Levantamento realizado pelo centro Sou_Ciência, mostra que a política de inclusão por meio da Lei de Cotas não só garantiu a diversidade na universidade, como também revelou um salto no desempenho dos estudantes. O estudo foi elaborado a partir de dados do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade), aplicado pelo Ministério da Educação (MEC), disponibilizados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).
A comparação foi feita com as notas das provas objetivas de 2013 e de 2019 de 15 universidades federais que possuíam o maior número de estudantes matriculados no ano de 2019, e que avaliaram a área da saúde. Na Universidade Federal da Bahia (UFBA), por exemplo, a nota saltou de 28,75 para 55,9 no período; na Universidade Federal Fluminense (UFF), foi de 22,66 para 55,47; na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) saiu de 38,41 e foi para 53,81; e na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), saltou de 35,56 para 54,16.
De acordo com a coordenadora do SoU_Ciência e professora da Unifesp, Maria Angelica Minhoto, o estudo mostrou a alteração no perfil de estudantes, com maior diversidade nas universidades federais a partir da Lei de Cotas. "O aumento de cotistas não alterou o desempenho das universidades, ao contrário. Quando comparamos a nota média da prova de conhecimentos específicos do Enade de 2013 e de 2019, vemos que a qualidade da educação pública aumentou. O acesso e a permanência foram democratizados no período de estudo e agora é importante reconhecer e fortalecer", analisa. “Os números reforçam que as instituições de ensino superior públicas são um espaço para o desenvolvimento de todos”, completa.
O estudo lembra que a Lei Federal 12.711, conhecida como Lei de Cotas, somente foi promulgada em 2012 e que, a partir do ano letivo de 2013, todas as instituições da Rede Federal de Ensino passaram a reservar um percentual de suas vagas de ingresso para 8 estudantes provenientes de escolas públicas, que se autodeclaram pessoas pretas, pardas ou indígenas e cuja renda familiar per capita fosse de até um salário mínimo e meio, conforme estabelecido na lei e que, mais recentemente, as cotas federais foram ampliadas também para pessoas com deficiência.
No primeiro ano de vigência da lei federal, foram reservadas o mínimo de 12,5% das vagas de ingresso, por curso e turno, para estudantes que tivessem feito todo o ensino médio em escolas públicas, combinando a este perfil a situação de renda familiar — possuir até um e meio salários mínimos per capita — ou a autodeclaração de cor, raça ou etnia. Nos anos subsequentes, foram também reservadas vagas de ingresso, respeitando o mesmo perfil, a taxas mínimas de 25,0% e 37,5% respectivamente e, a partir do ingresso de 2016, a reserva totalizou o percentual mínimo de 50,0% das vagas.
No final de 2016, a Lei Federal 12.711 foi alterada — pela Lei 13.409/2016 — que passou a incluir um percentual de reserva para pessoas com deficiência. O número de vagas reservadas para pessoas pretas, pardas, indígenas e com deficiência é definido em acordo com a proporção dessa população na unidade da federação onde a instituição está localizada, conforme dados divulgados no Censo Demográfico de 2010.
Além de analisar o desempenho dos estudantes no Enade para afastar qualquer questionamento acerca da qualidade do ensino após a entrada em vigor da Lei de Cotas, o SoU_Ciência, em parceira com o Instituto Idea Big Data, realizou uma pesquisa de opinião com os brasileiros sobre essa política.
O levantamento revelou que 44,4% dos entrevistados são favoráveis a manutenção da política de cotas, enquanto 18,9% declararam ser contrários. Do perfil que aprova, 57,5% são moradores da região Norte do país, e 48% da região Nordeste; 48,5% têm ensino médio e 50,5% ensino superior; e 52,1% com renda média entre 3 e 5 salários mínimos.
“Esse perfil dos mais favoráveis à Lei de cotas é similar aos segmentos favorecidos pela própria política afirmativa, o que ajuda a reforçar ainda mais o impacto e o tamanho da transformação que ela exerce educacional e socialmente no país”, destaca Maria Angélica.
A pesquisa envolveu 1.248 entrevistas com homens e mulheres de 16 anos ou mais, residentes em todas as regiões do Brasil. A amostragem foi feita por cotas segundo perfis do Pnad 2018 e do Censo 2010, realizada via inquérito telefônico, e possui grau de confiança de 95%, com margem de erro máxima de 3 pontos percentuais para mais ou para menos.