Na tarde desta segunda-feira (24/8), ocorreu o último debate do primeiro turno entre as chapas que concorrem à Reitoria da Universidade de Brasília (UnB). O evento foi mediado pela ex-aluna da UnB e jornalista do Correio Braziliense Ana Paula Lisboa.
O debate foi dividido em quatro blocos e candidatos fizeram considerações iniciais e finais, além de responderem a questionamentos entre si e a perguntas feitas pelo público. O último debate contou com a participação de candidatos a reitores e vice-reitores das quatro chapas que disputam o pleito em tom cardial, respeitando a troca de ideias. Não houve nenhum pedido de direito de resposta à moderadora, demonstrando que os concorrentes mantiveram a qualidade da conversa.
Márcia Abrahão (Instituto de Geociências), reitora, e Enrique Huelva (Instituto de Letras), vice-reitor, concorrem à reeleição pela chapa 86 — Somar. Eles disputam com outras três duplas. A chapa 81 — Unifica UnB – Seja Plural é formada por Virgílio Arraes (Departamento de História e ex-presidente da ADUnb) e Suélia Fleury (Faculdade do Gama, engenharias).
O próximo par de oponentes é da chapa 83 — Tempo de Florescer UnB, de Fátima Sousa (Departamento de Saúde Coletiva e ex-candidata ao GDF) e Elmira Simeão (Faculdade de Ciência da Informação). Por fim, está a chapa 89 — UnB Pode Muito Mais, de Jaime Santana (diretor do Instituto de Ciências Biológicas) e Gilberto Lacerda (Faculdade de Educação).
Polêmica sobre possibilidade de nomeação sem vitória
As eleições da UnB estão prestes a serem realizadas na terça-feira (25/8) e na quarta-feira (26/8), mas ainda há dúvidas sobre se o candidato com maioria de votos assumirá o comando da universidade, considerando o histórico do presidente Jair Bolsonaro, que nem sempre nomeia o mais votado para a função. Para que o reitor assuma, há a necessidade da formação de lista tríplice pelo Consuni (Conselho Universitário) e a escolha do nome fica a cargo do Ministério da Educação (MEC).
Já ocorreram casos, no governo de Jair Bolsonaro, em que a decisão da maioria da comunidade acadêmica não foi seguida, e é o que se teme na UnB. Candidatos de três das quatro chapas já se posicionaram veementemente contrárias a uma medida do tipo, elas são: Tempo de florescer (83), Somar (86) e UnB pode muito mais (89). Candidatos das três chapas garantiram que não aceitariam serem nomeados para o cargo se não forem os mais votados.
A única chapa que não demonstrou oposição clara a uma escolha que não siga a vontade das urnas foi a chapa 81, Unifica UnB. Em debates anteriores, a chapa tangenciou o tema e não deu uma resposta clara sobre aceitar uma possível indicação caso não seja a mais votada. Procurados pela equipe do Eu, Estudante, os candidatos e a coordenação de campanha não responderam aos contatos feitos até a finalização desta reportagem.
Como votar?
Para participar do pleito, marcado para ocorrer nesta terça e quarta-feira, é necessário ter o nome na lista de votantes cadastrados, divulgada na última semana. Confira a relação completa, organizada em ordem alfabética e por categoria (técnicos, docentes e discentes) no link.
Só participam da consulta aqueles com cadastro institucional regularizado e com e-mail institucional ativo. O acesso ao correio eletrônico institucional é importante, pois será por lá que o estudante ou trabalhador da UnB receberá o link que dá acesso à votação. Confira mais detalhes sobre as eleições no site.
Mediação
O evento foi mediado pela ex-aluna da Faculdade de Comunicação da UnB e jornalista do Correio Braziliense Ana Paula Lisboa. “Foi com grande alegria que eu recebi o convite para mediar esse encontro e, de alguma forma, fazer parte da consulta à comunidade da UnB, tão importante para o exercício da democracia e o fortalecimento da autonomia da nossa universidade”, pontuou a subeditora.
Mesmo depois de formada, a jornalista disse nunca ter se afastado da universidade. Um dos principais focos de sua cobertura jornalística é a educação, no site Eu, Estudante do Correio Braziliense, o jornal que mais cobre educação no país, de acordo com um estudo da Andi e da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura).
Como foi o último debate?
No primeiro bloco, foram disponibilizados sete minutos para que cada chapa se apresentasse. No segundo, cada chapa fazia uma pergunta a outra. No seguinte, cada chapa respondia a dois questionamentos enviados por pessoas que assistiam à transmissão de maneira anônima. E no quarto, foi dada oportunidade para as considerações finais.
