Eu, Estudante

REVIRAVOLTA

Novo bloqueio de verbas do MEC inviabiliza funcionamento da UnB

Reviravolta no processo torna impraticável pagamento de despesas básicas, como vigilância, água, luz, restaurante universitário e bolas de estudo e pesquisas, diz reitora

A reviravolta no processo de corte de verba para as instituições federais de ensino promovida pelo governo Jair Bolsonaro (PL) vai inviabilizar o funcionamento da Universidade de Brasília (UnB), que está impossibilitada de arcar com despesas básicas, como pagamento de contas de água luz, vigilância, restaurante universitário e bolsas de estudo. De acordo com a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) a decisão atinge todas as unidades vinculadas à pasta.

No mesmo dia em que reverteu o bloqueio de limites de empenho (reserva de dinheiro) para universidades e institutos federais, o governo federal congelou todos os pagamentos do Ministério da Educação (MEC) em dezembro.

A reitora da UnB, Márcia Abrahão classificou a reviravolta no processo como mais um duro golpe na educação. Segundo ela, só da UnB foram retirados R$ 17 milhões, impedindo todos os pagamentos previstos até o final deste ano. "Significa que não temos mais dinheiro para pagar nada, de bolsas de estudos a restaurante universitário, limpeza, vigilância e nem os projetos de pesquisa de professores", disse.

Ela lembra que, neste ano, tanto a UnB como outras universidades e institutos federais estão repondo as aulas suspensas no pior período da pandemia, o que implica em grande volume de estudantes nos câmpus até o final de janeiro de 2023. "Consequentemente, termos mais despesas com restaurantes universitários e assistência estudantil, que serão inviabilizadas com os recursos que já estavam menores e agora foram cortados", lamenta.

Na segunda-feira (28), após o bloqueio orçamentário de R$ 438 milhões ocorrido na metade do ano, o governo fez nova retirada de recursos, no valor de R$ 344 milhões, praticamente inviabilizando as finanças de todas as universidades federais e tornando ainda mais grave a situação orçamentária do sistema federal de ensino superior. As universidades federais continuam no aguardo da restituição do valor bloqueado em junho.

Mensagem do Tesouro Nacional encaminhada ao MEC e unidades, de 19h37 desta quinta-feira (1/12), indica que o governo "zerou o limite de pagamentos das despesas discricionárias (Anexo II do DPOF) do Ministério da Educação — MEC previsto para o mês de dezembro". As despesas discricionárias não incluem gastos obrigatórios, como salários.

A decisão da equipe do ministro Paulo Guedes (Economia) atende ao decreto nº 11.269, de 30 de novembro de 2022, que dispõe sobre a programação orçamentária e financeira e estabelece o cronograma de execução mensal de desembolso do Poder Executivo.

MEC e Ministério da Economia foram procurados, mas não responderam até a publicação deste texto. Não há informações sobre o volume de pagamentos bloqueados até o fim deste ano.

Os limites de empenho foram bloqueados pelo governo na segunda-feira (28), o que representou um impacto de R$ 366 milhões para universidades e institutos federais. O empenho é a primeira fase da execução orçamentária e reserva dinheiro para determinada ação.

O congelamento causou grande comoção no setor e queixas sobre dificuldades na manutenção das atividades das instituições. Nesta quinta-feira (1º), os empenhos foram liberados, mas os pagamentos, por sua vez, congelados a partir do fim da tarde.

De acordo com a mensagem da área econômica, "unidades vinculadas ao MEC somente podem efetuar pagamentos com os recursos que já possuem em suas disponibilidades financeiras" — aqueles que seriam relacionados a limites de empenhos liberados até novembro poderiam ser pagos.

Integrantes do sistema federal de ensino superior reclamam da confusão e da falta de previsibilidade geradas pelo governo. Segundo relatos, não tem sido possível pagar mais nada desde o fim da tarde desta quinta.

O MEC tem cerca de R$ 2 bilhões bloqueados para empenhos neste ano. Isso já levando em conta a retomada dos R$ 366 milhões das instituições federais.

A mesma mensagem indica que a decisão de cortes é do Ministério da Economia e que o MEC teve recusados pedidos para ampliação de limites de pagamento das despesas discricionários. A pasta da educação teria feito novo pedido de abertura de crédito nesta quinta.

Sob Bolsonaro, o MEC viveu o esvaziamento orçamentário em todas as áreas. A equipe do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) negocia na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição a retirada dos gastos do Bolsa Família do teto a fim de abrir espaço fiscal para fortalecer os orçamentos.

O gabinete de transição vislumbra um incremento de R$ 12 bilhões nos recursos do MEC para o ano que vem caso a PEC consiga passar. Lula pôs como prioridade a retomada do orçamento das federais e o aumento do programa de alimentação escolar, ampliando assim as transferências federais para redes de ensino.

Andifes aposta no diálogo

Em contato com a Subsecretaria de Planejamento Orçamentário do MEC (SPO), o presidente da Andifes, reitor Ricardo Marcelo Fonseca, foi informado sobre a devolução dos limites de empenho que haviam sido retirados na segunda-feira (28), até às 12h dessa quinta-feira (1º).

Segundo Fonseca, a Andifes seguirá atenta aos riscos de novos cortes e bloqueios e manterá o diálogo com todos os atores necessários, no Congresso Nacional, governo, sociedade civil e com a equipe de transição do governo eleito para a construção de orçamento e políticas necessárias para a manutenção e o justo financiamento do ensino superior público.

"De maneira inacreditável as universidades e institutos federais viram acontecer uma reviravolta na questão dos bloqueios dos seus recursos. Se de um lado, ontem, o Ministério da Educação restituiu os limites dos nossos gastos, ou seja, d possibilidade de que nós tínhamos para poder pagar as contas, de outro lado o Ministério da Economia, com a outra mão, simplesmente retirou os recursos. Ou seja, de um lado falaram: vocês podem pagar as suas contas, de outro lado retiraram o dinheiro impedindo que as contas sejam pagas", disse Fonseca.

Segundo o dirigente da Andifes, trata-se de uma situação absolutamente inédita, que deixa as instituições na mesma situação do início da semana, sem recursos e possibilidade de honrar os gastos internos com a comunidade, como bolsas de estudos e pesquisa, contas de luz, conta de água, coleta de lixo e também compromissos com nossos terceirizados.

"O final do ano e o Natal para essas pessoas humildes está se aproximando. A rigor, a situação agora está pior. Foram abrangidos empenhos anteriores que já tinham sido feitos. O tamanho desses cortes para as universidades, em plena reta final da nossa execução orçamentária, é uma situação inédita. O governo acaba no dia 31 de dezembro e a máquia pública precisa continuar girando. As universidades precisam manter os seus compromissos. Estamos na esperança que, no diálogo, essa situação seja revertida, pela sua imensa gravidade, o mais brevemente possível", completou.

*Com agências