Desde a divulgação dos resultados, as notas de redação têm sido uma polêmica entre inscritos no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2020. Alguns entendem que houve erro na correção ou no sistema. No entanto, a doutora em educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) Andrea Ramal considera que, diante do criterioso processo de correção, o baixo desempenho dos candidatos pode se explicar de outra forma.
De acordo com a autora do livro Redação Excelente! Para Enem e Vestibulares (Editora Método), a pandemia, a quarentena e o fechamento das escolas foram fatores que impactaram o baixo desempenho dos alunos. “Os estudantes enfrentaram inúmeras dificuldades com a falta de acesso aos conteúdos ministrados nas aulas on-line. Os alunos aprenderam menos do que poderiam e menos do que deveriam”, observa.
Na edição de 2020, somente 28 textos gabaritaram a prova de redação, o que é cerca de 47% menor que a edição anterior, que registrou 53 notas máximas. A quantidade de notas zero chegou a 87.567, o que representa 3,22% do total. Ainda assim, a prova de redação registrou maior média, com 588,74 pontos.
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Método tenta evitar discrepâncias na avaliação
A educadora Andrea Ramal considera o método de correção da prova de redação do Enem adequado, uma vez que prevê diversas etapas de correção. O cálculo da nota da redação ocorre com base na avaliação de cinco competências, que podem ir de nota zero a 200, somando um valor que vai de zero a 1.000. Diferentemente da prova objetiva, na redação, a nota final se dará pelo somatório das competências avaliadas.
Cada redação é corrigida por dois corretores independentes e a nota final do participante será a média aritmética das notas totais atribuídas pelos dois corretores. Caso haja discrepância entre dois corretores a redação será corrigida por um terceiro corretor.
Caso não haja discrepância entre o terceiro corretor e os outros dois corretores, a nota final do participante será a média aritmética entre as duas notas totais que mais se aproximarem. Caso haja discrepância com relação a ambas as notas anteriores, a redação será corrigida por uma banca composta por três corretores, que atribuirá a nota final do participante, sendo descartadas as notas anteriores.
“Além disso tem outra coisa que conta que é o seguinte: para uma nota 1.000 tem cinco critérios e cada um deles vale 200 pontos. Isso permite que haja cada vez mais objetividade e menos subjetividade na hora de corrigir”, ressalta Andrea. Confira a lista das cinco competências avaliadas:
- Competência 1: demonstrar domínio da modalidade escrita formal da língua portuguesa;
- Competência 2: compreender a proposta de redação e aplicar conceitos das várias áreas de conhecimento para desenvolver o tema, dentro dos limites estruturais do texto dissertativo-argumentativo em prosa;
- Competência 3: selecionar, relacionar, organizar e interpretar informações, fatos, opiniões e argumentos em defesa de um ponto de vista;
- Competência 4: demonstrar conhecimento dos mecanismos linguísticos necessários para a construção da argumentação;
- Competência 5: elaborar proposta de intervenção para o problema abordado, respeitando os direitos humanos.
A avaliação não mudou em relação à edição anterior
Segundo a autora, os erros mais comuns cometidos pelos estudantes e que levam à redução da nota são a falta de coesão ou de coerência; repetição de palavras e fuga do tema proposto. Mas ela reforça que não houve alteração no que é avaliado, diferentemente do que é indicado para as provas objetivas, que para alguns estudantes, tornou-se mais conteudista.
“A redação continua muito mais baseada em visões interdisciplinares que dependem de uma leitura crítica da realidade, que dependem de uma bagagem cultural trazida pelo candidato e da capacidade dele de fazer intertextualidade com os textos motivadores que são apresentados”, observa.
Segundo ela, isso busca medir a competência do estudante de estar por dentro dos problemas e das grandes questões da realidade atual e também a capacidade de propor alternativas viáveis e factíveis.
Para aqueles que ficaram insatisfeitos com a nota, a especialista recomenda que esperem a vista pedagógica da redação, que está prevista para ser divulgada em 28 de maio. “Ela é uma oportunidade para que o candidato veja os comentários realizados a respeito do material entregue, ou seja, da sua redação.
Ela destaca que é preciso esperar o espelho até mostrar para outros professores pedir opiniões e só então tomar alguma medida. Perguntado se haveria alguma chance de recurso para os inscritos insatisfeitos, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) não respondeu até o fechamento desta matéria.
Confira os temas das redações deste ano:
- Edição impressa (17 e 24 de janeiro): o estigma associado às doenças mentais na sociedade brasileira;
- Edição digital (31 de janeiro e 7 de fevereiro): o desafio de reduzir as desigualdades entre as regiões
do Brasil; - Prova para pessoas privadas de liberdade ou reaplicação (23 e 24 de fevereiro): a falta de empatia nas relações sociais no Brasil.
*Estagiário sob a supervisão da editora Ana Sá