Apaixonada pelos estudos desde pequena, Janaina Almeida, 44 anos, lembra-se bem de quando decidiu se tornar professora. Foi logo após sofrer ataques racistas de uma docente da escola em que estudava no Guará, aos seis anos, cidade em que nasceu e passou a infância.
“Tem pessoas que ensinam com bons exemplos e, outras, com ações negativas. Ela me fez entender quem eu não queria ser e a partir dali decidi que seria professora para tentar evitar que outros sofressem o que eu sofri”, lembra.
“Ela me chamava de macaca e não deixava os colegas sentarem ao meu lado nem compartilharem materiais comigo, como lápis de cor, coisas que eu não tinha porque minha família era muito humilde. Uma vez, a professora não me deixou ir ao banheiro e urinei na sala. Foi terrível”, desabafa.
Janaína seguiu firme no propósito de continuar a estudar e se tornar professora. Cursou o ensino médio junto ao magistério, capacitação que formava professores na Escola Normal de Brasília.
Para cumprir a grade de estudos de tempo integral, foi essencial a ajuda da mãe, que atuava como auxiliar de enfermagem em dois hospitais, vendia salgados e cursava economia doméstica para que Janaína e as duas irmãs não precisassem trabalhar. “Se não fosse assim, eu não teria a oportunidade de apenas estudar”, conta.
Aos 17 anos, Janaína celebrou com a mãe a conclusão dos estudos. Três anos depois, em 1997, ela tornou-se parte do quadro de docentes da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEE-DF). No mesmo ano, porém, teve de enfrentar a dor de perder a mãe, que faleceu em decorrência de um derrame.
Aperfeiçoamento
Por ela e pela mãe, a educadora continuou em busca de realizar o sonho de mudar a educação brasiliense. Graduou-se em história pela Upis (União Pioneira de Integração Social), em pedagogia pela Universidade de Brasília (UnB) e investiu em especializações para prestar um serviço de qualidade no ensino público.
Atuou no ensino especial, na Educação de Jovens e Adultos (EJA) e no ensino fundamental regular. Ao tornar-se diretora da Escola Classe 5 do Guará, em 2011, após uma campanha feita por colegas professores e funcionários, começou a implementar as mudanças que sempre quis ver no ensino público.
“Ali, pude realmente agir para tornar a escola um ambiente mais saudável para crianças. Adotamos o conceito de acessibilidade emocional que, na época, chamamos de ambiente acolhedor. O esforço é para, em várias frentes, sermos livres de racismo, gordofobia, intolerância religiosa e outras práticas nocivas”, conta.
Janaína promoveu palestras sobre bullying, rodas de conversa e tratou cada aluno individualmente. “Um pai que morava nos Estados Unidos se emocionou ao ligar para a escola e perceber que eu sabia o histórico da filha de cabeça”, diz. Também promoveu integração entre a escola e a comunidade com atividades entre pais e alunos. Além disso, reformou espaços de professores e os incentivava.
O trabalho foi reconhecido em 2015, quando ela ganhou o Prêmio de Boas Práticas de Gestão, da SEE-DF, e em 2019, a escola conquistou a marca de 6,9 no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), terceira maior nota do DF. “Foi uma trajetória maravilhosa feita com a ajuda de uma equipe incrível”, pontua.
Após oito anos de trabalho, em 2019, Janaína foi convidada para ser secretária-executiva da SEE-DF. Depois, foi chefe da assessoria especial do órgão e, hoje, integra a Subsecretaria de Inclusão (Subin), núcleo com foco na implementação de ações de inclusão.
Para ela, ainda há muito a se fazer. “A educação antirracista precisa ser uma realidade. Ela é um antídoto para o racismo, pois ensina a valorização da cultura negra e do povo preto. Não se limita a novembro e deve estar ligada a várias disciplinas na escola. É hora de avançar nisso”, declara.
*Estagiária sob supervisão da subeditora Ana Paula Lisboa