Eu, Estudante

Solidariedade

Aluna de 65 anos da UnB recebe doação de computador para escrever TCC

Após notebook queimar em uma tempestade em dezembro do ano passado, Gracinha ganhou um equipamento novo e vai poder assistir às aulas do último semestre

Gerou comoção e uma onda de solidariedade reportagem do Eu, Estudante de segunda-feira (1º/2) sobre Maria das Graças Sousa Santos, 65 anos, aluna de serviço social da Universidade de Brasília (UnB) que ficou sem computador para estudar e escrever o TCC (Trabalho de Conclusão de Curso). Após a publicação, a idosa recebeu a doação de um computador nesta quarta-feira (3/2).

Também nesta quarta-feira, a UnB entrou em contato com a reportagem para informar que, diferentemente do que a instituição tinha informado na primeira matéria, Maria das Graças foi, sim, beneficiada pelo auxílio de inclusão digital da UnB. No primeiro texto, a universidade disse que a idosa não tinha se inscrito no edital.

“A estudante Maria das Graças Sousa Santos recebeu o auxílio de R$ 1.500 da Universidade de Brasília. O pagamento do auxílio de inclusão digital foi feito no dia 18 de agosto de 2020, em conta da Caixa Econômica Federal”, esclareceu a universidade por meio de nota (confira na íntegra ao fim da reportagem).

Erramos

A confusão se deu porque a equipe do Eu, Estudante errou e passou à UnB o nome "Maria da Graça Sousa Santos" para checagem, com duas letras "s" a menos. A reportagem pede desculpas pelo equívoco.

Em entrevista para a primeira matéria, a estudante alegou que tinha se inscrito, mas não tinha recebido o auxílio de inclusão digital da UnB, no valor de R$ 1.500. “Eu só tive direito a um chip de internet”, disse na segunda-feira (1º/2). Na ocasião, ela contou que conseguiu comprar um computador na época graças a uma vaquinha organizada por colegas de curso, que arrecadaram R$ 1.500.

Questionada sobre o assunto novamente nesta quarta-feira (3/2), a idosa confirmou que, de fato, recebeu o auxílio de R$ 1.500 da UnB para comprar o notebook em agosto do ano passado. Explicou ainda que juntou o montante que veio da UnB e o angariado por colegas para adquirir um computador de cerca de R$ 2.500. Sem isso, a estudante não teria como acompanhar as aulas, que passaram a ser distância a partir da pandemia, nem escrever o TCC. 

Arquivo Pessoal - Maria das Graças é baiana, natural de Salvador, e é carinhosamente chamada de Gracinha na faculdade

 

Após chuva, estudante ficou sem computador comprado com auxílio da UnB e vaquinha

Gracinha usou o equipamento comprado com o edital da UnB e a vaquinha de colegas até dezembro de 2020, quando ele queimou durante um temporal. A baiana de Salvador (BA) que, antes da pandemia, vendia doces no câmpus Darcy Ribeiro da UnB para se sustentar, disse não ter condições de pagar o valor de R$ 1.500 cobrado por um técnico para o conserto.

Ela está no último semestre do curso e conta ter perdido também a parte inicial do TCC, que estava salva no computador. Para além disso, ficou sem condições de poder acompanhar as aulas da UnB, retomadas de modo remoto na segunda-feira (1º/2). Depois que a história foi publicada no Eu, Estudante, a idosa recebeu ajuda.

Professor e coordenador do curso de agroecologia do Instituto Federal de Brasília (IFB), Paulo Guilherme Cabral, 56 anos, se solidarizou com a estudante e providenciou a entrega de um equipamento na casa dela na tarde desta quarta-feira (3/2). André Luiz Lopes da Silva, 34, estudante do IFB, foi o responsável por levar o computador até a casa dela, onde entregou a doação à Ítala de Sousa Santos, 39, filha de Gracinha.

“Como a gente tem passado por essa situação também no instituto, nos sensibilizamos pela história da Gracinha. Não conseguir concluir o curso por causa de um equipamento infelizmente acontece muito entre os estudantes de baixa renda”, explica Paulo. A máquina doada faz parte da campanha Agroecologia Solidária do IFB.