Por ordem definida por sorteio, a chapa que iniciou o debate foi a UnB pode muito mais. “Quando dissemos que a UnB pode muito mais, queremos realçar que ainda há muito potencial a ser desenvolvido na nossa universidade e colocá-la em condição de responder aos desafios atuais e futuros”, pontuou o candidato a reitor Jaime Santana.
“Precisamos também estar mais abertos para o mundo, olhar para fora da UnB, adotar as melhores práticas e os parâmetros internacionais de qualidade e adaptá-los ao nosso contexto”, define Gilberto Lacerda sobre as metas da gestão. Além disso, eles disseram buscar uma instituição justa, inclusiva e livre de preconceitos e de discriminação de todos os tipos.
A segunda chapa a se apresentar foi a Somar, que tenta a reeleição. O vice-reitor da Universidade de Brasília, Enrique Huelva, apresentou a chapa e as conquistas dos últimos anos de gestão. Elencou medidas, como obras realizadas nos câmpus, internacionalização, retomada do vestibular indígena e desempenho da UnB em rankings internacionais nos últimos dois anos.
“Mesmo em um cenário adverso, não deixamos de investir na universidade”, aponta o atual vice-reitor. “Foram muitas conquistas, agora queremos somar. Somar para garantir um futuro de excelência, inclusão, gestão eficiente, humana e responsável”, afirma. “Nossa universidade não merece menos do que isso.”
A chapa Tempo de Florescer foi a seguinte a se apresentar. A candidata a reitora Fátima Sousa afirmou que a gestão dela e da candidata a vice Elmira Simeão será focada na empatia e no cuidado às pessoas. “Arte, cultura, educação para inclusão social têm que ser o centro da gestão que estamos propondo a cada um de vocês”, pontua Fátima.
A ex-candidata ao cargo de governadora do DF coloca como medidas importantes também a integração dos câmpus e o diálogo com os três segmentos da comunidade acadêmica (professores, técnicos e estudantes). “O que podemos garantir é que nossas decisões serão sempre participativas em defesa dos mais vulneráveis, reafirmando e fortalecendo conquistas históricas das ações afirmativas”, afirma.
Os últimos a se apresentarem foram os candidatos da chapa 81, Unifica UnB - Seja plural. Virgilio Arraes ressalta que a comunidade acadêmica pôde contribuir com o programa de gestão com sugestões, observações e críticas. Ele propõe um tratamento equânime de colegas, técnicos e docentes. “É tempo de reafirmar a democracia”, aponta o professor.
“Não apresentamos propostas ilusórias ou demagógicas”, afirma Vírgilio. “Nós, da chapa 81, queremos muito que vocês levem na memória uma UnB que lhe ouviu, uma UnB que lhe acolheu, que dividiu com vocês as suas angústias e também as suas vitórias”, pontua a candidata a vice-reitora Suélia Fleury.
Perguntas entre si
O bloco seguinte foi marcado por perguntas entre os candidatos. Os tempos eram divididos entre: pergunta, resposta, réplica e tréplica. Os candidatos perguntavam com base em sorteio feito previamente. A primeira chapa a ser questionada foi a Somar, respondendo pergunta da chapa Tempo de florescer.
Com base em questões como flexibilização para jornada de 30 horas semanais e o ponto eletrônico no Hospital Universitário de Brasília (HUB), a candidata Elmira Simeão comparou a carta programa da campanha da chapa Somar à gestão da reitora Márcia Abrahão. “A senhora não acha isso contraditório? Por que então pede mais quatro anos? Não consegue nem fazer uma autocrítica de ter prometido e não ter cumprido parte de todas essas questões e de se apresentar novamente para a reeleição”, questionou à Marcia Abrahão.
A reitoria rebateu: “Primeiro, nós fizemos uma gestão bastante dialogada. A flexibilização de horário foi feita com resultado de muito diálogo. Hoje em dia, tem 112 setores flexibilizados na UnB. Quando nós assumimos, tinha 29. sobre o ponto eletrônico, nós fizemos audiência pública. Foi uma imposição externa. Lamentamos muito. Fizemos algo inédito na UnB, uma consulta pública, está aí para todos verem”.
Em réplica, a candidata Fátima respondeu: “Os dados não batem com as informações dos técnicos”. Ela relembra informações sobre demissões de funcionários terceirizados abordadas no último debate ao dizer que Márcia trabalha com “uma razão instrumental, uma frieza própria de um pragmatismo administrativo”, na opinião dela. “Isso foi desumano, isso não foi digno da Universidade de Brasília”, avaliou sobre terceirizados que tiveram que sair do isolamento para assinar a demissão.
