Com o objetivo de preservar a biodiversidade do segundo maior bioma do Brasil, o Jardim Naturalista Louise Ribeiro acompanha a germinação, crescimento e floração de espécies nativas do cerrado. O local também é um memorial, pois leva o nome da estudante de biologia Louise Maria da Silva Ribeiro, morta em março de 2016 na UnB, vítima de feminicídio. O jardim é aberto ao público e fica no Instituto de Ciências Biológicas da UnB. "Só é possível proteger o que conhecemos, e buscamos divulgar e conscientizar a população através da inserção de espécies vegetais cerratenses em espaços comunitários", conta a professora Cássia Munhoz, do Departamento de Botânica da UnB.
Cássia explica que o projeto é um marco, sendo o primeiro jardim naturalista de cerrado do mundo ao utilizar espécies arbustivas e herbáceas nativas do bioma no paisagismo. Atualmente, o Jardim Naturalista Louise Ribeiro é um projeto de extensão e é descrito como um ambiente de experimentação e aprendizado. "Além de ser um espaço de memória à Louise e de combate à violência contra a mulher, o Jardim se tornou um experimento ao ar livre que valoriza a negligenciada vegetação do cerrado", pontua a professora.
Criado pela arquiteta paisagista Mariana Siqueira, o jardim tem 720m² de extensão e é cuidado por professores, estudantes e técnicos, por meio de diversos mutirões de manejo, como o controle de ervas exóticas, semeadura e plantio de mudas. "O jardim transforma-se do verde exuberante e vibrante da estação chuvosa para as diferentes tonalidades de marrom e dourado na seca, salpicado por pequenos arbustos que permanecem verdes e florescem em diferentes cores e aromas", descreve a professora Cássia, que também é coordenadora do projeto.
Para a estudante de ciências biológicas Marina Vendramini, o jardim é um ponto de apoio que a ajudou em uma mudança de perspectiva. "Pude compreender muito melhor nosso bioma, entender como o Cerrado é visto pela comunidade, e aprender a respeitar os ciclos do jardim e a nova proposta que ele traz. Foi também um espaço seguro para discutir questões feministas e de gênero - a necessidade de resistência se tornou muito mais clara", relata.
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Já para Anna Cecília Batista, também estudante de ciências biológicas, o espaço simboliza esperança, mudança e visibilidade. Ela conheceu o projeto assim que ingressou na UnB, em 2019. "Esperança que as plantas e as mulheres tenham maior visibilidade perante a sociedade, mudando a concepção e a visão que as pessoas possuem do Cerrado, mostrando que ele pode, sim, ser um jardim, e suas espécies têm seu jeitinho único e adaptado à sazonalidade daqui", destaca a graduanda.
Biodiversidade em risco
O cerrado cobre cerca de 25% do território nacional, abrangendo uma área entre 1,8 e 2 milhões de km2 nos Estados de Goiás, Tocantins, Mato Grosso do Sul, sul do Mato Grosso, oeste de Minas Gerais, Distrito Federal, oeste da Bahia, sul do Maranhão, oeste do Piauí e porções do Estado de São Paulo. Segundo informações do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o bioma possui aproximadamente 6 mil espécies de árvores e 800 de aves.
Uma das características mais marcantes do cerrado é o endemismo das plantas, isto é, a capacidade de espécies se desenvolverem apenas em determinado local. Das 13 mil espécies de angiospermas, por exemplo, 30% são consideradas endêmicas. "O cerrado sofre uma excepcional perda de habitat. Estudos alertam que a expansão agrícola e a falta de políticas de preservação consistentes provavelmente representam a destruição de 50% do Bioma Cerrado e por consequência a extinção de muitas espécies endêmicas", alerta a professora Cássia.
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De acordo com a especialista, os jardins naturalistas são uma das formas de minimizar a perda da biodiversidade cerratense. "O uso de plantas nativas para o paisagismo e especialmente parques e jardins públicos segue uma tendência mundial de implementação de jardins naturalistas, que reduzem os custos e necessidade de manutenção destas áreas, especialmente na economia de água, pois as espécies nativas toleram os períodos de estiagem", ressalta Cássia.
Relembre o caso de feminicídio
Em 10 de março de 2016, a estudante de biologia Louise Maria da Silva Ribeiro foi assassinada em um dos laboratórios da UnB pelo ex-namorado Vinícius Neres. O assassino atraiu Louise ao laboratório da faculdade de Biologia após insistir, dizendo que iria se suicidar. No local, Vinícius imobilizou a vítima, usou clorofórmio para deixá-la inconsciente e a matou envenenada. Na sequência, levou o corpo da jovem até o carro dela, e o abandonou em um terreno baldio, após atear fogo nele.
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A brutalidade do crime chocou a comunidade da UnB e todo o Distrito Federal na época. "O acontecimento é um exemplo da realidade de milhares de mulheres no Brasil, onde, ainda hoje, o machismo é motivador de práticas violentas contra mulheres e, portanto, o debate sobre o assunto deve ser fomentado em todos os espaços, dentro e fora da universidade. A ocupação do IB/UnB através da criação do Jardim Louise Ribeiro é uma intervenção que traz para o espaço físico a memória de Louise, e representa a luta contra a violência de gênero e o diálogo sobre este tema", frisa a professora Cássia Munhoz.
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