Williston Augusto, 18 anos, foi aprovado em medicina na Universidade Federal de Sergipe (UFS). Ele passou em primeiro lugar nas cotas destinadas a candidatos pretos, pardos e indígenas que, independente da renda, tenham feito o ensino médio em escolas públicas. O aluno é de São Miguel de Aleixo (SE) que fica a cerca de 108 km da capital Aracaju.
Por trás da conquista de Williston Augusto, há uma história de luta pela educação. Os pais do estudante eram lavradores e foram criados na zona rural do município até a mãe decidir ingressar no ensino superior. Na época, o estudante tinha cinco anos e a família se mudou para a cidade. “Foi ela quem abriu as portas para a gente perceber que o conhecimento e a educação libertam”, conta.
A mãe do estudante chegou a ser professora concursada do município e, posteriormente, diretora de uma pré-escola municipal. No entanto, por problemas de saúde, ela está afastada das funções atualmente.
O pai de Williston Augusto se formou no início deste ano no curso técnico de mecânica aos 44 anos. Antes, ele era agricultor e, agora, atua como mecânico de motores a diesel em uma fábrica de laticínios. “Eu tenho muito orgulho dos meus filhos e eu sempre quis dar esse presente a eles”, declara sobre a sua aprovação.
O estudante também tem uma irmã mais velha de 24 anos. Ela se formou em ciências contábeis e pôde fazer a graduação por causa da assistência do Programa Universidade para Todos (Prouni). Para fazer o curso de medicina, Williston Augusto vai morar com a irmã em Nossa Senhora do Socorro, município da região metropolitana de Aracaju.
Escolha do curso
Williston Augusto chegou a cogitar ser professor de geografia, em fazer engenharia de processos, química e de petróleo. Ele também pensou em ingressar na carreira militar e chegou a prestar alguns concursos para a área.
A decisão para fazer a graduação de medicina foi tomada no início de 2020 em razão da pandemia de covid-19, ao perceber a importância do trabalho dos profissionais de saúde da linha de frente no tratamento da doença. “Foi naquele momento que eu vi que queria fazer parte daquilo, que eu não queria ficar em casa só vendo as coisas acontecerem”, afirma.
Somado a essa percepção, o estudante tem fascínio pelo funcionamento do corpo humano e tem bastante interesse na área de saúde. No entanto, o motivo principal é que Williston Augusto tem vontade de prover melhores condições de vida à família.
Preparação em busca da aprovação
A rotina de estudo era intensa, pois a escola que Williston Augusto estudou era em tempo integral. Ele passava o dia na instituição, das 8h/8h30 as 16h30. E ainda estudava à noite.
Ele considera que a escola contribuiu de forma incisiva para a aprovação, por ser integral e, também, de acordo com o aluno, focada no processo de aprendizado do estudante levando em consideração os projetos de vida deles. Além disso, Williston Augusto teve apoio dos professores que ele pondera como fundamental para sua a conquista.
Saiba Mais
O estudante finalizou o ensino médio em 2020. Ele fez duas edições do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), uma em 2019, como treineiro e a última como candidato em que foi aprovado. Para obter o êxito, ele afirma que fez em torno de 30 mil questões durante o último ano e redações.
Educação como guia
Desde que a família se mudou para a zona urbana do município São Miguel de Aleixo, se tornou prioridade dentro de casa a busca pela educação para poder ter melhores condições de vida. Esse pensamento permeia Williston Augusto. Durante a vida escolar, participou de atividades extracurriculares visando esse objetivo.
Em 2015, quando estava no ensino fundamental, o estudante participou da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (Obmep). Na ocasião, ele recebeu medalha de bronze. Em 2016, ele participou novamente da disputa e recebeu menção honrosa e, também, entrou para a programa de Iniciação Científica Jr. (PIC) do Instituto Matemática Pura e Aplicada (IMPA) em parceria com a Obmep.
O programa propicia ao estudante premiado na Olimpíada entrar em contato com questões da área de matemática para ampliar o conhecimento cientifico e prepará-lo para um futuro desempenho profissional e acadêmico. Williston Augusto também participou da Olimpíada de Língua Portuguesa em que pôde fazer um documentário sobre a sua cidade.
Mesmo com o esforço empreendido durante a vida, tem momentos em que ele não acredita que conquistou a aprovação. “É um sentimento de missão cumprida. Sinto que há um tempo atrás, um ancestral meu batalhou muito e nunca imaginou que alguém da linhagem dele conseguiu algo maior. Hoje, eu consigo dar orgulho para a minha família, para a minha vózinha que chorou muito quando eu consegui”.
“Acreditem na educação pública, no (ensino) integral, nos centros públicos de ensino. A educação liberta e muitas vezes traz oportunidades para quem vem de localidades menos favorecidas. Se não fosse a educação e a minha mãe ter buscado ser professora, talvez, eu estivesse até hoje no povoado. A educação transforma e muda vidas, acreditem na educação”, finaliza.
Origens
Williston Augusto é do povoado Malhado dos Negros que, de acordo com o estudante, tem o nome de origem quilombola, mas não é reconhecido oficialmente como um. Seus pais também nasceram em comunidades da zona rural que tem a mesma ascendência.
No entanto, Williston Augusto se reconhece como ascendente quilombola devido às origens de seus pais e também em respeito à sua comunidade, em razão de a localidade ter pluralidade de origens étnicas e tradições. Além disso, o estudante se reconhece como um indivíduo negro.
*Estagiária sob a supervisão da subeditora Ana Luisa Araujo