oportunidades abertas no primeiro mês do ano em 2020 e em 2019.
Segundo o BNE, as vagas no Brasil reduziram 7,16% no ano passado devido ao impacto causado pela pandemia. O mês de janeiro costuma ter aumento de 77% na movimentação do mercado de trabalho.
O crescimento de agora foi inferior a isso, mas ainda é considerado positivo pelo cenário de crise sanitária e fiscal. O número de candidatos que cadastraram currículos no BNE foi de 741.960, contra 665.396 em 2020. Isso demonstra que, além das empresas, os candidatos estão se movimentando para reinserção empregatícia.
*Estagiárias sob supervisão da subeditora Ana Paula Lisboa