No início da pandemia, a iniciativa doava cestas básicas para os alunos que tinham perdido fonte de renda, além de auxílios. No entanto, quando as atividades estudantis retornaram, ainda em 2020, havia alunos que não podiam participar das aulas por não terem computador. A campanha então passou a distribuir notebooks em vez de cestas básicas.

Os equipamentos são provenientes da ONG Programando o Futuro, que faz reparos em máquinas antigas para doação. No ano passado a campanha Agroecologia Solidária do IFB recebeu 25 computadores e doou 20. Gracinha recebeu um dos cinco notebooks que sobraram.

“A gente guardou cinco para eventuais problemas. Caso mais algum aluno precisasse ou o computador de alguém quebrasse, como aconteceu com a Gracinha. Quando eu li a matéria, falei com o pessoal da campanha e concordamos em doar um para ela”, explica Paulo. Para Paulo, por conhecer a realidade dos alunos de baixa renda, era preciso fazer a doação, mesmo Gracinha não sendo estudante do IFB. “Não podemos olhar só para o nosso umbigo. A gente tinha o computador disponível. Por que não doar?”, reflete.


Corrida contra o tempo para Gracinha

Agora, Gracinha não pode perder tempo. A estudante precisa escrever o TCC até abril. Grata pela ajuda, ela garante que dará conta do recado. “Eu vou conseguir! Vou estudar de dia e de noite, mas vai dar tempo”, diz, confiante.

Quando Gracinha soube da doação do computador, ficou radiante. “Eu fui a uma consulta e, quando voltei, o computador novo estava aqui. Como eu estou feliz”, comemora.

A estudante não quer ficar parada após se formar e não aceita que a idade seja uma desculpa para não se inserir no mercado de trabalho de serviço social. “Eu quero muito trabalhar depois de me formar. Espero que o mercado de trabalho me absorva mesmo com minha idade.”

Gracinha passou no vestibular aos 58 anos. Ao longo da vida, foi cozinheira, auxiliar de enfermagem e morou três anos na Suíça, onde trabalhou como babá. A baiana de Salvador sempre teve vontade de prestar vestibular e escolheu o curso de serviço social porque queria ajudar as pessoas, como fazia quando era auxiliar de enfermagem.

Integrantes da família estão todos desempregados e organizaram vaquinha

Na casa de Gracinha, em São Sebastião, moram também a filha, Ítala, e o neto, Raphael Leopolldo Sousa Meneses, estudante de ciência da computação da UnB. Todos estão desempregados. A fonte de renda da família no momento é de R$ 465, do auxílio-socioeconômico ofertado pela UnB. “A gente também recebe uma cesta básica da igreja”, informa Ítala.

Depois que o computador de Gracinha queimou, a família organizou uma vaquinha virtual para poder comprar outro. A iniciativa arrecadou mais de R$ 1.000 até o momento e continua aberta para quem quiser fazer uma doação pelo link. Mesmo agora que Gracinha conseguiu o computador, a família continua precisando de ajuda financeira para se manter e agradece por qualquer ajuda possível.


Confira nota da Universidade de Brasília (UnB) na íntegra:

NOTA DE ESCLARECIMENTO

"Ao contrário do que foi publicado na reportagem "Sem computador, estudante de 65 anos não tem como se formar na UnB", a estudante Maria das Graças Sousa Santos recebeu o auxílio de R$ 1.500 da Universidade de Brasília. O pagamento do auxílio de inclusão digital foi feito no dia 18 de agosto de 2020, em conta da Caixa Econômica Federal.

Em um primeiro momento, a grafia do nome da estudante havia sido passada à UnB de maneira equivocada – por isso a instituição não havia encontrado o nome dela na lista das pessoas que pleitearam e/ou receberam o auxílio.

Como Maria das Graças já recebeu o apoio para inclusão digital no ano passado, ela não pode concorrer novamente agora (pelas regras do edital). A universidade está, neste momento, verificando outras formas de apoiá-la.

A UnB reitera que tem feito grande esforço institucional para a realização das atividades acadêmicas remotas, com o necessário apoio para os estudantes em situação de vulnerabilidade socioeconômica. Somente em 2020, cerca de 3 mil estudantes foram contemplados nos editais de inclusão digital."

 

*Estagiário sob supervisão da subeditora Ana Paula Lisboa