Na tréplica, Márcia reafirmou o que disse no último debate sobre não ter havido demissões. Segundo a reitora, a empresa Servit estava pedindo renegociação em razão da pandemia e cancelou avisos prévios que tinha entregue para trabalhadores. “Apesar de todas as dificuldades, nós continuamos dialogando, protegendo nossos trabalhadores, tanto os trabalhadores do quadro da UnB, como também os trabalhadores terceirizados”, afirma.
Apoio estudantil
A segunda pergunta foi da chapa Somar para a chapa Unifica UnB. A reitora questionou a chapa sobre mecanismos de permanência dos estudantes na universidade. Ela lembrou que, na gestão dela, esses mecanismos foram garantidos, como acesso ao restaurante universitário desde o primeiro dia, bolsa de auxílio econômico, auxílio creche e auxílio inclusão digital. “Gostaria de saber como será, na gestão de vocês, a assistência estudantil e o apoio aos nosso estudante?”, indagou.
“Em uma eventual gestão da chapa 81, os estudantes e as estudantes terão todo o apoio da Universidade de Brasília”, afirmou o candidato a reitor Virgílio Arraes. Ele assegura que não irá desfazer nenhuma das medidas com boa aceitação pela comunidade acadêmica. Porém, Virgílio afirma que a chapa tentará acesso a recursos como o Plano Nacional de Assistência Estudantil (Pnaes) e conversar sobre o retorno ao Sisu (Sistema de Seleção Unificada) pela possível baixa na entrada de recursos. Além disso, os candidatos da chapa 81 devem buscar a ampliação do sistema de creches para os câmpus.
Na réplica, a reitora faz observações sobre sua gestão. Segundo Márcia, mesmo com a redução orçamentária de 45%, aumentou o apoio aos estudantes. Entre as medidas elencadas, estão bolsas de iniciação científica, extensão, assistência, acabar com a proibição de grávidas e mulheres com filhos de permanecerem na Casa do Estudante Universitário (CEU) e com o PIJ (Projeto Infanto Juvenil da UnB). E esclarece que não há qualquer relação entre Sisu e Pnaes. “A UnB, quando saiu do Sisu, ela saiu depois de dois anos de discussão e o motivo é uma evasão que é o dobro da evasão do PAS (Programa de Avaliação Seriada) e do vestibular”, afirma.
“Nada impede que esse tema seja novamente discutido e avaliado pela comunidade. E essa é uma proposta da chapa 81. Então, a reavaliação pode se dar em momentos na vida da universidade”, respondeu o candidato Virgílio Arraes em sua tréplica.
Servidores do HUB
A próxima a fazer uma pergunta foi a candidata à vice-reitora pela chapa Unifica UnB, Suélia Fleury. Ela relembra a situação de servidoras do HUB no que concerne à insalubridade e ao sentimento de não pertencimento à universidade. Ela pergunta a Jaime Santana, da chapa 89 – UnB pode muito mais, o que pensa sobre isso e o que fará em relação ao HUB.
“Esse é um ponto muito importante. Nós sabemos que as servidoras e os servidores do HUB estão sob estresse por diversos motivos”, responde Jaime. O candidato concorda na desaprovação à retirada do Decanato de Gestão de Pessoas (DGP) do HUB e assegura que a permissão para turnos de 12 horas para funcionários do hospital será permanente sob sua gestão. Segundo ele, houve permissão somente no período de eleição.
Afirmou que irá criar um canal de comunicação entre a reitoria e os funcionários do hospital e um plano de saúde institucional para os funcionários e as famílias. “Esses servidores precisam ser cuidados.” O candidato Virgílio Arraes, da chapa Unifica UnB, concorda que é necessário o apoio aos colegas do HUB em tempos como o da pandemia. Ele reforça que é necessário que a gestão se aproxime desses funcionários no dia a dia, não só na pandemia.
“Estamos 100% de acordo”, retomou o candidato Jaime em sua tréplica. “O HUB não pode responder a emergências. A gente não pode exigir isso do nosso maravilhoso hospital.” O candidato da chapa 81 lembra que a forma flexível do trabalho está sendo essencial na pandemia e pontua que a administração da UnB demorou mais de dois anos para orientar as unidades sobre a instrução normativa do Ministério do Planejamento de 2018, que orienta sobre a flexibilização da jornada de trabalho, tornando o caminho mais tortuoso. E questiona como a chapa 83 enxerga esse atraso que poderia trazer maior agilidade ao processo.
