INCLUSÃO

Eles chegaram lá: alunos da rede pública falam da experiência de entrar na UnB

O Correio conversou com jovens que venceram o desafio de ingressar em uma das melhores universidades do Brasil e da América Latina. Eles contaram como é o sentimento da vitória e deram dicas para os que têm essa meta

Caio Ramos
postado em 03/06/2024 06:00
Samuel Felipe (E), cursa administração; Suellen Cavalcante, faz engenharia de redes; e Brunno Diniz estuda engenharia aeroespacial -  (crédito: Kayo Magalhães/CB/D.A Press)
Samuel Felipe (E), cursa administração; Suellen Cavalcante, faz engenharia de redes; e Brunno Diniz estuda engenharia aeroespacial - (crédito: Kayo Magalhães/CB/D.A Press)

A Universidade de Brasília (UnB) — sétima melhor da rede federal, 11ª entre as brasileiras e 19ª na América Latina, segundo o Center for World University Rankings (CWUR) —, destina metade das vagas a alunos da rede pública. Mesmo com o avanço das cotas, ingressar na instituição é um grande desafio. Fatores socioeconômicos, pedagógicos e psicológicos influenciam para que os estudantes da rede pública o vençam, na ótica de jovens ouvidos pelo Correio.

Samuel Felipe, 19 anos, filho de uma dona de casa e ex-aluno da escola pública Centro Educacional (CED) 1 do Guará, cursa o terceiro semestre de administração e destaca que não é fácil entrar para a UnB. Para ele, o segredo é a dedicação. "Minha rotina foi igual à de outros alunos. O diferencial é que coloquei na minha cabeça que queria entrar nesta universidade, desde o primeiro ano do ensino médio. A partir daí, fui me dedicando e adquirindo conhecimento para chegar preparado às provas que dão acesso à faculdade", conta. "Para mim, a UnB não era só uma faculdade. Era a chance de mudar a minha vida e a da minha família, o que me trouxe uma sensação de sobrecarga emocional e psicológica. Meu futuro estava em jogo. Hoje, fazer parte disso é um privilégio, eu me sinto totalmente lisonjeado e agradecido", conclui. 

Para ele, que entrou por meio do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), é fundamental o autocuidado na preparação para os exames. "Controlar a ansiedade e tratar os problemas que aparecem no caminho são essenciais, uma vez que, se não forem resolvidos, podem acarretar outros no futuro. Acho que criar uma rotina de estudos que não seja cansativa, mas sim regulada, com dias certos para estudar, é uma forma. Quando colocamos essa pressão em nós mesmos de estudar repetidamente, a ansiedade acaba nos remoendo", analisa.

Diversidade

No terceiro semestre de engenharia aeroespacial, Brunno Diniz, 19, egresso do Centro de Ensino Médio (CEM) Setor Leste, na Asa Sul, foi aprovado na UnB por ampla concorrência e enfatiza o significado de haver estudantes da rede pública na instituição federal. "É necessária a diversidade de pessoas na universidade, mostrar que o estudo avançado é para todos, não apenas aos da rede privada. É de grande importância, principalmente para a inclusão de alunos que não tiveram a mesma condição que outros, mostrando que todos são capazes", diz.

No momento, Brunno tem ponderações quanto à greve de professores e de técnicos. Para ele, a "causa é superjusta", mas os alunos são prejudicados. "Atrasa o semestre, fica tudo mais corrido quando as aulas voltam, nossas férias são encurtadas, acabamos perdendo muito conteúdo", argumenta.

"Foco, disciplina e persistência são essenciais para uma aprovação. Sei que há muitos percalços da vida que nos desmotivam, como se preocupar em ir trabalhar e com a família. Aí, é a circunstância de cada um. Mas, se realmente almeja a UnB, tente tirar um tempo para os estudos. Se é seu objetivo, corra atrás. Garanto que não se arrependerá", aconselha Suellen Cavalcante, 23, ex-aluna do Centro de Ensino Médio Ave Branca (Cemab), de Taguatinga, que está no sétimo semestre de engenharia de redes. "O pessoal que vem de colégio particular tem uma diferença drástica na facilidade de aprendizado e de ensino, enquanto nós, que viemos da rede pública, não conseguimos conduzir os estudos com tanta facilidade quanto eles", complementa.

Feliz por ter vencido o desafio de entrar para uma das melhores instituições de educação superior do país, via Enem, a jovem também considera justa a pauta de docentes e funcionários. "É essencial para garantirmos uma melhor qualidade de ensino e beneficia não somente a universidade e os professores em si mas os alunos e a sociedade em geral", afirma.

Foco no agora

O CEM 9 de Ceilândia é um dos colégios públicos do Distrito Federal que mais contabiliza alunos na UnB. Neste ano, pelo menos 70 ingressaram na instituição via Programa de Avaliação Seriada (PAS). A escola se prepara para prosseguir ajudando os discentes a garantirem vaga.

Antônio Rafael, 45, vice-diretor do CEM 9, fala sobre a estratégia da unidade de ensino. "A escola oferece simulados, atividades extraclasse, competições acadêmicas, concursos de redação e aulões intensivos para preparação dessas provas que dão acesso à UnB, inclusive, já começamos a aula da parte de exatas, este ano", declarou. O vice-diretor também manda um recado aos jovens: "Talento sem dedicação não resolve, focar no estudo e fazer sua parte são essenciais antes de fazer as provas. O resultado é proporcional ao seu esforço".

À medida que o tempo vai passando e as avaliações que dão acesso à UnB se aproximam, a ansiedade pode aumentar. Guilherme Rocha, 17, está concluindo o ensino médio no CEM 9 e encontrou um caminho para manter a tranquilidade. "Qualquer pessoa sente um friozinho na barriga com essas avaliações chegando, mas tenho que manter a calma. A autoestima tem que estar lá em cima. É preciso focar no agora, porque se eu ficar muito ansioso, a chance de ter um resultado negativo é grande. Portanto, é necessário controlar as emoções", ensina o jovem, que está determinado a ser aprovado em medicina.

Para saber mais

Concorrência

De acordo com o Censo Escolar produzido pelo Instituto de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), em 2023, havia 81,8 mil alunos no ensino médio em escolas vinculadas ao GDF, sendo 23,9 na terceira série. Na rede privada, eram 25 mil estudantes e, desses, 7,9 mil na terceira série. Para se ter ideia, em 2022, conforme a UnB, dos 8,6 mil calouros, aproximadamente 4,5 mil eram oriundos de unidades de ensino públicas. 

Acesso

» No Enem, as inscrições vão até a próxima sexta-feira (7/6), pela Página do Participante. A forma como a nota pode ser usada para ingresso na UnB está disponível em estudenaunb.unb.br.

» As instruções para concorrer pelo PAS podem ser conferidas no site cebraspe.org.br.

» As inscrições para o vestibular terminaram e as informações sobre a seleção são divulgadas no mesmo site.

*Estagiário sob a supervisão de Malcia Afonso

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