Eu, Estudante

Polêmica

MPF protocola ação contra UFPB e reitor, aprovado em sistema de cota

Valdiney Gouveia afirma que não abrirá mão de sua aprovação e que pretende concluir o curso de engenharia de produção

O Ministério Público Federal (MPF) protocolou ação civil pública contra a Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e o reitor da instituição, Valdiney Velôso Gouveia, determinando à instituição a exclusão do nome de Gouveia da lista de aprovados para o curso de engenharia de produção da instituição, além de desconsiderar a aprovação dele no Sistema de Seleção Unificada (Sisu), obtida por meio do uso do sistema de cotas. O reitor afirma que não vai abrir mão da matrícula e pretende fazer o curso "até o fim".

A petição foi assinada pela procuradora da República, Janaína Andrade, e distribuída no último domingo (24) para a 3ª Vara da Justiça Federal. Gouveia foi aprovado no Sisu 2022 com o uso do benefício destinado a candidatos que estudaram na rede pública de ensino. A aprovação do reitor, com 638,9 pontos, gerou polêmica na comunidade universitária.

Na ação civil pública, a procuradora Janaína Andrade frisou que houve mal uso do sistema de cotas, com o objetivo de “facilitar o acesso ao ensino superior de pessoas que, em decorrência de suas condições sócio-econômicas, egressos de escolas públicas, teriam presumida dificuldade de concorrer em igualdade com os demais concluintes do 2º grau”.

Ela entendeu que Gouveia não pode ser enquadrado nesse quesito, mesmo tendo concluído o ensino médio em escola pública, pelo fato de ter outras graduações concluídas, inclusive por meio do ensino público. De acordo com o edital do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) 2022 e o regimento da UFPB, a aprovação do reitor não representa impedimento para conciliar os estudos com a função que exerce.

Gouveia concluiu o ensino médio em 1983. Graduou-se em psicologia e, em seguida, concluiu os graus de mestre e doutor na área acadêmica. Em depoimento ao MPF, o reitor declarou que, apesar de tecnicamente não existir “pós-doutorado”, fez estágio sênior na área, no Canadá. Argumentou, ainda, ter concluído o curso de direito no Unipê, em João Pessoa, entre 2011 e 2016.

Por conta disso, o MPF chegou a recomendar, no curso do inquérito, que o reitor se abstivesse de fazer a matrícula, determinação rejeitada por ele. Para apurar as prováveis irregularidades, o MPF expediu uma recomendação destinada à pró-reitoria de graduação da UFPB, para que a matrícula do reitor no curso de engenharia de produção não fosse efetivada, por ser essa uma conduta imoral, semelhante à conduta ilegal.

A pró-reitoria, no entanto, não acatou a recomendação, alegando que o reitor preenchia os requisitos da seleção. Em resposta, na ação civil pública, Janaína Andrade anexou decisões judiciais e pareceres da Advocacia-Geral da União (AGU) com entendimento contrário à legalidade da matrícula. A prática, segundo a procuradora, representa uma afronta às “diretrizes constitucionais de uma sociedade solidária e redução das desigualdades sociais”.

“A lei nº 12.711/2012 insere-se no contexto das políticas de ações afirmativas. Nesse tipo de política pública, voltada à concretização do princípio constitucional da igualdade material e à neutralização dos efeitos da discriminação racial, de gênero, de idade, de origem nacional e de compleição física, a igualdade deixa de ser simplesmente um princípio jurídico a ser respeitado por todos, e passa a ser um objetivo constitucional a ser alcançado ativamente pelo Estado e pela sociedade”, argumenta a procuradora na petição.

Ouvido pelo Correio, Gouveia afirmou que está “apenas na condição de reitor”. “Sou um professor, um cidadão que se submeteu ao Enem, passou e, coincidentemente estou nesse papel de reitor. O Ministério Público Federal tem competência, respeito. Mas a educação sempre me guiou”, disse.

Ele declarou, ainda, que não vai abrir mão de sua aprovação e que pretende, sim, cursar e concluir engenharia de produção. “Claro que vou cursar. Se dissesse que renunciaria estaria sendo leviano. Não percebo nenhuma ilegalidade nisso. Não saio na vantagem porque fiz mestrado e doutorado. Se tem um homem prejudicado nisso sou eu, porque há 39 anos não me atualizo nas matérias do ensino médio”, afirmou. “Naquele tempo, em escola pública, o inglês oferecido era verbo to be no presente, de forma afirmativa”, completou.