“A crítica que o senhor aponta nesse momento do debate ela é oportuna porque também reflete uma preocupação relatada por vários técnicos e técnicas da universidade em diferentes unidades acadêmicas e setores”, afirma a candidata a vice-reitora Elmira Simeão, da chapa Tempo de Florescer. “Percebemos que há, sim, uma falta de diálogo e sintonia.”
O candidato a vice pela chapa UnB pode muito mais, Gilberto Lacerda, afirma que a pauta da qualidade de vida no trabalho dos servidores é central na visão da gestão deles, que está estudando práticas de outras universidades. Com relação ao trabalho remoto, ele classifica como um ganho de eficiência, sendo “bom para a UnB e bom para todos”.
Perguntas sorteadas
“A chapa é a favor da entrega dos bens móveis e imóveis da UnB para a gestão do MEC ou PPP?”, pergunta um espectador. Ao que o candidato Virgílio Arraes, da chapa Unifica UnB, respondeu que não. Desde a fundação, era previsto que parte do orçamento da UnB seria constituído por patrimônio imobiliário. “Toda gestão tem obrigação de respeitar isso”, pontua Virgílio. Ele propõe a reativação do conselho gestor para gerir o patrimônio.
“O debate aqui é sobre a Universidade de Brasília”, desconversou o candidato ao falar sobre o movimento denominado Docentes pela Liberdade. Ele lembra a defesa dos associados enquanto esteve na gestão da ADUnB. Reforça que valoriza o diálogo e conversa da “esquerda à direita.”
Corte de gastos
“O que pretende fazer para impedir que o governo corte 18% do orçamento de nossa universidade?”, questionou um espectador à chapa Tempo de florescer. A candidata Fátima Sousa classifica esse como o maior desafio. Ela considera que será necessário mobilizar a bancada do Distrito Federal e conversar com os partidos indiscriminadamente. “Por isso, que nossa candidatura é suprapartidária”, afirma Fátima.
Questionada sobre ter sido candidata ao GDF pelo PSol e continuar filiada, ela esclareceu que a candidatura dela à reitoria não é um projeto do partido. “Eu tenho muito orgulho de ter sido candidata pelo PSol para governadora do Distrito federal”, afirma. Ela diz que entrou na velha política para enfrentar os deputados que dela participam. A candidata alega que não há projeto do partido em sua candidatura à Reitoria da UnB, pois o único candidato eleito pelo PSol na Câmara Legislativa do Distrito Federal apoia a professora Márcia. “ A nossa candidatura é de um coletivo que representa os interesses da nossa universidade.”
Contradições?
Márcia foi questionada sobre um vídeo com falas sobre propostas descumpridas, como ter a UnB funcionando em três turnos. Ela afirma ficar triste ao ver colegas maltratando a universidade em troca de votos. “A nossa universidade não merece esse tipo de tratamento”, pontua. Ela lamenta o vídeo e o considera “das políticas mais baixas”. A reitora aproveitou a oportunidade para refutar as acusações presentes no vídeo citado na pergunta.
“A senhora foi eleita com base na proposta do diálogo, mas, na crise de 2018, não ouviu a voz da comunidade e permitiu a demissão de terceirizados”, citava uma pergunta à Reitoria. Márcia alegou que não foi a universidade que demitiu: não havia dinheiro para pagar os contratos e a demissão veio a partir das empresas. Ela reforça que a gestão dela é pautada no diálogo e a aprovação de diversas medidas ocorreu por meio de consensos. “Essa é uma marca da nossa gestão que não há quem tire”, assegura.
Sobre a proposta para a valorização dos técnicos, o candidato Jaime Santana, da chapa UnB pode muito mais, afirma que conversou com os técnicos e surgiram reclamações. Ele promete que, em sua gestão, instituirá modalidades flexíveis de trabalho, liderando a implementação do trabalho remoto. Ele dá como exemplo a implantação do trabalho remoto no Instituto de Biologia (IB), do qual é diretor. Segundo ele, técnicos do IB chegavam a concorrer em editais de pesquisa antes, o que ele quer retomar. Ele defende a valorização dos técnicos. “Onde couber um técnico, vai ter técnico, e não um professor”, promete.
A respeito da sugestão do aumento do piso salarial de técnicos, o candidato a vice da chapa UnB pode muito mais, Gilberto Lacerda, considera que o próximo reitor da UnB deve se articular junto à Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior) para luta por condições remuneratórias compatíveis com a função por eles desempenhadas. “Nossos técnicos têm o pior vencimento básico do Executivo federal, no entanto, eles são uma força capital do funcionamento da instituição”, disse.
*Estagiário sob supervisão de Ana Sá