Desfecho

Anhanguera decide conceder bolsa de estudo a morador de rua

Dez dias depois da denúncia de discriminação sofrida por Diego Pereira, publicada no Correio, faculdade decidiu atender a apelos de internautas

*Jáder Rezende
postado em 10/05/2022 23:00 / atualizado em 10/05/2022 23:01
Diego e padre Júliko Lancellotti: acolhimento, vitória e nova perspectiva de vida -  (crédito: Victor Angelo Caldini)
Diego e padre Júliko Lancellotti: acolhimento, vitória e nova perspectiva de vida - (crédito: Victor Angelo Caldini)

A direção da Faculdade Anhanguera, em São Paulo, decidiu nesta terça-feira (10) conceder uma bolsa de estudos ao morador em situação de rua Diego Augusto Pereira, 25 anos, aprovado no vestibular da instituição para o curso de enfermagem. Durante as aulas, Diego passou a sofrer discriminação da direção da faculdade, além de colegas e professores, por sua condição. Ele foi amparado pelo padre Júlio Lancellotti, coordenador da Pastoral do Povo de Rua, que prestou todo apoio ao estudante. A história foi destaque o Correio e sua repercussão motivou a disposição da instituição de ensino em garantir a gratuidade do curso.

Até chegar à universidade, Diego, que passou no vestibular da unidade Belenzinho da Anhanguera, estudando por conta própria, viveu momentos de terror e pânico nas ruas do Rio de Janeiro e da capital paulista. Sua trajetória nas ruas é digna de roteiro de filme. Ele foi brutalmente agredido por policiais nas ruas das duas cidades, escapou da morte depois de levar nove tiros, perdendo uma visão, e ficando com quatro balas alojadas no corpo. Chegou a ser ameaçado por traficantes com um cano de arma na boca e quase foi queimado vivo por um grupo de skinheads nazistas.

Apoio

Em São Paulo, ainda nas ruas, Diego conheceu o padre Júlio Lancellotti, pároco da paróquia de São Miguel Arcanjo, na Mooca, que conquistou a sua confiança. “Conheci Diego no café da manhã da população de rua. Era um rapaz muito fechado, mas conversando com ele fui me apropriando de sua história”, contou o padre.

Diego morava em Tabajaras, favela da zona sul do Rio de Janeiro, e saiu de casa depois de uma série de desentendimentos com o padastro, jardineiro, que nutria ciúmes pela mãe, aposentada.


Depois de perambular e dormir nas ruas da capital fluminense, seguiu para Descalvado, onde pretendia morar com uma ex-cunhada. Lá, conheceu uma mulher e revelou a ela que aguardava uma pequena herança do pai biológico.

 Como não concordou em se casar, essa mulher encomendou sua morte. Numa madrugada, deparou-se com um atirador e foi surpreendido com tiros à queima-roupa. Das nove balas que o atingiram, quatro ficaram alojada em seu corpo, três na cabeça e uma no peito. O crime ainda não foi elucidado pela polícia. Os projéteis não foram removidos pois a cirurgia oferece alto risco de morte.

Saga

A verdadeira saga do morador de rua foi destaque na edição de 1º de maio, do caderno Trabalho & Formação do Correio. Dois dias depois, Diego, padre Lancellotti e a direção da unidade Belenzinho da faculdade se reuniram para falar sobre as denúncias de discriminação no câmpus.

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. (foto: instagram/Reprodução)

Apesar das promessas da direção de apurar os fatos e impedir que novas investidas ocorressem, Diego declarou não acreditar que estaria seguro. Ainda assim, prosseguiu na faculdade, mas decidiu trocar o turno da noite pelo diurno.

“Quero terminar a faculdade para ajudar as pessoas que estão em situação de rua. Não quero ser rico, famoso, simplesmente levar essa mensagem, a de que podemos fazer o bem sem olhar a quem”, disse Diego.

Ele afirmou que a publicação da matéria foi comentada por gente que nunca viu na vida. “Muitos disseram que se identificaram com a minha história, que estão solidários e torcendo para que tudo dê certo. De degrau em degrau vou me reerguer, sair das ruas, ter um lar para morar e até uma família, com a graça de Deus”, disse.

Desfecho

De acordo com o padre Júlio Lancellotti, o processo de concessão da bolsa de estudos será formalizado nesta quarta-feira (11) com a direção da Anhanguera. “Foi muito bom termos contado com a cobertura do Correio. Vejo a decisão da faculdade como uma forma de reparação à discriminação sofrida por Diego. É uma motivação para ele continuar nos estudos e seguir em frente”, disse.

Para o presbítero, a história de Diego é emblemática. “Temos que perceber as condições de cada um e abrir possibilidades, quebrando as barreiras do preconceito”. Segundo ele, a publicidade da história foi crucial para Diego seguir em frente. “Ele melhorou muito sua autoestima. Está numa fase nova. Percebeu que abriu horizontes, que saiu de um claustro. Tem agora uma visão mais larga, mais aberta”, disse.

 

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